Monumento à Barbárie nos Vinhedos Gaúchos. Por Viegas Fernandes da Costa

O documento produzido pela CIC-BG não é uma vergonha, mas sim verdadeiro monumento à barbárie.

 

Foto: Ignacio Blanco.

Por Viegas Fernandes da Costa.

Após a constatação de trabalho análogo à escravidão de mais de uma centena de seres humanos nas vinícolas Aurora, Salton e Garibaldi, o Centro da Indústria, Comércio e Serviços de Bento Gonçalves (CIC-BG) publicou uma nota de apoio às vinícolas que soa como um atentado ao bom senso, aos direitos fundamentais do ser humano e à decência.

Ao invés de condenar as empresas e empresários que promoveram a comprovada exploração de trabalhadores em condição análoga à escravidão, e de se solidarizar com as vítimas, a CIC-BG justificou a prática obscena e criminosa da escravidão na falta de “mão de obra” local. Na perspectiva preconceituosa, escravocrata e ultraliberal dos empresários gaúchos que produziram o documento, a falta de trabalhadores para colher uvas, por exemplo, seria motivada pelas políticas sociais de distribuição de renda.

Em 1939, em outro município do Rio Grande do Sul chamado Marcelino Ramos, uma organização chamada Associação Brasil Livre publicou documento no qual propunha ao Governo Federal a construção em território gaúcho de campo de concentração que serviria como destino final para judeus, doentes crônicos, condenados pela justiça, alienados mentais e idosos sem posses. Agora, em 2023, outra organização das elites gaúchas torna pública sua visão de mundo fascista, defendendo o fim de políticas sociais para poder subjugar de modo vil seus trabalhadores rurais.

Afinal, se uma renda de R$ 600,00 paga pelo Bolsa Família é a razão para a falta de mão de obra nas vinícolas do Rio Grande do Sul, quais não são as condições de trabalho e renda daquele mercado local?

Ao invés de justificar a escravidão moderna promovida entre seus associados, o Centro da Indústria, Comércio e Serviços de Bento Gonçalves deveria vir a público para 1) condenar a prática da exploração do trabalho análogo á escravidão; 2) solidarizar-se com as vítimas, neste caso, os trabalhadores e não os empresários; 3) promover ações de reparação; 4) criar um programa de combate a toda forma de exploração ilegal do trabalho por seus associados.  O documento produzido pela CIC-BG não é uma vergonha, mas sim verdadeiro monumento à barbárie.

Transcrevo abaixo trecho do documento:

“Situações como esta, infelizmente, estão também relacionadas a um problema que há muito tempo vem sendo enfatizado e trabalhado pelo CIC-BG e Poder Público local: a falta de mão de obra e a necessidade de investir em projetos e iniciativas que permitam minimizar este grande problema. Há uma larga parcela da população com plenas condições produtivas e que, mesmo assim, encontra-se inativa, sobrevivendo através de um sistema assistencialista que nada tem de salutar para a sociedade.”

 

Viegas Fernandes da Costa é docente e escritor.

 

 

 

 

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