Razões econômicas e políticas para a criação do Estado de Israel

Primeiro Congresso Sionista, na Basileia, Suíça, em 1897

Por José Álvaro Cardoso.

Terminada a Primeira Guerra Mundial, com a derrota do Império Otomano, em 1920 a Liga das Nações, predecessora da ONU, concedeu ao Império Britânico um mandato sobre a Palestina. O Mandato Britânico da Palestina, que vigorou entre 1920 e 1948, exercia o mando político dos territórios que atualmente formam Israel e Palestina. Por que o imperialismo criou a Palestina, como um país em separado, já que Palestina e Jordânia, por exemplo, podiam formar um único país? Primeiro, porque aquele é um ponto importante das rotas comerciais no Oriente Médio. Próximo do Canal de Suez, que é uma ligação fundamental, entre os mares Mediterrâneo e Vermelho. Localizado no Egito, na Península do Sinai, região de ligação entre o Norte da África e o Oriente Médio, o Canal de Suez foi construído com o objetivo de interligar por via marítima os continentes europeu e asiático. Ou seja, uma das razões para a criação da Palestina foi sua localização, que é fundamental para o comércio.

Uma outra razão para a criação da Palestina, é que os ingleses e demais governos imperialistas, àquela altura já sabiam do significado econômico do petróleo. Dos 10 países com as maiores reservas petrolíferas do planeta, (pela ordem, Venezuela, Arábia Saudita, Canadá, Irã, Iraque, Rússia, Kuwait, Emirados Árabes Unidos, EUA e Líbia), metade deles fica no Oriente médio. Em 1922, ainda não havia se desenvolvido a gama de derivados do petróleo, como se conhece hoje, um século depois. Mas os ingleses já sabiam da importância do produto como fonte de energia e matéria-prima para centenas de produtos industriais. Portanto, os ingleses e franceses, que estavam à frente do processo, tinham ciência da localização estratégica da Palestina. De um lado o Egito e o canal de Suez e, de outro, uma área com imensas reservas petrolíferas, difícil de controlar diretamente. A Palestina serviria como um instrumento fundamental de controle da Região.

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Os sionistas e outros, argumentam que não existe um “povo palestino”. Durante um longo período, inclusive, os israelenses não chamavam esse povo de palestino, designavam de árabes, na forma genérica. De fato, a Palestina não existia nessa época, como país independente, os países estavam em processo de formação, a partir da divisão estabelecida pelo imperialismo. Vários outros países do Oriente Médio também não existiam. O Iraque, por exemplo, surgiu em 1920, quando os britânicos definiram o seu território, dando pouca atenção às fronteiras naturais e divisões étnicas. A rigor, toda aquela região poderia compor um só país árabe, se houvesse as condições políticas para tal.

Porém, com a divisão operada pelo imperialismo, reconhecidamente artificial, com o tempo começam a surgir as diferenciações. O árabe palestino vai se distinguindo dos outros povos árabes. Os palestinos começam a adquirir um rosto próprio, apesar do artificialismo da divisão feita após o fim do Império Otomano. O ideal, claro, é que não houvesse toda essa divisão e se formasse uma grande nação árabe, como era o sonho de vários setores árabes que lutaram contra o Império Otomano.

Mas havia uma outra razão, tão importante quanto, para os ingleses criarem a Palestina: o projeto de constituição de um país colonial, ao estilo da África do Sul, no meio de todos os países árabes. A implantação artificial de judeus na Palestina tinha este objetivo. No século XIX a esmagadora maioria da população da região que hoje é a Palestina, era formada de árabes, que são os donos da terra, os donos da região, de fato.

Na metade do século XIX começa a aparecer o movimento sionista, que se apoia numa questão real, que é opressão que sofrem os judeus, principalmente em países como Rússia, Polônia e Hungria. A tese defendida pelos sionistas é a de que é preciso construir um Estado judeu, que iria protegê-los da discriminação e da perseguição. Um dos problemas encontrados é que a maioria dos judeus que moravam na Europa não queria ir para a Palestina, que era um lugar deserto e pobre. As pessoas queriam migrar para os EUA, país rico, em pleno crescimento, com muitas oportunidades de ganhar dinheiro. Pouca gente quer ir para a região da Palestina, um lugar pobre e sem atrativos. Somente um grupo muito minoritário, bastante motivado ideologicamente é que queria ir.

Nesse sentido o Projeto Sionista, de construção de um lar para os judeus, tendia a ser um fracasso total. O projeto só decolou porque tinha financiadores muito ricos, principalmente alguns banqueiros ingleses. O movimento sionista arrecadava os recursos com seus financiadores, pagava a viagem, comprava terras e assentava os judeus. Mas foi uma operação montada em muito dinheiro. Essa ideia de os judeus irem lá para trabalhar no Kibutz, comer nos refeitórios coletivos etc., até aconteceu, mas em relativa pequena escala. Essa possibilidade empolgou uma parcela pequena dos potenciais moradores de Israel.

O projeto sionista, no seu conjunto, foi financiado pelos homens mais ricos do mundo. Por exemplo, o Barão Moritz Von Hirsch, banqueiro judeu alemão, um dos patrocinadores mais conhecidos, dentre vários outros. Portanto, o projeto de construção de Israel é um negócio predominantemente de banqueiros. Por que os banqueiros ingleses queriam mandar os judeus para a Palestina? Desejavam implantar uma colônia europeia numa região vital para garantir seus interesses econômicos, ligados ao comércio mundial e ao petróleo. Claro que, como em qualquer processo desse tipo, havia pessoas que estavam realmente pensando em construir um “lar para os judeus”. Mas essencialmente, esse era um projeto colonial. Um projeto que visava dominar uma região chave econômica e politicamente, visando construir uma base onde está uma boa parte das maiores reservas de petróleo do mundo.

A alegação de que em 1948 não morava ninguém na Palestina não passa de propaganda dos sionistas. No final da Primeira Guerra Mundial, em 1918, já havia 1,5 milhão de palestinos naquele lugar. O slogan “um povo sem terra, pra uma terra sem povo”, adotado pelos sionistas, já era uma preparação para expulsar todos os palestinos daquele lugar. A propaganda dos sionistas é a que eles estariam há dois mil anos naquela região da Palestina. Mas não há dados historiográficos que confirmem essa hipótese. Mesmo historiadores israelenses sérios destacam essa carência de dados históricos a respeito dessa suposta estada dos judeus na região, há dois mil anos. Os judeus formavam apenas uma tribo que havia, dentre muitas.

Quando pesquisamos a história dos judeus, no período mais antigo, percebemos que é uma história mitológica, com base em narrativas bíblicas. Portanto, essa estória de que os judeus estiveram na Palestina há 2000 anos, não é baseada em fatos históricos, nesse sentido é uma mitologia. Mas e se tivessem estado, justificaria uma política de limpeza étnica praticada durante mais de sete décadas, contra a população que, provavelmente, aí sim, vive há séculos na região? Esses árabes que estavam há séculos na região, não contam? Por esse raciocínio, os árabes teriam que reivindicar os territórios de Portugal e Espanha, já que eles conquistaram a Península Ibérica em 711 e ficaram até 1492, mais de 800 anos. Essa mitologia visa justificar a tese política de Israel: a de que os judeus são o povo escolhido e têm direito ao território da Palestina, que é a tese que está por detrás do processo de genocídio na Faixa de Gaza.

José Álvaro Cardoso é economista no DIEESE Santa Catarina.
A opinião do/a/s autor/a/s não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.

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