O estado brasileiro e o governo precisam proteger a vida das pessoas atingidas

Governo brasileiro não pode mais ser omisso ou conivente com situação vigente de violação de direitos de grandes empresas contra a população atingida do país.

Foto: Juan Vicent Diaz em Amazônia Real.

Entre os dias, 4 e 7 de novembro, atingidos de todo o Brasil organizados no Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB vão a Brasília para participar de uma Jornada de lutas e dar visibilidade às principais reivindicações do Movimento: reparação, efetivação dos direitos e políticas de proteção social para os atingidos por parte do estado brasileiro. Durante esses dias, os militantes vão participar de atos, assembleias e reuniões para apresentar suas pautas para a população em geral e para diferentes órgãos do executivo e do parlamento.

Há mais de 30 anos, o Movimento luta contra um padrão vigente de implantação de barragens no país que tem propiciado, de maneira recorrente, graves violações de direitos humanos, cujas consequências acabam por acentuar as já profundas desigualdades sociais existentes no Brasil, traduzindo-se em situações de miséria, precarização da saúde e  destruição ambiental nos territórios onde são construídas. Além de sofrerem diretamente com os impactos da construção destas barragens, muitas dessas populações ainda vivem as consequências nefastas da privatização do setor de energia, pois a tarifa com valores exorbitantes cria, também, uma espécie de apagão, porque a população perde o acesso à energia simplesmente por não ter como pagá-la.

Para mudar essa realidade, é preciso se criar políticas públicas eficientes focadas em proteger a vida e os direitos básicos das populações mais vulneráveis do país, seja em comunidades tradicionais, ou em periferias das grandes cidades. Cada vez mais essas populações são afetadas não só por grandes empreendimentos, mas também pelo avanço do neoliberalismo e pelos efeitos das mudanças climáticas que resultam em mortes, insegurança alimentar, prejuízos físicos e psicológicos para a população brasileira. Um exemplo são as comunidades de diferentes partes do país que temem a chegada do verão a cada ano por conta da proximidade de reservatórios e barragens que, com a intensificação das chuvas, se tornam verdadeiras bombas relógios. Apesar dessa situação ser recorrente, os últimos governos pouco ou nada fizeram para prevenir tragédias anunciadas.

Por isso, o MAB se engajou de forma ativa na eleição do atual governo para ajudar a reconstruir o país depois de um período nebuloso de retrocessos, violações de direitos, ataques à democracia e aumento progressivo da miséria. Eleger o governo Lula foi o primeiro passo para voltamos ao rumo da soberania e da justiça social, mas é preciso, agora, lutar por um modelo de desenvolvimento do país que inclua os mais pobres no orçamento, que considere a necessidades de enfrentar a crise climática e que incorpore o respeito aos direitos humanos como condicionante básica para a atuação de qualquer empreendimento em território nacional.

PNAB: um marco para se reconhecer quem são os atingidos

Para que isso aconteça, o primeiro passo é a aprovação da Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens – PNAB. Resultado de um longo processo de lutas, de estudos e experiências, o projeto se baseia em diferentes discussões nacionais e internacionais sobre os impactos causados pelas barragens no Brasil. Agora ele precisa ser regulamentado com urgência para evitar que as populações atingidas sigam sendo revitimizadas pela falta de reparação, omissão e negligência do poder público.

A proposta do projeto de lei, que já foi aprovado na Câmara dos Deputados e está em tramitação no Senado, é criar um marco regulatório que defina quem são os atingidos e quais são seus direitos. Reconhecer alguém como atingido pressupõe que ele é portador de direito, sujeito de suas conquistas e protagonista no processo de reparação dos danos causados a ele. Neste contexto, o PL define responsabilidades, formas de reparação e cria, também, mecanismos de prevenção e mitigação de impactos dos empreendimentos com barragens no Brasil. A expectativa do MAB é que a PNAB seja aprovada ainda no mês de outubro.

Reparação para os atingidos

Outra reivindicação do Movimento é a criação de um “Fundo Nacional Para a Reparação das Populações Atingidas” com foco em garantir dotação orçamentária para projetos que previnam novas tragédias no Brasil relacionadas à construção, operação e rompimento de grandes obras (de represamento de água, mineração e produção de energia), a partir do envolvimento ativo da população na formulação das ações. A estratégia também garantiria recursos necessários para lidar com prevenção de tragédias e reparação dos prejuízos causados pelas mudanças climáticas, como inundações, secas extras, deslizamentos, etc.

Vale lembrar que o governo Bolsonaro destinou uma quantia irrisória (R$ 25 mil) do orçamento de 2023 para o combate aos desastres naturais, como tragédias causadas pelas fortes chuvas que devastaram o litoral norte do estado de São Paulo, ou as inundações que atingiram dezenas de municípios no Rio Grande do Sul. Esse valor é uma forma de deboche, considerando-se que, entre os anos de 2013 e 2022, o país enfrentou uma série de desastres naturais devastadores, que incluíram tempestades, inundações, enxurradas e alagamentos. De acordo com dados levantados pela Confederação Nacional de Municípios – CNM, nada menos que 5.199 dos 5.570 municípios brasileiros foram atingidos por estes eventos, totalizando 93% do país. Por isso, é tão importante criar instrumentos financeiros para que o governo possa prevenir situações que hoje causam mortes evitáveis, especialmente nas periferias urbanas, e deixam milhares de pessoas desabrigadas, desalojadas ou em situação de insegurança.

Justiça para os atingidos de Mariana: 8 anos de espera

Por último, o Movimento espera sensibilizar o governo para que ele possa atuar efetivamente na reparação dos atingidos pela barragem da Samarco (Vale e BHP Billiton) em Mariana, que há oito anos lutam por justiça.

É possível que grandes empreendimentos responsáveis por matar dezenas de pessoas, arrasar a vida de outras milhares, contaminar um rio, destruir a fauna e a flora em mais de 46 cidades sigam impunes? Acreditamos que não e esperamos que o poder público atue de forma contundente.

Hoje, estamos assistindo à Justiça brasileira (em especial o Conselho Nacional de Justiça) construir um acordo com as mineradoras criminosas, sem envolver os atingidos ativamente nas negociações. Esperamos, portanto, que o governo intervenha para assegurar que as comunidades sejam consideradas protagonistas neste processo que pode mudar o rumo das suas vidas, das suas famílias e de seus territórios.

É por isso que os atingidos por barragens estarão em Brasília reivindicando voz e participação na construção de um novo modelo energético para o país, que considere as necessidades e os direitos dos brasileiros e um novo modelo de desenvolvimento com mais justiça, igualdade e, especialmente, respeito à vida das pessoas.

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