Indígenas Guarani e Kaiowá, da retomada Tekoha Joparã (MS), resistem perante iminente risco de ataque

Após o brutal assassinato de Alex Lopes, de 18 anos, a comunidade da reserva indígena Taquaperi decidiu retomar a fazenda onde o jovem teria sido morto. Lideranças cobram investigação federal do caso. Foto: comunidade Taquaperi

Assessoria de Comunicação do Cimi.- Desde que os Guarani e Kaiowá decidiram retomar uma fazenda no município de Coronel Sapucaia (MS) – vizinha à Terra Indígena (TI) Taquaperi –, em protesto contra o assassinato do jovem Alex Recarte Vasques Lopes, uma série de ameaças vem ocorrendo contra esse povo. Na tarde desta quinta-feira (2), as intimidações à retomada Tekoha Joparã, assim denominada pelos indígenas, se intensificaram: lideranças relatam maior movimento de caminhonetes e de pessoas com armas de fogo cercando a comunidade.

“Os indígenas têm denunciado há dias as movimentações, tentando sensibilizar setores. Inclusive de pessoas portando fuzis em suas caminhonetes. Uma preocupação adjacente é que, nesse local, há circulação intensa e envolvimento de forças ligadas ao mundo do tráfico de drogas. Então é difícil saber a proporção que pode tomar um ataque nessa zona de fronteira para além dos fazendeiros. Essa força está posta”, afirma Matias Benno, coordenador do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) – Regional Mato Grosso do Sul.

“Uma preocupação adjacente é que, nesse local, há circulação intensa e envolvimento de forças ligadas ao mundo do tráfico de drogas”

Após o brutal assassinato de Alex Lopes, de 18 anos, a comunidade da reserva indígena Taquaperi decidiu retomar a fazenda onde o jovem teria sido morto. Foto: comunidade Taquaperi

Após o brutal assassinato de Alex Lopes, de 18 anos, a comunidade da reserva indígena Taquaperi decidiu retomar a fazenda onde o jovem teria sido morto. Foto: comunidade Taquaperi

Apesar das ameaças, Matias sinaliza que os indígenas não irão recuar. O coordenador explica que, para os indígenas, retomar o território – principalmente após a morte de Alex Vasques –, é um “senso de justiça”.

“Os indígenas estão lá com convicção de que a ocupação é um direito, principalmente devido a duas questões: a justiça pelo assassinato brutal do jovem Alex, sem explicações, e, ao mesmo tempo, por ser uma área que pertencia à área indígena. Na lógica da comunidade, se essas pessoas não estivessem invadido o território, não haveria morte. Não haveria essas violações que, constantemente, segundo eles, acontecem advindas dessa fazenda”.

“Os indígenas estão lá com convicção de que a ocupação é um direito”

O Cimi – Regional Mato Grosso do Sul, junto aos indígenas, tenta deslocar forças de segurança federais até o local, a fim de evitar mais um massacre contra os Guarani e Kaiowá. No entanto, lideranças relatam que é grande a chance de um ataque na noite desta quinta-feira (2).

“Eles [supostos fazendeiros] querem invadir Joparã, hoje à noite, querem brigar. Já mandaram o recado. As crianças e mulheres já saíram do local. Eles estão armados, o sangue vai ser derramado de novo”, afirma uma liderança – que não será identificada por questão de segurança.

“Eles [invasores] estão armados, o sangue vai ser derramado de novo”

Caminhonetes rondam a retomada Tekoha Joparã nesta quinta-feira (2). Indígenas afirmam que há invasores fortemente armados. Foto: povo Guarani e Kaiowá

Resistência

Em um vídeo recebido pelo Cimi, indígenas da comunidade denunciam que, na tarde desta quinta-feira, fazendeiros cortaram as lonas que faziam parte da estrutura da retomada. Revoltado com o ataque, um dos indígenas afirma que os Guarani e Kaiowá resistirão e não abrirão mão do território.

“Aqui pessoal, os fazendeiros cortaram a nossa lona. O que iremos fazer agora com essa lona furada? Como que vamos morar embaixo de lona furada? Essa terra pertence a nós. Essa terra é nossa. Não vamos entregar essa terra, porque pertence aos indígenas do Tekoha Joparã. Vamos ficar aqui! Vamos permanecer, não iremos sair”, afirma o indígena, determinado.

Retomada

A retomada Tekoha Joparã, na fazenda do município de Coronel Sapucaia (MS) – fronteira com o Paraguai –, foi motivada após o assassinato de Alex Recarte Vasques Lopes, de 18 anos, no dia 21 de maio deste ano.

Segundo lideranças da comunidade, Alex teria deixado a reserva Taquaperi para buscar lenha em uma área do entorno da TI. No local, teria sido assassinado, e seu corpo abandonado no Paraguai – em uma área a menos de dez quilômetros dos limites da reserva indígena.

No mesmo dia que decidiram retomar o local, o acesso à retomada foi impedido por um bloqueio realizado por viaturas do Departamento de Operações de Fronteira (DOF). À época, o Cimi mostrou em matéria que foi posicionada uma barreira na rodovia MS-286, que atravessa a TI Taquaperi, e também dá acesso a outras comunidades indígenas da região – que ficaram, na prática, isoladas.

Desde então, os Guarani e Kaiowá cobram apuração federal do assassinato e estão vivendo sob constante tensão – temendo ser alvo de violência de policiais e fazendeiros.

Política de confinamento

A TI Taquaperi é uma das oito reservas indígenas criadas pelo Serviço de Proteção ao Índio (SPI) na região sul do Mato Grosso do Sul, ainda no início do século XX com a finalidade de confinar os indígenas que ocupavam toda a região e liberar seus territórios para a colonização. Apesar do projeto original ter criado reservas com 3.600 hectares, a TI Taqueperi possui, hoje, apenas 2.000 hectares (1.776 hectares, coetaneamente), segundo a base cartográfica da Fundação Nacional do Índio (Funai).

Cerca de 3.300 indígenas vivem neste pequeno espaço, o que inviabiliza que sobrevivam de acordo com seu modo de vida tradicional. O confinamento e a apropriação, ao longo das décadas, de partes da área reservada por fazendeiros é uma das razões para que os Guarani e Kaiowá da reserva frequentem áreas de mata das propriedades vizinhas à reserva, reivindicadas pelos indígenas como parte de seu território tradicional.

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