Escrever e doutrinar, aprender e ensinar

Tanto no campo político quanto no cultural é preciso zelar por um ambiente em que a liberdade para expressar ideias seja garantida. Todavia perante os conflitos de classe quem poderia negar que a exposição ou a defesa de ideias consiste em disputas? Como sabemos, o que se passa hoje no Brasil é a perseguição ou ao menos a hostilidade aqueles que exprimem suas ideias a partir do ponto de vista da classe explorada. É preciso demonstrar que enquanto expressões de lutas sociais, existem doutrinas que são oficializadas e doutrinas que são perseguidas.

Imagem: Reprodução

Fica difícil escrever quando se está no interior de uma masmorra. Ela é mal iluminada, as paredes são geladas e úmidas. A comida é rápida e indigesta. Fantasmas noturnos vestem a máscara do entretenimento vazio até que algum preso morra de tédio. A única rede social possível envolve um encadeamento de gritos anônimos na escuridão. São gritos de gente faminta, de gente perseguida, de pessoas que denunciaram através da escrita ou simplesmente falando que trabalhadores são explorados, que seres humanos são alvos de racismo e de diversas outras formas de opressão. Da porta desta cela é possível ouvir passos… Quem será que vem aí? Será algum inquisidor do Tribunal do Santo Ofício? Será algum agente da SS? Não importa! Mesmo que tenhamos mais uma noite de torturas pela frente, é preciso insistir e escrever com o celular, com o lápis, com um pedaço de carvão, com sangue na ponta do dedo, enfim, com o que tivermos.

Algum leitor pode estar aborrecido: “ Pare com esse drama! Vivemos em uma democracia ! ”. Mas ainda que as palavras aqui estejam molhadas pela tinta da paranoia, é preciso olhar para os quatro lados e verificar se não está sendo construído um presídio cultural em torno daqueles que não temem afirmar o seguinte fato: A LUTA DE CLASSES EXISTE. Para a extrema direita tal afirmação seria crime, sendo que aqueles que explicam a história a partir da luta de classes promovem formas de “ doutrinação “. Se consultarmos um dicionário, a palavra Doutrina pode ser definida como uma reunião de fundamentos ou ideias a serem ensinadas. Daí a doutrinação consistir no ato de instruir princípios, ideias, de transmitir uma ideologia. De fato, é isso aí! Alguém conhece algum veículo de comunicação, alguma igreja, algum Partido, algum governo, alguma escola ou alguma manifestação artística que façam diferente? Seja numa câmera de deputados, numa sala de aula ou numa redação de jornal, existem ideologias e logo formas de doutrinação.

A dialética entre ensinar e aprender, escrever e ler, revela a necessidade da convivência entre pessoas que pensam de maneiras distintas. Tanto no campo político quanto no cultural é preciso zelar por um ambiente em que a liberdade para expressar ideias seja garantida. Todavia perante os conflitos de classe quem poderia negar que a exposição ou a defesa de ideias consiste em disputas? Como sabemos, o que se passa hoje no Brasil é a perseguição ou ao menos a hostilidade aqueles que exprimem suas ideias a partir do ponto de vista da classe explorada. É preciso demonstrar que enquanto expressões de lutas sociais, existem doutrinas que são oficializadas e doutrinas que são perseguidas. Quem estuda história sabe disso. Por acaso os militantes do cristianismo primitivo não reuniam fundamentos e a disseminação de uma doutrina religiosa ao atacarem o Império romano que os saqueava, os explorava? Por acaso na França do século XVIII , os iluministas não apresentavam uma doutrina crítica ao absolutismo, fornecendo assim uma ideologia revolucionária para a burguesia? Então por que diabos somente as pessoas de esquerda são acusadas de doutrinação? Por que o Materialismo Histórico é o bicho papão do pensamento?

O crítico literário norte americano Edmund Wilson afirmou corretamente que Marx e Engels não eram suficientemente reconhecidos em sua época pela crítica como escritores, devido ao fato das conclusões destes autores comunistas serem contrárias aos interesses das classes sociais que mais leem e que portanto fazem a reputação dos escritores. Entretanto, hoje em dia, os inimigos do pensamento crítico carecem precisamente de leitura: entre aqueles que vociferam contra o comunismo, dificilmente encontramos alguém que tenha lido seriamente a obra de Marx e Engels. Existem inclusive liberais que nunca ouviram falar em John Locke. Que desgraça! Até para se defender o capitalismo é preciso leitura, conhecimento e… uma doutrina para isso.

Devemos insistir na defesa de nossas ideias. É preciso escrever e não importa se fazemos isso dentro ou fora de uma masmorra.

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