Com ‘autonomia’ do BC e contas em dólar, Lira passa ‘boiada’ do mercado financeiro

Com suposta “blindagem”, política monetária vai ser mais facilmente capturada por interesses privados com BC independente

Novo presidente da Câmara não levou nem duas semanas para comandar aprovação de projetos que atendem ao mercado. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O novo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), não perdeu tempo para mostrar serviço ao mercado financeiro. Na semana passada, poucos dias após ser eleito, ele comandou a aprovação de dois projetos que terão consequências importantes para o funcionamento da economia brasileira: a autonomia do Banco Central (BC) e o novo Marco Legal do Mercado de Câmbio.

Mas essas medidas não serão capazes de dar resposta ao avanço do desemprego. Nem solucionar a equação orçamentária que permita a extensão do auxílio emergencial para milhões de brasileiros que sofrem com a segunda onda da pandemia, por exemplo. Pelo contrário.

De acordo com o economista Uallace Moreira, professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), a suposta “blindagem” ao BC vai, na verdade, aumentar a influência dos agentes do mercado financeiro sobre as políticas monetárias, afastando a soberania popular. Por outro lado, a nova Lei do Câmbio, que permite que brasileiros tenham contas em dólar e crédito em reais para não residentes, de aumentar a vulnerabilidade externa do país.

Em entrevista a Glauco Faria, no Jornal Brasil Atual desta sexta-feira (19), o professor afirma que Lira estaria “passando a boiada” em nome do mercado financeiro. A expressão ficou conhecida após o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, defender rem reunião ministerial em abril de 2020 que o governo deveria aproveitar as atenções voltadas para o combate à pandemia para aprovar medidas impopulares. Naquele caso específico, ele tratava da flexibilização da legislação ambiental em favor dos interesses do agronegócio, desmatadores e grileiros.

Independente de quem?

Com a autonomia do BC, os diretores passarão a cumprir mandatos de quatro anos. O presidente do banco também deverá comandar a autoridade monetária por igual período, mas seu mandato vai começar no terceiro ano da gestão do presidente da República. Para Moreira, esse dispositivo, na verdade, vai “blindar” as autoridades monetárias inclusive das pressões sociais. Um novo governo que queiram adotar uma política fiscal diferente da atual também vai encontrar enormes dificuldades.

“A política monetária vai tratar da crise do desemprego ou vai tratar da possível redução da rentabilidade dos ativos financeiros?”, questiona o economista. “Ou seja, o governo que elegemos não vai ter a capacidade de promover um processo de efetivação do plano de governo que a sociedade votou. Porque o presidente do BC pode estar atrelado a uma lógica rentista, que é o que vai acontecer. Ele vai ser captado, cooptado pelo rentismo. E vai impedir a implementação desse programa.”

Sobre o argumento de as autoridades monetárias estariam livres para tomar decisões “eminentemente técnicas”, Moreira lembra que quase todos os ex-diretores e ex-presidentes do BC atualmente ocupam cargos proeminentes em grandes bancos privados de investimentos.

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