A pós-verdade 150 anos atrás

Na imagem à esquerda, só a cabeça pertencia a Lincoln. Foi colocada sobre foto de Calhoun (à direita) – Foto: Reprodução

Por Luiza Villamêa.

A imagem é icônica. Com postura de estadista – o que de fato foi –, o presidente estadunidense Abraham Lincoln é retratado entre a bandeira, um globo, e a Constituição do país. Só que Lincoln jamais posou para esta fotografia. A cabeça foi tirada de um retrato dele, sentado, feito por seu fotógrafo predileto (Mathew Brady), e colada ao corpo do político sulista John Calhoun, que defendia a escravidão combatida e abolida por Lincoln.

As fotos originais integram os acervos da Biblioteca do Congresso, em Washington, mas a autoria da montagem é desconhecida. Acredita-se que foram manipuladas na década de 1860, devido à ausência de uma imagem que refletisse o papel heroico de Lincoln ao impedir a divisão dos Estados Unidos, durante a Guerra Civil (1861-1865). Poucas semanas antes do fim do conflito, ele tinha morrido, assassinado por um ator segregacionista.

A pós-verdade (post-truth) foi a “palavra do ano de 2016”, escolhida pelo departamento que edita os dicionários Oxford, mas opera há muito tempo nos bastidores da história. Algumas de suas representações têm como meta melhorar a imagem de um líder político. Outras, retirar de cena personagens que caíram em desgraça junto aos poderosos de plantão.

É o caso de Leon Trótski, o revolucionário bolchevique que comandou o Exército Vermelho e acabou “apagado” de fotografia feita em maio de 1920, na praça Sverdov, em Moscou. Enquanto o líder Vladimir Lênin discursava, Trótski observava a multidão, na plataforma do palanque, mas “sumiu” da foto ao disputar (e perder) o poder com Josef Stálin. Exilado no México, Trótski acabou morto em agosto de 1940 por um agente de Stálin.

Na fotografia à esquerda, a figura de Trótski (de quepe, na imagem à direita) foi apagada – Foto: Reprodução 

Em vez de mandar sumir com a imagem de um adversário político, Benito Mussolini, o fascista italiano que gostava de ser reverenciado como “sua excelência, chefe de governo, duce do fascismo e fundador do império”, desapareceu com um ajudante. Na linha culto à imagem, Mussolini posou montado em um cavalo, com a espada erguida, mas escondeu que o controle do animal era mérito do tratador, posteriormente apagado da foto.

Mussolini posa de valentão (à esquerda), mas não mostra o tratador que segurava o cavalo (à direita) – Foto: Reprodução


Fonte: Página B.

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