Santa Catarina não quer morrer!

    Em reabertura do Shopping de Blumenau teve aglomeração.

    Por Guilherme Luiz Weiler*

    Estudos técnicos do Ministério da Saúde apontam Santa Catarina como o próximo pico de caos do novo coronavírus do país.

    Quem está acompanhando a pandemia do novo coronavírus desde seu início no país, pode se lembrar que Santa Catarina surpreendeu o país ao ser pioneiro em medidas rígidas no enfrentamento contra o vírus. O governador Carlos Moisés (PSL) anunciou por decreto medidas que foram elogiadas por grande parte de especialistas, que consideravam as atitudes inteligentes por “matar no início” a curva que poderia crescer no estado.

    Entretanto, quem está acompanhando mais de perto por aqui, sabe das contradições que este processo teve, começando há quase dois anos.

    1- O governador Moisés, comandante da reserva dos bombeiros militares, era um completo desconhecido no estado até 2018, quando, por meio da onda Bolsonaro, chegou ao segundo turno e, depois, foi eleito governador do estado.
    2- Moisés, lá em 2019, foi se distanciando aos poucos do presidente da república, tomando atitudes que o colocariam não à direita no espectro político, mas agindo como se fosse um político do que conhecemos como centrão, flertando tanto com a centro-esquerda quanto com a centro-direita – ao mesmo tempo que flertava com o conservadorismo e os militares em algumas pautas, recebia famílias do MST e a população LGBT+.

    3- Já dada a tentativa de criação do partido Aliança Pelo Brasil, capitaneado por Bolsonaro, ficou evidente o distanciamento de Moisés desta política, com o PSL em Santa Catarina ficando “livre” para o grupo político do governador, cujo núcleo duro é formado pelo deputado federal Fábio Schiochet, o candidato ao Senado e atual secretário de estado de desenvolvimento econômico sustentável Lucas Esmeraldino e o secretário de estado da casa civil Douglas Borba.

    Dado este processo de ruptura, um estado que elegeu Bolsonaro com cerca de 75% dos votos no segundo turno começaria a olhar com desconfiança para o trabalho do governador. A crise, até então dada também por um racha na Assembleia Legislativa, colocando deputados do PSL em oposição ao governador do PSL, vai se agravar no processo de mediação do governador à crise do coronavírus.

    Como se não bastasse uma oposição à direita, além do oportunismo eleitoral que mexeu as cartas da ALESC colocando o governador em uma eventual minoria, o lobby da elite catarinense começou a fazer efeito, ainda que retardado por ações do PSOL Santa Catarina e de parte progressista da sociedade, que pressionou pela manutenção do isolamento social.

    Moisés começou a flexibilizar atividades em nome da economia e, ainda, viu derrotas impostas pelos deputados que consideraram, por exemplo, academias e mesmo igrejas serviços essenciais aos catarinenses que não poderiam ser fechadas por decretos do governador do estado.

    A partir daí, o que permanece proibido no estado é, em resumo, a circulação de transporte coletivo e a aglomeração em geral de pessoas, ao ar livre ou em lugares fechados. Até bares, restaurantes e shoppings já podem abrir.

    O grande “porém” é que os especialistas que aplaudiram a medida rápida do governador, lá em março, agora se preocupam porque a reabertura da sociedade pode ter sido severamente precoce. Ora, desde a reabertura, o número de casos em terras barriga-verdes já mais que triplicou. A dúvida que não cala é: uma vez que estes números ainda se referem a cerca de duas semanas atrás, com o aumento de aglomeração de pessoas, o que será de nossa rede hospitalar daqui a outras duas semanas?

    A coluna Painel, da Folha de São Paulo, anuncia o que tememos: técnicos do Ministério da Saúde já trabalham com o cenário do colapso da rede estadual catarinense de saúde. Nosso sistema público é, em relação a demais estados, consideravelmente estruturado e preparado. Entretanto, com o aumento exponencial de casos, não há país algum do mundo, ou estado brasileiro, que suportaria o aumento de demanda por leitos e respiradores, por exemplo. Ontem, à CNN, o ex-ministro Mandetta reforçou: parece a todos os especialistas de saúde que o crescimento da curva catarinense indica, no mínimo, um cenário preocupante para a rede pública de saúde do estado.

    E, por falar em respiradores, no momento em que mais cresce a demanda hospitalar, o governo do estado passa por uma crise política enorme, que além de derrubar o ex-secretário de saúde Helton Zeferino, tem plenas condições de afastar ainda os secretários e nomes fortes do governo e do PSL Douglas Borba e Lucas Esmeraldino. Tudo em função de um esquema milionário de compra de respiradores fantasma, que foram pagos mas nunca chegaram ao estado, revelado pelo jornal The Intercept.

    O governador Moisés, por sua vez, não está garantido no cargo uma vez que já circulam pelo escritório do presidente da ALESC, Júlio Garcia (PSD), pedidos de impedimento do ex-bombeiro. A vice-governadora Daniela Reinerh, que não rompeu com o bolsonarismo e se apresenta como um bastião catarinense dos que ainda são seguidores do presidente, já prepara as chuteiras e faz o aquecimento.

    A grande questão que parece ser central por aqui é a seguinte: com tanto agito na cena política local, quem será o responsável maior pelos caixões que ainda virão?
    Sem a volta das medidas rígidas, os catarinenses poderão sentir na pele o que estados como Amazonas, Pernambuco, Rio de Janeiro e São Paulo vivem no dia-a-dia. E as ações rápidas do governador podem ser facilmente esquecidas quando tudo foi colocado a perder em nome de uma economia que teria muito mais condições de recuperação que vidas que jamais voltarão.

    Força, Santa Catarina!

    *Guilherme Luiz Weiler é ativista por políticas públicas progressistas e direitos humanos. Foi coordenador-geral do Diretório Acadêmico Nove de Março, da Udesc, e atualmente é secretário de formação do PSOL Joinville.

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