Sobram R$ 156,40 para florianopolitano viver

Por Ana Carolina Peplau Madeira, para Desacato.info

No dia 3 de janeiro passou a vigorar o decreto da prefeitura que aumenta a tarifa de transporte coletivo. Acima da inflação, em 11,94%, passou de 3,10 para 3,50 em dinheiro, e de 2,98 para 3,34 no cartão. Cerca de cinco dias após, o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos – Dieese – anunciou que em 2015, o valor acumulado da cesta básica aumentou em todas as 18 capitais.

As maiores altas foram registradas em Belém (7,89%), Florianópolis (5,68%) e Fortaleza (5,58%). O maior custo do conjunto de bens alimentícios básicos foi apurado em Porto Alegre (R$ 418,82), seguido de Florianópolis (R$ 414,12) e São Paulo (R$ 412,12). Vale ressaltar que na cesta básica estão apenas alimentos. Sabonete, shampoo, desodorante, absorvente, entre outros, são comprados com o que sobra do salário.

O florianopolitano gasta R$ 414,12 de cesta básica, mais R$ 154,00 de vale-transporte = R$ 568,12. Se ele recebe um salário mínimo de R$ 880,00, desconta INSS, cesta básica e transporte então sobram R$ 156,40 para moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, lazer e previdência. “A mudança da tarifa de ônibus representa 12,10% de aumento acima da inflação. Esse cálculo é ‘por baixo’. Muita gente usa 4 passagens por dia, neste caso o custo dobra”, conta o economista do Dieese José Álvaro Cardoso.

O vereador Lino Peres lembra que, “na Audiência Pública realizada em 2013 (mal convocada), houve mais de 40 falas com sugestões de vários encaminhamentos, praticamente todos desconsiderados, sem abertura de espaço para tal, sendo que lá já se questionavam os critérios de cálculo da tarifa. Também desconsiderados foram os 16 pontos que o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas de Santa Catarina (MPTC) assinalou para que a Prefeitura contemplasse, depois de mobilização de representantes dos movimentos sociais e do Movimento Passe Livre”.

Continua o legislador que, “a ‘nova’ licitação, permitiu que ganhasse um consórcio, Fênix, formado pelas mesmas empresas que operam há décadas no município, e se permitiu também sua atuação por mais 20 anos, com promessas de melhoria no sistema e diminuição da tarifa. Ocorreu o inverso: a tarifa tem aumentado, tendo havido apenas uma interrupção provocada pela mobilização intensa em 2013, por parte dos movimentos sociais, principalmente do Movimento Passe Livre, que foi às ruas e fez com que o prefeito diminuísse a tarifa. Mas nos anos seguintes, 2014 e 2015, a tarifa vem aumentando, chegando a quase 30% com relação a 2013. E agora, volta a subir, e acima da inflação”.

O economista José Álvaro Cardoso diz que a solução é discutir coletivamente Vereador Lino Peres reclama do aumento da tarifa de ônibus acima da inflação, em 11,94%

Como isso funciona?

 As consequências destes aumentos na vida dos moradores da ilha de Santa Catarina, na opinião do economista, “são drásticas e quase incontornáveis no curto prazo, em função da essencialidade destes itens no consumo das famílias. Ambos os itens têm pesos significativos no orçamento doméstico, especialmente das mais pobres”.

A pesquisada pelo DIEESE (em Florianópolis e Brusque, no caso de SC), contém 13 produtos alimentares, para o consumo de uma pessoa adulta, durante um mês. Em um ano, os gêneros alimentícios subiram 17,28%, acima da inflação do período e do aumento do salário mínimo nacional.  Em 2015, todos os produtos (exceto a banana, que variou 0%) tiveram alta acumulada de preço. Os aumentos acima da variação média da cesta (17,28%) ocorreram nos seguintes produtos: batata (26,07%), carne (19,54%), açúcar refinado (33,99%), tomate (43,73%) arroz (25,10%) e batata (26,07%).

Segundo Cardoso, no último mês do ano passado, o trabalhador de Florianópolis remunerado pelo salário mínimo comprometeu 115 horas e 37 minutos de sua jornada mensal para adquirir os gêneros essenciais.  “Quando se compara o custo da cesta e o salário mínimo líquido, ou seja, após o desconto referente à Previdência Social, a relação era de 57,85% em dezembro de 2015. Isto significa que o trabalhador de salário mínimo, apenas para adquirir sua alimentação básica, comprometeu 57,12% de sua renda. Claro que esse comprometimento aumenta ao longo de 2015” declara o representante do Dieese.

Ele explica que, “na medida em que aumenta a renda familiar, os percentuais de comprometimento descritos, vão diminuindo. Porém, mesmo numa cidade como Florianópolis, cujos salários médios são mais elevados do que os municípios do interior do estado, o grosso da classe trabalhadora recebe salários que se situam na faixa de até três salários mínimos”. Caso pense na determinação constitucional que estabelece que o salário mínimo deve ser suficiente para suprir as despesas de um trabalhador e sua família com alimentação, o DIEESE estima mensalmente o valor do salário mínimo necessário. Em dezembro de 2015, o cálculo para a manutenção de uma família de quatro pessoas deveria equivaler a R$ 3.518,51 ou 4,47 vezes o mínimo em vigor, de R$ 788,00.

O vereador comenta ainda que, “o transporte público é o único serviço urbano em que o usuário paga à vista e no ato de seu uso e é um dos principais meios da população, principalmente de baixos recursos, de ter acesso ao emprego e trabalho e aos serviços públicos e privados da cidade. Portanto, ela está obrigada a pagar a tarifa antes de entrar na porta do emprego e paga quando retorna para casa”. De acordo com Peres, a população paga uma tarifa acima da inflação, “com condições de uso abaixo do conforto prometido (no verão não há ar condicionado em todo o sistema), sem a renovação da frota, que não se deu de acordo com o Edital (muitos ônibus antigos foram simplesmente pintados), com o tempo de deslocamento aumentado e, em alguns casos, recuo aos anos 1980 em relação a esse tempo”.

Enquanto o resto do mundo fala em ciclovias, investimentos em transportes públicos de qualidade, redução de números de carros particulares para evitar engarrafamentos e poluição do ar, Florianópolis ainda tem problemas no sistema de comunicação de horários e frequência de ônibus, suspensão de linhas, falta manutenção dos abrigos (pontos de ônibus) e a integração não funciona completamente. O SIT (Sistema Integrado de Transporte) se transformou em SIM (Sistema de Integrado de Mobilidade). O vereador e professor Lino afirma que era para ter um sistema integrado baseado na Lei Nacional da Política de Mobilidade Urbana, “onde o pedestre e o ciclista ocupam a prioridade máxima na cidade, seguindo-se o transporte público e, por último, o carro, que ainda é hegemônico na capital e região metropolitana,  com predomínio de 60% sobre todo o sistema de circulação, conforme dados do Relatório do PLAMUS, divulgado em novembro de 2015”.

Lino Peres Zé Álvaro 1

E agora?

O valor do salário mínimo necessário calculado pelo DIEESE em dezembro equivale a 3,8 vezes o menor piso estadual para Santa Catarina, cuja negociação está ocorrendo sem grandes avanços. A última reunião foi no dia 14 de janeiro e a próxima rodada será marcada para início de fevereiro.

 O pedido de reposição salarial dos trabalhadores catarinenses é de 15% para um piso estadual que está em R$ 908,00 em sua 1ª faixa, valor apenas 3% superior ao novo salário mínimo nacional (R$ 880,00). A cesta básica em Florianópolis, corresponde a quase 46% do piso estadual atual. Na prática, estão sendo discutidos salários que se situam ao nível da sobrevivência, pois tratam-se de mínimos em um padrão salarial muito baixo.

“Quanto à dica do que fazer para enfrentar a elevação do preço dos alimentos: não há saída a não ser estudar o assunto, discutir coletivamente e se mobilizar através das organizações sindicais e sociais. Não tem saída individual, além daquela que as pessoas já fazem instintivamente, que é procurar os menores preços”, afirma José Álvaro.

Veja os dados: CestaBasicaFpolis -DEZEMBRO

Salário mínimo bruto: R$ 880,00

Salário mínimo líquido (descontado o INSS): R$ 724,96%

Salário mínimo menos Cesta Básica e transporte: R$ 156,40

 

O quadro é semelhante em todo o estado

De acordo com a Pesquisa Nacional por Amostras de Domicílio (PNAD-IBGE), Santa Catarina apresenta:

1) 15,99% da população de 15 anos ou mais de idade recebe até um salário mínimo. Isso significa (em 2014, dado mais recente) 875 mil pessoas que recebem até um mínimo;

2) do percentual acima, 2,11% (115 mil pessoas de 15 anos ou mais) recebe até 1/2 salário mínimo.

3) portanto, preços de ônibus e cesta básica têm uma importância enorme para uma parcela expressiva da população de SC e de Florianópolis.

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.