Voto popular da esquerda à extrema direita

Ópera Mundi.

Voto Popular oscila entre esquerda e extrema direita.

Nem François Hollande nem Nicolas Sarkozy. Nesta eleição, são os dois pólos do espectro político que atraem a classe operária francesa. Sem esperanças de que os dois principais candidatos sejam a solução para os problemas causados pela crise econômica que assola a Europa, esses eleitores estão sendo disputados pela esquerda e pela extrema direita.

Segundo a última pesquisa do Ifop (Instituto Francês de Opinião Pública), divulgada na semana passada, Marine Le Pen é a primeira colocada entre os operários, com 35% das intenções de voto. A popularidade da candidata do partido de extrema-direita Frente Nacional caiu ao longo da campanha no quadro geral, passando de 20% das intenções de voto em janeiro para 16,5% em abril. Mas seu sucesso junto ao operariado permanece constante.

Houve uma migração do voto operário para a direita do espectro político, mas esse fenômeno deve ser visto com cautela, segundo o sociólogo Michel Simon, especialista no assunto, pois “esse grupo nunca foi homogêneo do ponto de vista político”. Em 1962, 43% dos operários inscritos nas listas eleitorais na França votavam na esquerda, dos quais 28% no Partido Comunista, enquanto 31% votavam na direita. Nos cinquenta anos seguintes, as tendências de voto entre os operários se tornaram cada vez mais parecidas com as dos outros assalariados.

Michel Simon aponta, no entanto, uma nova tendência que parece estar se esboçando na atual campanha eleitoral, com a ascensão do candidato da Frente de Esquerda, Jean-Luc Mélenchon, entre os operários – ele passou de 6% das intenções de voto em janeiro para 17% na semana passada. Seu sucesso é creditado a uma ofensiva militante nos meios operários e a seus repetidos ataques às teses da Frente Nacional. “Será preciso esperar o dia 22 de abril para medirmos o tamanho da evolução. Mas, de qualquer maneira, nunca retornaremos à situação dos anos 60”, diz ele.

Efe

Mélenchon atacou posições da Frente Nacional e recuperou terreno, mas esquerda ainda está longe de retornar ao patamar dos anos 1960

O voto operário é simbolicamente importante na França, já que é visto como medida da capacidade de um candidato de se comunicar com as classes populares. Mas numericamente ele não é decisivo em uma eleição. Existem cerca de 6 milhões de operários no país, mas essa categoria se caracteriza por um alto índice de abstenção. Além disso, a figura mítica do operário que trabalha em uma linha de montagem está se tornando marginal, pois a categoria engloba cada vez mais trabalhadores do setor de serviços.

Segurança e imigração

O presidente-candidato Nicolas Sarkozy também corteja o eleitorado operário, abusando dos temas de predileção de Marine Le Pen: a insegurança e a imigração. “Há alguns anos, a base popular da direita havia diminuído em favor da Frente Nacional, porque a imagem da UMP [o partido do governo] e de Sarkozy era de uma política dirigida às categorias superiores. Esse eleitorado popular de direita se sentiu traído e se virou para Marine Le Pen”, explica Jérôme Fourquet, diretor adjunto do departamento de opinião pública do Ifop. “Agora isso mudou um pouco, depois que Sarkozy entrou em campanha. Ele tenta falar diretamente com essa população.”

As chamadas classes populares incluem as categorias dos operários e dos empregados. Somando-se aposentados e ativos, eles representam entre 40% e 45% da população francesa. Fourquet é autor, junto com o sociólogo Alain Mergier, de um estudo sobre as razões que levam essa grande fatia da população a votar na Frente Nacional. Ele explica que o discurso de Marine Le Pen oferece soluções para várias formas de insegurança que hoje afetam profundamente essas pessoas.

A primeira delas é a insegurança física. A Frente Nacional defende mais recursos para a polícia e penas mais severas. Marine Le Pen promete, por exemplo, organizar um referendo sobre a restauração da pena de morte, abolida na França em 1981.

O segundo tipo de insegurança, a econômica e social, foi reforçada com a crise mundial. Marine Le Pen denuncia os responsáveis – o que é mais fácil para um partido que nunca esteve no governo – e anuncia um certo número de soluções, como lutar contra o monopólio da grande distribuição e baixar os impostos sobre o combustível. Ela também aponta o euro como o responsável pelo aumento dos preços e a política de construção europeia como a causa da entrada da França na era da globalização, o que resultou em fechamento e transferência de indústrias e concorrência dos países emergentes.

A terceira insegurança é cultural ou identitária, baseada na ideia de que uma forte imigração vem causando mudanças na composição da população e que as classes populares de origem francesa hoje são minoria. A marca registrada da Frente Nacional é a defesa de um controle rígido da entrada de estrangeiros no país e de uma prioridade aos franceses no uso de serviços públicos como a saúde. “Nos locais em que esses três níveis de insegurança se acumulam, a audiência da Frente Nacional é reforçada”, conclui o especialista.

“A ideia por trás do discurso da Frente Nacional é que há uma pequena minoria da população que vive bem, lucra e está adaptada à globalização, enquanto uma grande parte da população tem tudo a perder. Esse discurso ganhou mais consistência com a crise. Para muitos cidadãos, os políticos parcem não controlar mais nada”, analisa Fourquet. “Marine Le Pen captou esse sentimento e fez um discurso mais à esquerda, mais social. Ela ampliou seu eleitorado tratando de temas que eram historicamente da esquerda”.

O rápido crescimento da Frente Nacional entre as classes populares deixou as duas principais centrais sindicais do país, a CFDT (Confederação Francesa Democrática do Trabalho) e a CGT (Confederação Geral do Trabalho), em estado de alerta. As entidades distribuíram uma documentação entre seus militantes com argumentos detalhados para refutar as teses da extrema-direita.

“Os operários sofreram muito nos últimos anos devido ao grande número de indústrias que fecharam as portas e ao aumento do desemprego. Além disso, há cada vez mais assalariados em pequenas empresas, onde não existem sindicatos. Então essas pessoas isoladas podem ser influenciadas por forças políticas que vão no sentido contrário aos interesses deles”, diz Francine Blanche, membro da direção geral da CGT encarregada dos direitos humanos. Ela se diz satisfeita com os resultados da iniciativa. Marine Le Pen teve que cancelar aparições em várias empresas devido à recusa dos operários em recebê-la.

Mas a ação dos sindicatos tem seus limites, já que a Frente Nacional recruta seus eleitores majoritariamente entre os trabalhadores não-sindicalizados. Como Patrick Jeanroch, 56, operário da Peugeot em Sochaux (leste da Fraça) e secretário local da Frente Nacional: “Marine Le Pen diz a verdade, e isso pode incomodar. Sarkozy prometeu muitas coisas e não cumpriu nada. Os socialistas são mais favoráveis aos imigrantes que aos operários. São sempre os mesmos que estão no poder há 40 anos e nunca fizeram nada. Por que não experimentar Marine Le Pen?”

Campanha localizada

Efe

Essa é a pergunta que muitos eleitores fazem em Hénin-Beaumont, cidade na região do Pas-de-Calais, no norte da França, uma das mais afetadas pela desindustrialização e o consequente desemprego. Enquanto Hollande e Sarkozy se enfrentavam em um duelo de megacomícios ao ar livre em Paris, foi lá que a candidata da Frente Nacional respondeu a perguntas do público e disse que queria dar voz aos “invisíveis da política francesa”.

Marine Le Pen se apresenta como uma candidata que vive longe do pequeno mundo de políticos, jornalistas e empresários da capital, e obtém dividendos políticos com isso. “Na última eleição votei em Sarkozy, mas ele não manteve suas promessas. Marine Le Pen luta por nós. Moro em Hénin-Beaumont e temos realmente um contato muito próximo com ela, o que não acontece nos grandes partidos”, disse o comerciante Jean-Marc Narr, 42.

O operário Jean-Pierre Soufflet, 33, afirma que na empresa onde trabalha muitos colegas vão votar para Marine Le Pen devido à sua promessa de tirar a França da zona do euro. “As pessoas estão decepcionadas com a esquerda e a direita. Quando vemos os programas do Partido Socialista e da UMP, não há uma grande reforma para estimular a criação de empregos. E acho que isso será possível com as propostas de Marine Le Pen”, diz ele.

Se o discurso xenófobo da sua candidata o incomoda? “Não vejo nada xenófobo nisso. Não sou contra a imigração, mas a França não pode mais acolher toda a miséria do mundo. Marine Le Pen quer estabelecer uma cota de dez mil entradas por ano e infelizmente somos obrigados a isso hoje. Mas se a situação futura da França permitir a acolhida de 200 mil por ano, por que não?” Foi com esse tipo de argumento que Jean-Pierre Soufflet convenceu toda a família, que costumava votar à esquerda, a engrossar as fileiras de eleitores da Frente Nacional.

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