Referência na luta dos direitos da população negra, Abdias Nascimento faria 110 anos

O intelectual destacou-se na disseminação do movimento pan-africanista no Brasil

Por Patrícia Santos, Alma Preta.

Nascido em Franca, interior de São Paulo, Abdias Nascimento foi ator, dramaturgo, poeta, escritor, artista plástico, professor, político e ativista antirracista.

Filho de uma doceira e ama de leite com um sapateiro e violista, Abdias era neto de mulheres escravizadas. Sua avó paterna, nascida na África, foi violentada por um português e deu à luz seu pai, um homem que carregou durante toda a vida o fardo de ser um filho bastardo.

Abdias é considerado um dos maiores expoentes da cultura negra e dos direitos humanos no Brasil e no mundo. Dedicou sua vida e carreira à defesa dos direitos das pessoas negras e foi indicado ao Prêmio Nobel da Paz em 2010.

O ativista também foi um importante dramaturgo. Em uma viagem para o Peru, assistiu a peça “O Imperador Jones no Teatro Municipal da cidade, em que atores brancos representavam negros pintados de preto e refletiu sobre a não existência de atores negros no teatro brasileiro.

De volta ao Brasil, Abdias foi preso por agredir um delegado e mandado para a penitenciária do Carandiru, Zona Norte de São Paulo. Lá, montou um grupo de teatro com os detentos. Ao sair, criou o Teatro Experimental do Negro (TEN), em 1944, um dos mais importantes grupos de teatro da história brasileira, reunindo atores como Milton Gonçalves, Ruth de Souza e Léa Garcia.

Foi o fundador de instituições pioneiras como o Museu da Arte Negra (MAN), e do Instituto de Pesquisas e Estudos Afro-Brasileiros (Ipeafro). Criou o Memorial Zumbi, foi um dos fundadores do Movimento Negro Unificado (MNU) e atuou em frentes nacionais e internacionais como a Frente Negra Brasileira e o Pan-Africanos.

Na política, Abdias foi eleito deputado federal (1983-1987) pelo Rio de Janeiro e atuou como senador (1997-1999). Pela primeira vez na história um homem negro assumiu o cargo levantando bandeiras do movimento negro.

Em 1974, foi o único representante da América do Sul a participar do  6º Congresso Pan-Africano em Dar-es-Salaam, na Tanzânia. Durante o encontro, Abdias Nascimento foi convidado por um embaixador de Uganda a conhecer o Rio Nilo. O “batismo”, feito nas águas de um dos mais extensos rios do mundo, foi para ele o encontro com sua ancestralidade e raízes que tanto buscava.

“Aquelas águas que alimentaram tantas antigas civilizações negras me emocionaram extremamente; elas encharcaram a minha alma. Banhei-me nelas como num batismo primordial, como se de fato estivesse nascendo de novo”, escreveu Abdias em testemunho de 1976.

A ideologia do pan-africanismo é um movimento social, filosófico e político que busca promover os direitos dos povos africanos em um único estado soberano para africanos que vivem ou não no continente. O movimento teve origem no século 19, mas ganhou força no século 20, no contexto da descolonização da África e das lutas antirracistas em todo o mundo.

Entre as muitas obras de Nascimento está o livro O genocídio do negro brasileiro: processo de um racismo mascarado, que aborda o conceito de democracia racial.

Em 2024, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sancionou, sem vetos, a Lei 14.800/2024, que incluiu o nome do ex-senador Abdias do Nascimento no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria.

Abdias Nascimento faleceu em 23 de maio de 2011, aos 97 anos, por conta de uma insuficiência cardíaca. Ele ficou internado por dois meses no Rio de Janeiro por uma pneumonia, que agravou problemas cardíacos e renais crônicos e não resistiu às complicações da doença.

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