Mercosul e UE tentam destravar acordo discutido há 14 anos

cristinaPor Rafael Reis.

Após mais de 14 anos de tentativas infrutíferas, emissários do Mercosul e da União Europeia voltaram nesta semana à mesa de negociação para discutir os termos de um dos acordos de livre comércio mais ambiciosos e esperados dos últimos anos. A reunião técnica da última sexta-feira (21/03) em Bruxelas, cujo objetivo era fazer um balanço do processo e acelerar as conversas, terminou, entretanto, sem uma data marcada para o início da troca das primeiras ofertas entre os blocos.

Segundo fontes diplomáticas, embora o encontro de ontem tenha mostrado poucos avanços práticos para fixar as propostas comerciais, os negociadores puderam discutir sobre os níveis de abertura comercial que estão dispostos a aceitar. A aposta dos envolvidos no processo é que os próximos meses produzam ganhos palpáveis ao estabelecer os limites das ofertas comerciais.

Após o encontro de ontem, o chanceler brasileiro, Luiz Alberto Figueiredo, mostrou-se “muito otimista” com as perspectivas de desenvolvimento das negociações. Para ele, um acordo poderá surgir “em breve”. Por sua vez, o porta-voz europeu de comércio, John Clancy, disse que ambos UE e Mercosul sublinharam “seu forte compromisso de continuar com o processo de negociação a fim de conseguir um acordo global, equilibrado e embicioso”.

Obstáculo argentino

Um dos principais obstáculos na discussão interna do Mercosul era a posição da Argentina com relação à negociação. Em várias oportunidades, autoridades de Buenos Aires demonstraram cautela com o possível acordo entre Mercosul e União Europeia, por receio ante os potenciais impactos no seu recente processo de retomada da industrialização.

O parque industrial argentino foi desmantelado nos anos 90 com as políticas neoliberais de abertura irrestrita do país ao mercado internacional e inúmeras privatizações. Atualmente, o governo argentino implementa um processo de substituição de importações que nem sempre agrada a seus vizinhos, já que tem como consequência natural a restrição a entrada de produtos do Mercosul e de países de fora do bloco no mercado interno.

Até o início do ano, havia uma grande reticência por parte da Argentina em acelerar o processo de negociação. No entanto, após visitas de autoridades brasileiras à Argentina e de ministros argentinos ao Brasil, a última reunião do grupo técnico de negociação interna do Mercosul, que ocorreu há duas semanas em Montevidéu, foi menos conflituosa. Segundo alguns participantes dessa reunião, a Argentina havia melhorado a sua proposta de liberalização comercial. Ainda que esteja longe dos percentuais apresentados por Brasil e Uruguai, a participação mais ativa do país portenho nas discussões gerou expectativas positivas.

Liberalização x subsídios agrícolas

Antes do encontro de ontem com os europeus, os negociadores do Mercosul voltaram a se reunir de última hora e puderam subir um pouco mais o nível de ofertas comerciais do bloco — mas ainda não o suficiente. Os negociadores de ambos os blocos concordaram que é necessário avançar mais nas propostas comerciais. A União Europeia não ficou satisfeita com o possível percentual de liberalização do Mercosul que, no momento, estaria em torno dos 87%. Por outro lado, a oferta que está sendo preparada pela União Europeia na área agrícola também não agrada ao Mercosul, que exige mais abertura e menos subsídios. Quando as negociações foram relançadas, em 2010, o compromisso era de que ambos os blocos aceitariam liberar 90% do comércio de bens e serviços.

Em uma recente audiência no Parlamento Europeu, o diretor-geral de Serviço Europeu de Ação Exterior para as Américas, Christian Leffler, admitiu que “há dificuldades no Mercosul sobre a oferta que apresentariam. Estamos esperançosos, mas não inteiramente confiantes”, sinalizou Leffler.

Há muitas dúvidas do lado europeu sobre que oferta o Mercosul apresentará, já que uma coisa é o Mercosul realizar uma oferta em conjunto e outra muito diferente é uma oferta em separado. Sobre a questão, o chanceler do Uruguai, Luis Almagro, explicou que “vai depender essencialmente das conversações técnicas”, demonstrando que ainda não se sabe “se vai ser uma oferta única do bloco mais algum complemento nacional, ou se será uma oferta 2+2 (Brasil e Uruguai por um lado, e Argentina e Paraguai por outro) ou 3+1 (Brasil, Paraguai e Uruguai, com Argentina por separado)”, destacou Almagro.

Segundo Gerardo Caetano, historiador uruguaio e diretor acadêmico do Cefir (Centro de Formação para Integração Regional), uma espécie de think thank regional, Uruguai e Paraguai respaldam a postura brasileira de concluir o acordo ainda esse ano. “Não todos os países do Mercosul pensam esse acordo da mesma maneira. Está claro que a Argentina, ainda que não haja explicitado, vê com reticências”, asseverou.

Fonte: Ópera Mundi.

Foto: Telam

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