Por Mariana Branco.
Arquivado no apagar das luzes de 2018, o projeto Escola sem Partido voltará à pauta do Congresso em 2019. Na Câmara dos Deputados, a ex-procuradora e deputada Bia Kicis (PSL-DF), já protocolou um projeto de lei para ressuscitar o tema. O senador Marcos Rogério (DEM-RO) disse à Fórum que estuda também apresentar proposta sobre o assunto no Senado. O tema foi uma das bandeiras da campanha de Jair Bolsonaro (PSL) e é defendido pelo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez.
No fim do ano passado, uma comissão especial da Câmara analisou e acabou arquivando o projeto de lei 7180/14, de Erivelton Santana (Patriotas/BA), com 13 propostas apensadas. Como Santana não foi reeleito, sua proposta não pode ser desarquivada. A retomada do tema dependeria do desarquivamento de um apensado cujo autor tenha sido reeleito ou de que um parlamentar da legislatura atual apresente um novo projeto – foi o que aconteceu.
Segundo Bia Kicis, a intenção é reabrir a comissão especial e “debater bastante o tema”. “Quero suscitar o debate na Casa, pois tem novos parlamentares. A gente focou bem nos deveres dos professores, mas tentando deixar claro que não tem nada de censura”, disse ela.
A proposta apresentada por Kicis prevê que “o Poder Público não se imiscuirá no processo de amadurecimento sexual dos alunos nem permitirá qualquer forma de dogmatismo ou proselitismo na abordagem das questões de gênero”.
O artigo é quase idêntico ao incluído pelo ex-deputado Flavinho (PSC-SP), em seu relatório sobre a proposta arquivada no ano passado. No entanto, algumas questões previstas no texto anterior não são mencionadas na proposta da deputada, como a proibição no ensino do Brasil da “ideologia de gênero”, do termo “gênero” ou “orientação sexual”.
O projeto de Kicis prevê que o professor “não fará propaganda político-partidária em sala de aula nem incitará seus alunos a participar de manifestações, atos públicos e passeatas”.
Também assegura aos estudantes “o direito de gravar as aulas, a fim de permitir a melhor absorção do conteúdo ministrado e de viabilizar o pleno exercício do direito dos pais ou responsáveis de ter ciência do processo pedagógico e avaliar a qualidade dos serviços prestados pela escola.” Determina, ainda, que é “vedada aos grêmios estudantis a promoção de atividade político-partidária”. Confira a íntegra da proposta aqui.
Senado
O ex-deputado e hoje senador Marcos Rogério presidiu a comissão especial de análise do Escola sem Partido na Câmara em 2018. Na época, a oposição usou o regimento para obstruir o andamento da proposta e chegou a ser elogiada por Rogério, já que os defensores do projeto não compareciam às discussões. Ele confirmou que quer o tema de volta à pauta, dessa vez no Senado.
“Se não me engano, já tem outro tramitando. Se não tiver, vou apresentar”, disse, em conversa por um aplicativo de mensagens. A outra proposta sobre o Escola sem Partido a que Rogério se refere é de autoria do ex-senador Magno Malta (PR-ES). Ela foi retirada de tramitação pelo próprio parlamentar em novembro. Na época, os defensores do Escola sem Partido avaliavam que a proposta em análise na Câmara tinha mais chances de aprovação.
Oposição
A deputada Erika Kokay foi uma das parlamentares mais engajadas contra o Escola sem Partido em 2018. Segundo ela, a oposição pretende trabalhar “com todos os instrumentos regimentais possíveis” para que propostas com o mesmo espírito não sejam aprovadas.
Para ela, restringir a abordagem de determinados temas é “tirar a escola da rede de proteção social”. “Quantas crianças foram resgatadas, a partir da escola, de situações de abuso sexual e trabalho infantil?”, exemplifica. Ela acredita, ainda, que apesar do crescimento do conservadorismo, a sociedade civil se posicionará contra o Escola sem Partido. “As pesquisas indicam que a população quer a escola discutindo educação sexual”, afirma.
Para ela, as propostas vinculadas ao ideário do Escola sem Partido são inconstitucionais. “Eu acho que, se o Supremo é guardião da Constituição, vai barrar”.
A deputada Benedita da Silva (PT-RJ) afirma que a luta da oposição não deve ser apenas contra o Escola sem Partido. “Não estamos nos organizando para reagir só contra o Escola sem Partido, mas contra todo esse retrocesso. Primeiro tiraram o suporte [financeiro] do pré-sal, depois sociologia e filosofia do currículo com a reforma do Ensino Médio. Agora, querem educação a distância. Quem sofrerá com a precarização é quem frequenta a escola pública”.