E quando não restar mais natureza, qual turismo será possível em Porto Seguro? Por Elissandro Santana

Foto: Pixabay

Por Elissandro Santana, para Desacato.info

Esta é uma pergunta que todo cidadão porto-segurense deveria se fazer para chegar a respostas (no plural mesmo, dado que o problema é muito complexo e, por isso, demanda análises em diversas frentes) que expliquem o nosso atual quadro e viabilizem outro destino mais sustentável em torno da principal matriz de produção na cidade – o turismo. Para que isso aconteça, evidentemente, faz-se necessário uma ecologia política, tanto por parte dos governantes, como das pessoas na escolha desses que deveriam ser representantes do povo, mas que, na verdade, se comportam-comportaram, historicamente, quase todos, como representantes dos capitalistas municipais com fortes raízes coloniais com garfo e faca prontos para o abate, os grandes beneficiados economicamente por toda a exploração na cidade.

Como se sabe, a maior parte da geração de emprego e renda em Porto Seguro tem origem no turismo, é fato, como também é certo que essa matriz precisa ser repensada no município e em toda a Costa do Descobrimento (Ou Costa da Invasão), pois somente a partir de práticas turísticas sustentáveis por meio da conservação e da preservação de ecossistemas, dois fenômenos distintos e, ao mesmo tempo, interseccionados e complementares, será viável e possível, de forma salutar, na cidade e em toda a região, a continuidade do turismo.

Como não dá para discutir turismo sem falar sobre política e economia, é importante perceber os entrelaçamentos entre o modus operandi insustentável do turismo na cidade e como isso se relaciona diretamente com a gestão local (entenda-se o executivo, o legislativo e seus/suas atores/atrizes sociais de condução da máquina da destruição, inclusive, com o apoio de secretarias e de órgãos que deveriam proteger o nosso bem maior, o capital natural e seus muitos serviços ecológicos, mas não o fazem). Infelizmente, a gestão pública, ao longo da história, se mostrou mais favorável aos grandes empresários que lucram com o turismo e com as ramificações econômicas que este desencadeia do que com o desenvolvimento pleno do ponto de vista ambiental, social e econômico municipal, elemento que se evidencia na pobreza que ano após ano cresce aqui nas terras da invasão pelos lusitanos em 1500 e que seguem sendo exploradas em seu grau máximo na atualidade.

Dentre as ramificações econômicas em decorrência do turismo, estão a explosão de condomínios e a ampliação substancial dos espaços para as atividades de turismo e hotelaria em diversas partes do município. Todo esse processo, sem margem para dúvida, tem sido conduzido ao custo da diminuição de áreas verdes e esgotamento do capital natural e seus serviços ecossistêmicos, o que é um paradoxo, dado que a imagética do turismo na cidade atrai visitantes, nacionais e internacionais, justamente pela semiótica e semântica do paraíso. Paraíso este que a cada ano tem se desconstruído e enfraquecido do ponto de vista ambiental, fator que suscita várias interrogações ou, pelo menos, deveria suscitar. Esse cenário nos convida a fazer as seguintes indagações: e quando o paraíso se esgotar por completo e a cidade deixar de ser vendida como um pacote-objeto a ser consumido pelos que aqui chegam? O que sobrará? Que futuro será possível?

Com os déficits ambientais em curso, com a deterioração de alguns dos espaços usados pelo turismo, quais outros pontos serão explorados? E o que impede uma ecologia política que consiga ver a cidade para além de um objeto e que não se venda para o capital? O que faz com que a gestão pública municipal não entenda que sem uma agenda de governança ambiental a semântica de Porto Seguro como paraíso dará lugar ao pesadelo? Essas são perguntas importantes e nós, moradores e eleitores, somos responsáveis por fazer com que as lideranças locais, hierarquizadas na base, entendam que na horizontalidade das relações será possível pensar em respostas que nos levem a outro futuro.

Já que estamos discutindo que a dimensão política é importantíssima para uma matriz de geração de desenvolvimento na cidade que se arvore na sustentabilidade, cabe destacar que no Legislativo, na atualidade, em Porto, até onde sei, há um nome político preocupado com as questões ambientais no município, Vinícius Parracho, mas precisamos de muito mais do que um para a ampliação de horizontes de luta e sentidos para a tessitura do amanhã. Para isso, devemos começar a pensar em escolhas e decisões eleitorais voltadas para projetos políticos que se direcionem para a conservação e para a preservação ambiental na cidade, aliás, na perspectiva nacional também, para que, desta maneira, os serviços ecossistêmicos que viabilizam o turismo na região sigam existindo e gerando emprego e renda de forma sustentável e sustentada nos pilares do desenvolvimento inclusivo. Para tanto, precisamos vencer a nossa ignorância política para uma percepção holística de tudo o que emperra o nosso crescimento.

Por fim, é oportuno mencionar que o paraíso está se esvaindo e, cada vez mais, dando sinais de esgotamento, por isso, é chegada a hora de pensar o turismo, entrelaçado com a política e a economia da cidade e região, a partir de outra ótica, de uma lógica voltada para a sustentabilidade que viabilize o uso dos espaços naturais como praias, rios, áreas urbanas, áreas verdes e outros pontos pensando-se no hoje e no amanhã, com alicerces sólidos nos pressupostos da conservação ambiental, aliás, socioambiental, dado que grande parte dos moradores locais é tão explorada quanto a natureza da qual também faz parte!

Elissandro Santana é membro do Grupo de Estudos da Teoria da Dependência – GETD, coordenado pela Professora Doutora Luisa Maria Nunes de Moura e Silva, revisor e editor de meio ambiente da Revista Latinoamérica, colunista da área socioambiental, latino-americanicista e tradutor do Portal Desacato.
A opinião do/a autor/a não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.
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