Quando acabou a homenagem recebida no lotado e luxuoso palácio da advocacia (Col·legi d’Advocats, em Barcelona, o equivalente a Ordem dos Advogados, no Brasil), Dilma parou dois minutos, aproximadamente, olhando nos olhos tristonhos da pequenina – e gigantesca – Susanna Barreda. Em silêncio, as lágrimas não caíram por muito pouco, na sala reservada onde se encontraram.
Eu conheci o marido de Susanna, Jordi Sánchez (9 anos de prisão política ditadas pelo Reino da Espanha) , no dia que ele assinou meu contrato de trabalho na fundação social que ele dirigia, a prestigiosa Fundació Jaume Bofill. Perguntei a Susanna pelo seu especial interesse em conhecer pessoalmente a ex Presidenta do Brasil afastada por um golpe político que iniciou a ascensão do atual governo Bolsonaro. “Por ser uma mulher valente e por também haver sido presa política, Dilma sempre me chamou atenção; e por isso, a admiro”.
“Quem é ela?”, perguntou Dilma (em relação a Susanna) a Telma Negrao, a assessora que a acompanhava por toda a viagem europeia. O seu marido é um preso político independentista catalao, expliquei, sem demora – pois, por estar muito emocionada, Susanna tampouco havia se apresentado à Telma, nem à Dilma. “Chegaram a conversar com o Lula?”, devolveu-me Dilma com outra pergunta, fazendo referência ao que antes havíamos comentado: a visita de Lula ao Palácio do Governo Catalao, dois anos atrás, para receber o Prêmio Internacional Catalunha, o mais importante em matéria de relações internacionais do governo catalao. Não, respondi. Expliquei que no dia de receber o prêmio, Lula somente falou com os líderes “socialistas”, os ex presidentes Felipe González (que eu creio estar contente com as prisões políticas e a defesa intransigente da monarquia espanhola) e Zapatero (que pouco ou nada fez para impedir que os promotores públicos acusassem os presos políticos, alegando suposta neutralidade). Afirmei com a propriedade que o momento exigia pois fui testemunha, pessoalmente, inclusive do abraço demorado de González a Lula, velhos companheiros.
Hoje, no quarto dia do ano 2021, fiquei emocionado ao lembrar daquele encontro entre Dilma e Susanna, mais que a companheira de Jordi Sánchez. Depois daquele dia, nunca mais as reencontrei. De Jordi Sánchez eu soube recentemente, por um amigo de visitas (à prisão), que sempre pergunta por Lula e pelas ameaças à democracia no Brasil.
Não é novidade a foto de Yoko Ono, Ai Wei Wei, Joan Baez, Gerry Adams, Chosmky, Prêmios Nobel, Políticos de prestígio mundial, dirigentes da ONU entre outros declarados apoiadores das reivindicações de autodeterminação da Catalunha. Dessa vez, todo o destaque recai – ainda mais que as demais 50 principais assinaturas – sobre a foto em primeiro plano de Dilma Rousseff nos principais jornais do mundo ocidental.
No dia 15 de março de 2021 o Congresso Espanhol debaterá sobre a Anistia Política. Um debate muito mais amplo do que se a Catalunha exercerá (e quando; para mim esta é a questão) o direito de decidir sobre o seu próprio futuro. De fato, um debate político sobre a criminalização do direito humano de liberdade de expressão. Nada mais. E tudo isso.
Dilma sabe, portanto, muito bem sobre o que está apoiando e dando, novamente, bom exemplo ao mundo.
Concluo este texto, assinando o manifesto junto com a Dilma (https://amnistiaara.cat/signatures/) e ampliando, eu mesmo, a pergunta que ela nos fez sobre o Lula: ele ainda não sabe o que está passando? Até quando seguirá informando-se pelos carcereiros políticos? Quando, “o maior preso político do mundo” (segundo Chosmky), apoiará o fim de uma injustiça mundial chamada Lawfare – com semelhanças com o que ocorreu com ele mesmo?
A esperança equilibrista dança na corda bamba de sombrinha. O poeta Aldir Blanc já dizia.
E você? Assinas comigo?
Aquele abraço.
Flávio Carvalho é sociólogo e escritor, participante da FIBRA e do Coletivo Brasil Catalunya.
@1flaviocarvalho. @quixotemacunaima.
