Democratização da Comunicação (1). Por Raul Fitipaldi.

Por Raul Fitipaldi, para Desacato.info.

Muito tem se escrito, debatido e organizado durante os anteriores governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff sobre a Democratização da Comunicação. O resultado prático foi pequeno, embora houve uma tomada de consciência inicial sobre o assunto. Ante um novo governo do presidente Lula, depois de suportar uma agressão permanente ao jornalismo, à comunicação popular e à verdade, por parte do governo canalha de Jair Bolsonaro, o tema volta à tona com força.

Em função da necessidade e urgência da reinstalação do debate, a essa “democratização da comunicação” quero me referir nos meus artigos das quintas-feiras. Será para resgatar ou analisar conceitos já vertidos antes, ou para mergulhar em novas situações e ideias que se apresentam para, por exemplo, a mídia, e ou jornalismo, chamado de forma estafante, de alternativo ou independente. Prefiro, a partir destas reflexões, e enquanto o cenário continue como está, falar de mídias excluídas e auto-excluídas.

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À parte de denominações tais ou quais, o debate está no centro e não na periferia da Soberania Comunicacional, da qual no Brasil se fala pouco e se escreve menos. No momento adequado conversaremos aqui sobre essa soberania escondida, essa irmã desprezada, sem valor estratégico aparente com relação às outras soberanias. Por enquanto vamos, a cada semana, introduzir algumas inquietudes acumuladas no decorrer dos anos no veículo e empreendimento cooperativo para o qual trabalho: o Portal Desacato.info da Cooperativa Comunicacional Sul, no estado comunicacionalmente periférico de Santa Catarina, ao sul do eixo dominante composto por São Paulo e o Rio de Janeiro. E claro, vamos ficar atentos à evolução no novo governo federal da discussão relativa ao assunto.

Lá pelo mês de agosto de 2022, no evento dos 15 anos do Portal Desacato, mas não no debate, a jornalista Cristina Serra me falava da asfixia proposital a produtos jornalísticos como Desacato.info ao longo do Brasil. Por outro lado, em todos estes anos tenho e temos respondido dezenas de pesquisas, participado de debates, dado entrevistas a estudantes e profissionais da comunicação, e também de outras disciplinas, geralmente de sociologia, filosofia, história, antropologia e até economia, sobre o que fazemos e como nos definimos: mídia independente ou alternativa? Essa pergunta dita e escrita tantas vezes sempre me deixou um barulhinho dançando no inconsciente. A pergunta precisaria, talvez, outra definição mais precisa de olho ao cenário. Aquela percepção levantada pela Cristina, mas, sobretudo a realidade de quase 16 anos de trabalho diário sem faltar um dia, me levaram àquela definição, ainda a ser investigada além das sensações, que coloquei no primeiro parágrafo: nem independente nem alternativa, excluída e, talvez, por falta de ousadia a respeito de exigir os direitos que cabem, auto-excluída.

O certo é que pagando impostos em dia, vultuosa quantidade sem retorno prático algum, nem para nós nem para a sociedade, com nosso CNPJ em pleno estado de legalidade, criando fontes de emprego em tempos de demissões em massa, com o aporte de todos os direitos laborais que boa parte da mídia nega, e sim, com um salário mísero produto da asfixia, nunca jamais sequer fomos consultados, convidados, ou o que for para receber a parte do bolo que nos pertenceria. Ninguém quer um pedaço de torta do tamanho que recebe a mídia tradicional, mas daí a não receber um centavo nunca jamais de acordo ao número de postos de trabalho ou da audiência que a gente gera, sei lá, escolha o critério que achar melhor, há muita distância.

Não é através das leis de incentivo à cultura que um veículo de comunicação precisa entrar na briga para obter a pauta da divulgação social de prefeituras, estados e federação, para, por exemplo, campanhas de saúde, educação, trânsito, segurança, etc. É através da fatia que lhe corresponder, ao menos na cidade onde tem sua sede, por divulgar essas informações e receber um emolumento ínfimo, se for o caso e justo. Nem sequer, no início se pleitearia receber como recebem as mídias de propriedade das elites, aquelas que chamamos, com certo grau de eufemismo, de mídias tradicionais. Quem sabe elas são menos críticas em função do afago milionário que dispendiam estados e municípios em ávidos bolsos capazes de ajudar a decidir quem se elege e quem não na hora do voto. Pode ser, sobretudo nas áreas provinciais.

Dessas questões e outras muitas precisamos falar na hora de discutir Democratização da Comunicação no Brasil, de forma prática, concreta e com base na realidade dos modelos de jornalismo existentes submetidos ao arbítrio dos poderes instituídos, que através da seleção darwiniana da divisão do bolo, determinam se um projeto pode existir e se desenvolver ou não. Seguimos com este longo assunto na quinta-feira próxima. Até lá e boa sexta!

Edição e publicação: Tali Feld Gleiser.

Raul Fitipaldi é jornalista e cofundador do Portal Desacato e da Cooperativa Comunicacional Sul.

A opinião do/a/s autor/a/s não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.

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