Alianças em um mundo multipolar: por que a visita da Rússia é conveniente para América Latina?

"É um bom momento para a Rússia e os países latino-americanos chegarem a um consenso sobre vários assuntos." Maria Cristina Rosas

Foto: Fabio Rodrigues/EBC.

A viagem do chanceler russo, Sergei Lavrov, à América Latina é uma oportunidade para que as nações dessa região tenham o apoio de Moscou, considera a acadêmica do Centro de Relações Internacionais da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM) e participante da IV Conferência Internacional sobre Segurança, Sandra Kanety.

De 17 a 21 de abril, o chefe da diplomacia russa percorre Brasil, Venezuela, Nicarágua e Cuba, onde mantém reuniões de alto nível com chefes de nações e ministros de Relações Exteriores.
“[Cuba, Brasil, Nicarágua e Venezuela] poderiam se beneficiar de maneira geral, pois teriam o apoio de uma potência geopolítica como a Rússia nesta nova formação de alianças dentro do mundo multipolar onde os Estados Unidos, sem dúvida, estão perdendo hegemonia”, comenta a especialista em entrevista à Sputnik.
Além disso, Kanety aponta que algumas dessas nações foram relegadas durante anos pelas políticas de Washington ou da Europa, que impõem bloqueios econômicos ou provocam golpes políticos em seus países.
“Isso é muito importante na formação de alianças porque a Rússia quer demonstrar presença política nessa região”, observa.
Nesse mesmo sentido, a doutora em relações internacionais pela Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM), María Cristina Rosas, garante que é um bom momento para a Rússia e os países latino-americanos chegarem a um consenso sobre vários assuntos.
“A visita de Lavrov também buscará estreitar laços com eles e fortalecer o vínculo que eles têm nos campos econômico, mas acima de tudo na gestão política, já que [alguns] deles são antagonistas dos Estados Unidos“, disse a especialista.

Brasil, o ponto central

Lavrov iniciou sua viagem de trabalho pela América Latina no Brasil e, segundo a professora da UNAM, isso não é coincidência, já que é um dos países mais populosos da região e está se posicionando como uma potência em questões energéticas.
Além disso, “[o Brasil] tem uma interferência muito importante em questões de política interna no continente americano. Também é membro do BRICS [grupo composto por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul], essa associação econômica que detém mais de 30% do produto interno bruto [PIB] global, onde a Rússia é também um membro ativo, juntamente com Índia, China e África do Sul”, diz Kanety.
Outro ponto que torna este país de língua portuguesa mais relevante é a sua posição sobre o conflito na Ucrânia.
“Lula tem enfatizado, pela neutralidade com que o Brasil tem assumido, querer liderar uma espécie de estratégia de paz que ponha fim ao conflito entre a Rússia e a Ucrânia. Isso é fortalecer o Brasil como líder político na região; para a Rússia, isso é muito importante”, sublinha a especialista.
Diante disso, Rosas, que também é professora de Estudos para a Paz e Resolução de Conflitos na Universidade de Uppsala, na Suécia, destaca que o convite do presidente russo, Vladimir Putin, ao seu homólogo brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, compensa neste assunto, especialmente se o político sul-americano concordar em viajar para Moscou.
“Para apoiar o processo de paz que Lula tem falado com Xi Jinping na China, seria necessário que ele visitasse a Rússia. Claro, o Brasil deve calcular as consequências que isso teria em suas relações com o Ocidente porque [o presidente brasileiro] tem sido muito criticado pelos europeus e pelos Estados Unidos: dizem que Lula está colocando o agressor e a vítima no mesmo patamar nesse conflito, mas a realidade é que o [processo] está parado. Por isso, é importante encontrar mecanismos para começar a desativá-lo e desenvolver o caminho para que ocorra um cessar-fogo“, frisou a professora.

Reações nos EUA e em Bruxelas

A viagem que o chanceler russo faz nesta semana pela América Latina gerou descontentamento na Europa e em Washington.
Prova disso são as declarações do coordenador de Comunicação Estratégica do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, John Kirby, que rejeitou a posição de Lula da Silva sobre o conflito na Ucrânia.
autoridade dos EUA acredita que Lula está apenas repetindo o que chama de “propaganda russa e chinesa”, enquanto o Brasil fortalece seus laços com Pequim e Moscou.
Para Kanety, esse tipo de reação mostra a rejeição do Ocidente ao plano da Rússia de estabelecer laços de cooperação em questões comerciais, econômicas, técnicas e culturais em nível global.
“A Rússia está fazendo o que qualquer potência faria para manter seu poder [no mundo]”, conclui a especialista.

 

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