A corrida dos partidos por votos e recursos na internet em 2018

Por Beatriz Drague Ramos.

A internet e as redes sociais certamente serão arenas disputadas pelos candidatos às eleições de 2018, mas transformar o apoio virtual de eleitores em recursos de campanha não será nada fácil. Com a proibição das doações empresariais de campanha em 2015, teremos pela primeira vez uma eleição a presidente com veto a contribuições de pessoa jurídica. As dificuldades de arrecadação, já explícitas na campanha de 2016, devem ser ainda maiores este ano, dado o alto valor das campanhas à Presidência e aos governos estaduais.

A falta de recursos empresariais exigirão dos candidatos criatividade e um investimento maior em ações de crowdfunding, a “vaquinha” virtual. As primeiras experiências no País ainda são incipientes e tem sido conduzida principalmente por partidos do campo progressista, a exemplo do PSOL.

Em 2014, a candidata Luciana Genro (PSOL) apostou no crowdfunding. À época, ela conquistou perto de 11% de sua arrecadação total por meio de doações digitais. A prática ajudou a candidata a dobrar a arrecadação em relação ao candidato do PSOL em 2010, Plínio de Arruda Sampaio. As principais campanhas negligenciaram o mecanismo: menos de 0,3% das doações de Dilma Rousseff e Marina Silva vieram por meio de doações de pessoas físicas na internet.

As campanhas faraônicas das eleições de 2014, em que Aécio Neves (PSDB) informou ter gasto 227,4 milhões e Dilma Rousseff (PT) 350,2 milhões de reais, não devem se repetir no próximo pleito, tanto pelas dificuldades de arrecadação como pelo teto de gastos imposto pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O limite para o cargo de presidente é de 70 milhões de reais no primeiro turno, e mais 35 milhões em caso de segundo turno.

A ausência de recursos de empresas já foi posta à prova nas eleições municipais de 2016. A falta de doações de pessoas jurídicas fortaleceu os candidatos milionários, a exemplo de João Doria, atual prefeito de São Paulo, que despejeou quase 3 milhões de reais de sua própria fortuna em sua campanha vitoriosa.

Em relação ao crowdfunding, o PSOL seguiu como protagonista em arrecadação. No Rio de Janeiro, Marcelo Freixo bateu o recorde de maior financiamento coletivo no Brasil, com mais de 1 milhão de reais doados pela internet por pessoas físicas.

Segundo Daniel Falcão, professor de Direito Eleitoral da USP e do Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP), o caso de Freixo “é uma exceção à regra”, disse. “Há candidatos que diante de seu carisma, de seu notório conhecimento de como utilizar as redes sociais, e fazer recursos utilizando esse nicho, vão arrecadar algum dinheiro para as campanhas. Freixo é um exemplo, Jean Willys é outro. Os demais candidatos não têm conhecimento do uso da internet”, completou.

Para o especialista a tradição de doação de dinheiro de pessoa física para campanhas ainda é muito pequena no País. “Teremos uma relevância maior no uso das redes sociais do que nas eleições anteriores, mas não tão grande em relação ao montante que será arrecadado em campanhas”, alegou.

Há quatro anos, o custo total de 5,1 bilhões de reais das eleições foi mobilizado, sobretudo, por empresas. Um bilhão de reais veio de contribuições das dez maiores empresas doadoras. JBS, Odebrecht, Bradesco, Andrade Gutierrez e OAS, grande parte delas envolvidas na Lava Jato, bancaram as principais legendas. Todavia, em 2018 o cenário ainda será ambíguo. O fundo que deve financiar as legendas ainda continuará farto, mas terá um volume reduzido em razão do congelamento dos gastos públicos.

Para o professor Falcão, a maior preocupação deverá ser com a fiscalização adequada dos gastos de campanha, sobretudo, em como o dinheiro entra na campanha e como o dinheiro sai. Os gastos com a propaganda na internet demandarão vigilância do TSE.

“Em 2014 os gastos de campanha foram absurdos se comparados com a campanha de 2002. Na primeira campanha de Lula e de Serra gastaram-se por volta de 35 milhões a 40 milhões de reais cada. Em 2014, Dilma e Aécio, por volta de 300 milhões cada. Ali o fluxo de juros aumentou de uma forma absurda. O controle foi malfeito”, afirma.

Criado pela Lei nº 13.487/2017, o novo Fundo Eleitoral custará 1,7 bilhão de reais aos cofres públicos. A distribuição do chamado “Fundão” terá apenas 2% de seus recursos divididos igualmente por todos os partidos. O restante da divisão terá como critério o tamanho das representações nas bancadas no Congresso, considerandas com base na representanção existente em agosto de 2017.

Será destinado um montante de 35% aos partidos com deputados eleitos, na proporção dos votos recebidos para a Câmara dos Deputados; 15% serão divididos na proporção da bancada no Senado e 48% divididos na proporção das bancadas na Câmara.

O Fundo Partidário já existente cobre, por exemplo, a manutenção das sedes dos partidos, a propaganda política, as campanhas eleitorais, a educação política e o pagamento de pessoal. Sua verba provém da arrecadação de multas eleitorais, recursos financeiros destinados por lei, dotações orçamentárias da União e doações de pessoas físicas. Em dezembro de 2017, o valor dos repasses já havia chegado a 721,8 milhões de reais.

A distribuição destina 5% aos partidos em partes iguais, os outros 95% distribuem-se na proporção dos votos obtidos na última eleição para a Câmara dos Deputados.

Ainda sob decisão do TSE, o teto para o autofinanciamento de campanhas permitia que os candidatos utilizassem 10% dos rendimentos brutos verificados no ano anterior à eleição para doar às suas próprias campanhas. No entanto, Temer vetou tal medida e o Congresso derrubou o veto apenas em dezembro de 2017. A controvérsia está na Constituição Federal, que prevê que qualquer alteração só valerá para a eleição seguinte se estiver em vigor um ano antes do pleito.

As dificuldades para financiamento de campanhas está gerando grande preocupação nos grandes partidos. A crise da política formal deverá ser enfrentada pelas grandes legendas, caso estas se arrisquem na tentativa de obter de recursos por meio de canais virtuais.

Secretário-geral do PSDB, legenda que mais arrecadou nas últimas eleições municipais, o deputado federal Marcus Pestana discorda da distribuição do fundo eleitoral e do teto de gastos.

“Os grande partidos têm candidato a presidente, a governador, e agora têm menos dinheiro, então isso é um paradoxo. Os partidos pequenos têm condições muito superiores, pois eles não são partidos com vida orgânica, não têm gastos com diretores regionais, assessoria jurídica ou mesmo assessoria de imprensa. Do ponto de vista do financiamento, os partidos médios e pequenos têm condições superiores”, lamentou.

Segundo o Secretário Nacional de Assuntos Institucionais, José Guimarães, do PT, o partido deve apostar mais nas plataformas virtuais nestas eleições, tendo como prioridade a eleição do cargo de presidente e de deputados federais.

“Vamos fazer o mesmo que Obama fez, algo muito inovador no processo de mobilização virtual e de arrecadação para a campanha de Lula. Nós vamos seguir rigorosamente a legislação eleitoral, lutamos muito por ela, o financiamento público com teto foi uma grande vitória. Vamos pedir dinheiro ao povo, contribuições individuais com transparência e com monitoramento pela direção nacional e pelo TSE”, explicou.

Convergindo com o petista, Marcus Pestana, cujo partido teve perda de 10 mil filiados ao longo do ano de 2017, também pretende utilizar-se do exemplo americano. “Nós vamos ter de mudar as estratégias, vai ter de ser uma coisa ‘à americana’, utilizar o crowdfunding”, disse.

O financiamento eleitoral popular via internet passou a ser defendido, em 2008, após a vitória de Barack Obama nas eleições para a Casa Branca. O ex-presidente obteve mais de 3 milhões de dólares de pequenas doações físicas pela internet, dentro do anúncio de um total de 500 milhões de dólares. Mesmo assim, o professor de direito eleitoral Daniel Falcão encontra contradições no discurso da “novidade Obama”.

“Realmente, as empresas são proibidas de doar dinheiro para campanhas, mas lá existe uma coisa totalmente distinta do Brasil, os Comitês de Ação Política (PAC). Essas organizações foram criadas por pessoas comuns, defendendo ou atacando um candidato, e eles podem receber dinheiro de empresas, porque eles não fazem parte da campanha dos candidatos. Por exemplo, no ano retrasado, o comitê de Hillary, a favor dela ou contra Trump, recebeu dinheiro de empresas para fazer a campanha dela. As empresas participam, sim, das eleições americanas, mas de forma indireta”, explica Falcão.

O bom uso das redes sociais, utilizadas pelo PSOL, trouxe efeitos positivos nos últimos anos. O partido de esquerda liderou o ranking de novos filiados em 2017. No total, foram 24 mil novos filiados. A legenda é, porém, o 25º partido nesse quesito.

Cientista social e tesoureira do PSOL, Mariana Riscali afirma que o descrédito com a política tradicional vem atraindo muitas pessoas para o partido, na medida em que este não foi citado pela Lava Jato, e tem os parlamentares mais bem avaliados todos os anos na Câmara dos Deputados.

Ademais, Riscali não acredita que os novos modelos de financiamento eleitoral possam democratizar o processo, e vê a permissão para impulsionamento de posts e a distribuição do fundo eleitoral como forma de reprodução de uma estrutura desigual de acesso dos partidos às ferramentas de campanha. Por isso, a política de financiamento físico de campanhas faz parte do estatuto do partido.

“O impulsionamento de postagens deverá ser acompanhado com atenção, pois acaba interferindo um pouco na ideia de engajamento espontâneo das pessoas pelas redes sociais, e pode correr o risco de ter um direcionamento muito grande e uma distorção da campanha nas redes. Campanhas com  máquina maior têm maior financiamento, podendo colocar muito dinheiro no impulsionamento e acabar levando também para o campo da internet essa maior desigualdade”, conclui.

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