Desde que foi consumado o golpe contra Dilma Roussef em 2016, o preço dos combustíveis vem subindo assustadoramente. A gasolina, que não chegava aos R$ 3,00 por litro, anda na casa dos R$ 7,00; o botijão de gás de cozinha, que custava em torno de R$ 40,00, já atingiu os R$ 120,00.
Nada a estranhar para aqueles mais atentos que sempre souberam que a motivação maior para a deposição do governo petista estava centrada no propósito de se apoderar das grandes riquezas que as recém-descobertas jazidas do pré-sal significam e dos gigantescos rendimentos produzidos por nossa empresa emblemática, a Petrobrás.
A atuação orquestrada para transferir para o usufruto privilegiado de um reduzido número de grandes acionistas privados (substancialmente, estrangeiros) os ganhos gerados por essa empresa construída com o sacrifício e dedicação de todo nosso povo contou com a participação de vários agentes de peso em diversos campos de atividade.
Foi um trabalho sincronizado envolvendo órgãos de espionagem dos Estados Unidos e de outros países neocolonialistas, assim como boa parte do comando de nosso sistema de justiça, vários representantes da política neoliberal, além do indispensável papel prestado por quase toda a mídia corporativa (rede Globo, Band, Record, SBT, Veja, Folha de S. Paulo, Estado de S. Paulo, para citar alguns). Muito provavelmente, tivemos aqui o maior e mais bem entrosado plano de ações conjuntas já posto em andamento no planeta por forças combinadas do imperialismo e das instituições representativas dos interesses dos capitalistas locais, com vistas a derrubar um governo não-alinhado para se apropriar das principais riquezas do país.
Consequentemente, com a posse de Temer, o caminho para a concretização do objetivo almejado começou a ser trilhado. Uma de suas primeiras medidas foi entregar para empresas estrangeiras aquelas jazidas de petróleo que só puderam ser descobertas e passíveis de exploração com os esforços e a dedicação de técnicos da Petrobrás, custeados e mantidos com o suor de todo nosso povo. Mas, a espoliação não se deteve por aí.
Para propiciar que aquilo que deveria servir para beneficiar toda a nação se transformasse em lucros nababescos para os grandes capitalistas detentores de ações da Petrobrás, o que se fez foi um atrelamento dos preços de venda dos combustíveis aos praticados em dólar no mercado internacional. Mas, vejam bem, só os preços finais de venda deveriam entrar nessa normativa. Os salários e demais custos de produção internos continuariam a funcionar na base tradicional do mercado interno, ou seja, pagos em moeda nacional com base nas condições internas normais.
Sim, é verdade, os preços estão agora insustentáveis e nosso povo está sofrendo as consequências. Não é à toa que o atual ocupante da presidência está vendo sua impopularidade aumentar de modo vertiginoso a cada dia. E esta parece ser a causa de sua grande agonia. A perspectiva de que ele consiga manter sua base de sustentação eleitoral vai desaparecendo rapidamente, mesmo entre aqueles que fazem parte do chamado “núcleo duro” do bolsonarismo.
Como o exorbitante aumento nos preços dos combustíveis é uma das causas mais visíveis de descontentamento popular, o atual governante está buscando desesperadamente uma maneira de reduzi-los nestes meses prévios às eleições. Depois, passado o pleito, isso já não seria problema. Tudo poderia voltar a sua “normalidade”, ou seja, ao gosto do “mercado”.
Num país com tão graves problemas sociais, podemos até considerar como sendo criminosos os percentuais de remuneração dos dividendos dos acionistas privados da Petrobrás disponibilizados nos últimos anos. As cifras pagas a seus rentistas estão duas, três ou quatro vezes acima da média obtida da taxa de remuneração dos acionistas das principais empresas petroleiras mundiais. Para comprovar isto, basta fazer um breve cálculo com base no levantamento de quanto pagaram de dividendos nos últimos cinco anos as dez principais empresas do ramo no mundo.
Na verdade, se o governo bolsonarista quisesse minorar o sofrimento de nossa população, seria muito simples e rápido fazê-lo. Bastaria se comportar como era feito nos governos de Lula e Dilma e orientar a direção da Petrobrás a não colocar em prática a famigerada política de PPI (paridade com os preços internacionais). Visto que o grosso dos custos de produção da Petrobrás continua no mesmo patamar de antes, os valores finais de venda de seus produtos poderiam ser enormemente reduzidos sem que os acionistas viessem a ter prejuízo. Claro, ganhariam menos do que agora, mas continuariam ganhando, e muito, sem nenhum prejuízo.
No entanto, como o bolsonarismo veio para atender os interesses do grande capital financeiro e imperialista, esta decisão não está em seu leque de alternativas. O que o atual presidente (e toda a mídia corporativa) deseja é que haja uma diminuição nos preços que sirva para livrar sua cara nas eleições vindouras, mas que os custos disto sejam arcados pelo próprio povo.
É daí que vem a “brilhante” ideia de fazer com que a redução dos preços dos combustíveis se dê com a eliminação das tributações locais sobre os mesmos. Em outras palavras, o bolsonarismo (e toda a mídia corporativa) está disposto a retirar recursos da educação pública, da saúde pública, da moradia popular, etc., para bancar uma diminuição dos valores de venda dos combustíveis sem tocar nos exorbitantes lucros dos acionistas privados. Resumindo, para ter gasolina e gás mais em conta, o povo vai ter de ficar sem atenção médica, sem escola pública, sem moradia… Tudo bem, o que não pode é os rentistas privados ganharem menos.
Oportunisticamente, o governo também vislumbra se aproveitar da crise criada por ele mesmo para gerar condições de entregar de vez a Petrobrás para o controle privado. Neste momento, o bolsonarismo aspira a concretizar o velho sonho oligárquico de privatizar nossa empresa símbolo, essa que surgiu e se consolidou pelo trabalho abnegado de várias gerações de brasileiros. O que se pretende é consolidar a crença de que a culpa pelos angustiantes preços praticados é da Petrobrás, e não do governo bolsonarista.
Também não podemos deixar de levar em conta que, neste projeto de incriminar a Petrobrás para privatizá-la mais facilmente, toda a mídia corporativa (a rede Globo, a Band, a Record, o SBT, a FSP, o Estadão, etc.) está decididamente associada ao bolsonarismo, pois essa mídia representa (e, muitas vezes, faz parte) as classes dominantes rentistas.
Portanto, não devemos admitir que o bolsonarismo e a mídia corporativa se isentem de suas responsabilidades pelo atual estado de coisas. Devemos exigir o fim da política de PPI e um redirecionamento das atividades da Petrobrás em conformidade com os interesses da nação, e não com o egoísmo ganancioso de seus acionistas privados.
Jair de Souza é economista formado pela UFRJ; mestre em linguística também pela UFRJ.
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