As razões de Gustavo Petro para escolher Francia Márquez como vice na Colômbia

Gustavo Petro e Francia Márques – Foto: Mariano Vimos – Reuters

Por Ociel Alí López.

Seu protagonismo estabelece um novo plano que redimensiona politicamente o petrismo e o conecta com novos setores, públicos e eleitores.

O anúncio de Francia Márquez como a fórmula da vice-presidência de Gustavo Petro indica uma mudança no campo do cenário eleitoral na Colômbia, mas também na cultura política.

Assim que foi nomeada, a líder, que ficou em segundo lugar no Pacto Histórico interno, tornou-se uma referência que modifica a imagem do atual país Uribe. Para além do impacto na esfera política, estamos falando de uma mudança de imaginário, do que imaginamos quando pensamos no significante Colômbia, para o qual várias figuras públicas mundiais, como Snoop Dogg, imediatamente o apoiaram.

Com ele, a corrida presidencial abre um flanco para jovens, mulheres e setores excluídos que veem em Petro um político que pertence ao ‘establishment’ da esquerda. Assim, seu protagonismo estabelece um novo plano que redimensiona politicamente o ‘petrismo’ e o conecta com novos setores, públicos e eleitores.

Márquez vem dos setores emergentes, é uma líder territorial afro-colombiana e uma lutadora de direitos humanos que conquistou sua legitimidade lutando em um país onde os massacres contra líderes sociais como ela são o pão de cada dia.

Já em termos políticos, sua nomeação significa a tentativa de privilegiar a contradição incluída-excluída e diminuir a prevalência da contradição entre esquerda-direita, entendida sob o sistema de perseguição imposto pela direita contra a insurgência.

Ao contrário daqueles que esperavam um companheiro de chapa mais parecido com o “liberalismo clássico”, a decisão foi adicionar mais gás ao confronto eleitoral. A estratégia agora se baseia em questionar e não em tranquilizar os eleitores do centro.

Dessa forma, Petro dobra a aposta porque ao aceitar a companhia de um líder popular que atrai os grandes bolsos de indecisos, votos em branco e os setores mais excluídos da economia e da política, ao mesmo tempo em que desiste de questionar o ex-presidente César Gaviria e seu Partido Liberal. Após este último, o terreno será mais difícil de vencer, mas se o fizer, vencerá sozinho e não “em má companhia”.

Ao contrário daqueles que esperavam um companheiro de chapa mais parecido com o “liberalismo clássico”, alguém muito mais “bebível” para as potências colombianas e que daria tranquilidade aos setores que uma vitória do Petro deixa “nervosos”, a decisão foi para jogar mais gasolina no confronto eleitoral. A estratégia agora se baseia em questionar – deixar as elites desabafarem todo o seu rancor contra “a mulher negra” – e não em tranquilizar os eleitores do centro.

O novo campo que marca é o de todo o rol eleitoral, pois tenta trazer para a luta principalmente os abstencionistas e desmotivados, que já eram 46% nas eleições presidenciais de 2018. Com isso, a disputa não se volta para o campo ideológico centro, representado pelo Partido Liberal e seus potenciais eleitores, que pedem maior contenção política e foram decisivos para a derrota do Petro naquele ano, mas às grandes massas de excluídos que permaneceram fora do sistema político colombiano.

Gaviria já decidiu romper com Petro. A desculpa foi a eleição de Márquez e alguns supostos “insultos” que recebeu dela ao chamá-lo de “neoliberal”. Assim, o centro fica sem candidatos e tem que aproveitar a nova polarização, desencadeada principalmente após a pobre vitória de Sergio Fajardo nas primárias de sua coalizão, nas quais não conseguiu superar os votos da França.

A importância de ser chamado de Gaviria


O apoio da Gaviria a Duque em 2018 foi decisivo. Agora, ele anuncia novamente que não vai negociar com o Pacto Histórico e deixa na memória aquele segundo turno. Mas, além disso, Gaviria está em condições de recordar esse episódio porque nas eleições legislativas de há poucos dias o seu partido produziu uma boa votação, apesar de se temer um desastre.

No entanto, o apoio de Gaviria não é o único que Petro pode obter dentro do liberalismo, onde poderia recompor suas alianças, principalmente com os representantes e senadores do liberalismo, a quem tem muito a oferecer se pensarmos em uma hipotética vitória. Mas Gaviria é o chefe do liberalismo e sua posição pesará, especialmente se ele abrir fogo contra Petro.

A Petro fica sem aliança? As declarações de seu companheiro de chapa abrem uma brecha semanas antes das eleições presidenciais na Colômbia
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Não devemos esquecer que a origem da guerra na Colômbia remonta ao assassinato do líder liberal Jorge Eliécer Gaitán em 1948. Hoje o Partido Liberal pode significar a máquina que impossibilita a vitória do Petro, como em 2018, mas eleitores liberais, e seus descendentes, poderiam fazer a diferença se reinterpretassem o liberalismo a partir das posições interpelativas de suas origens.

‘Fico’ luta em outra arena
Federico ‘Fico’ Gutiérrez, por outro lado, deu um passo em outra direção diferente da polarização de Petro e da interpelação de classes e “minorias” que se consegue com Márquez.

É diferente porque insiste na contradição entre esquerda e direita e com a nomeação de Rodrigo Lara (filho) avança na tomada do centro político, que fica sem candidatos com opções reais. Lara vem de setores moderados e é vítima de tráfico de drogas em um caso muito divulgado, como o assassinato de seu pai, um ministro da Justiça que confrontou o Cartel de Medellín e Pablo Escobar.

Assim, ‘Fico’, ex-prefeito de Medellín que vem da direita e foi apoiado pelo ex-presidente Álvaro Uribe, alcança uma fórmula onde torna sua imagem potável, que, sendo sustentada pelo ‘uribismo’, está automaticamente ligada ao paramilitarismo e tráfico de drogas, os dois crimes que com múltiplos escândalos cercam o surgimento do uribismo.

Petro dobra a aposta

A estratégia de Petro com Márquez dobra as apostas porque agora ele tentará vencer todas as potências colombianas. É uma luta diametral entre as cadeias de equivalência do status quo e não apenas contra o ‘uribismo’, que não é mais o significante unificador. O centro político tem mais chances de ser conquistado pela direita enquanto o Petro tenta ganhar terreno nos bolsos dos excluídos que não aparecem para votar.

Dada a candidatura presidencial e a liderança de um “ex-guerrilheiro” de esquerda, era lógico, por racionalidade política, que seu companheiro de chapa fosse um mediador mais ligado às instituições.

A candidatura da França é uma homenagem à Colômbia que se mobilizou nas ruas contra o governo de Iván Duque. O que não sabemos é se essa Colômbia tem capacidade de se mobilizar eleitoralmente para enfrentar um bloco de poder que é reforçado pela inventividade de um terrível inimigo para o país (Petro e seu “socialismo”) e que se desdobra por meio de um movimento tão popular e de confronto como ‘uribismo’.

Márquez é a configuração política de outra imagem da Colômbia, o que ainda não sabemos é se ele contribuirá para o entusiasmo das “minorias” para se tornar uma confortável maioria eleitoral. Isso será conhecido em 29 de maio.

Após a eleição de Márquez, a juventude popular, as mulheres, as comunidades indígenas e afro-colombianas têm a resposta nas mãos. Se não se mobilizarem para votar massivamente, podem permitir que se repita o cenário de 2018 em que com quase metade do eleitorado se abstendo (46%) o atual presidente, Iván Duque, obteve 10.398.689 votos, enquanto Petro ficou com 8.040.449.

No entanto, a Colômbia mudou muito. O país vive há pelo menos dois anos um conflito social que não foi visto durante os longos anos de guerra ideológica entre as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) e o governo colombiano.

A saída das FARC do jogo deixou o uribismo sem adversários visíveis e isso o levou a perder significado e eficiência política. O habitual conflito rural do confronto guerrilheiro deu lugar ao conflito social eminentemente urbano.

Os protestos contra Duque passaram por todas as camadas e mostraram um profundo mal-estar que se confirmou nas urnas e nas urnas, mas ainda não com força suficiente para derrotar os grandes poderes de fato, legais e extralegais na Colômbia.

Márquez é a configuração política de outra imagem da Colômbia, o que ainda não sabemos é se ele contribuirá para o entusiasmo das “minorias” para se tornar uma confortável maioria eleitoral. Isso será conhecido em 29 de maio.

Ociel Alí López é sociólogo, analista político e professor da Universidade Central da Venezuela. Foi vencedor do Prêmio Municipal de Literatura 2015 com seu livro Dá-lhe mais gasolina e e o prêmio Clacso/Asdi para jovens pesquisadores em 2004. Colaborador em diversos meios de comunicação na Europa, Estados Unidos e América Latina.

*Ociel Alí López é sociólogo, analista político e professor da Universidade Central da Venezuela. Foi vencedor do Prêmio Municipal de Literatura 2015 com seu livro Give More Gasoline e do prêmio Clacso/Asdi para jovens pesquisadores em 2004. Colaborador em diversos meios de comunicação na Europa, Estados Unidos e América Latina.

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