Desde o início das articulações golpistas, já no início da operação Lava Jato, ficou evidente que a principal motivação econômica do conluio foram as imensas jazidas do pré-sal, anunciadas pela direção da Petrobrás em 2006. Sacramentado o golpe, com o impeachment de Dilma Roussef, uma das primeiras ações dos golpistas foi impedir a destinação para Educação e Saúde da chamada renda petroleira, conforme objetivava a Lei de Partilha. Mal assumiu, Michel Temer, tratou de aprovar a política de Preço de Paridade de Importação (PPI), que há cinco anos aumenta o preço dos derivados do petróleo muito acima da inflação, em qualquer comparação que se faça.
A Subseção do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Sócio Econômicos (DIEESE) na FUP (Federação Única dos Petroleiros), realizou um levantamento da evolução dos preços dos derivados do petróleo, desde a implantação do PPI, com base nas informações oficiais da Petrobrás (refinarias) e da Agência Nacional de Petróleo, Biocombustíveis e Gás Natural (postos). Em cinco anos, entre outubro de 2016 a outubro de 2021, as altas nas refinarias, chegaram a 107,7% para a gasolina; de 92,1%, para o diesel; e de 287,9% para o gás de cozinha. Neste mesmo período, o índice geral de inflação foi de 25,4% (IPCA/IBGE). Nos locais de revenda os preços são também exorbitantes, ainda que em patamares mais baixos. Na gasolina, a alta acumulada em cinco anos é de 74,1%; no diesel, de 68,2%; e no gás de cozinha, de 84,2%.
Segundo o citado estudo em outubro de 2016 o botijão de 13kg de gás de cozinha custava, em média, R$ 69,21 no Brasil. O litro da gasolina custava R$ 4,58 e o do diesel, a R$ 3,76. Na semana passada, a média de revenda do botijão estava em R$ 101,96 (47% de aumento em cinco anos), o litro da gasolina alcançou R$ 6,36 (aumento de 39%) e o do diesel R$ 4,98 (alta de 32%). Para uma inflação geral de 25,4%, segundo o IPCA, como observado.
Ou seja, apesar do Brasil ser uma potência na produção de petróleo, o preço interno dos combustíveis está atrelado à variação internacional do óleo e na variação do dólar. Com essa política de correção de preços dos derivados do petróleo, é como se o Brasil não produzisse petróleo, e tivesse que importar 100% dos derivados que consome. Mesmo sendo autossuficiente na produção e utilizando majoritariamente petróleo nacional nas refinarias1.
Ao mesmo tempo em que se constata que a população brasileira não ganha nada sendo o país uma potência petrolífera, se sabe que a produtividade do trabalhador no setor é muito elevada. A Pesquisa Industrial Anual (PIA) – 2019, do IBGE, atesta que o setor de petróleo brasileiro é responsável pela maior produtividade de toda a indústria. Em 2019, cada petroleiro adicionou, em média, R$ 8,58 milhões, 4.561% a mais do que a média da indústria em geral, e 4.945% a mais do que a média da indústria de transformação. Este é o setor, disparado, que apresenta a maior produtividade da indústria e de toda a economia. O petroleiro que trabalha na produção de derivados de petróleo e biocombustível, por sua vez, adicionou em novo valor o montante de R$ 952 mil em 2019, 417% a mais do que a média da indústria em geral, e 460% a mais do que a indústria de transformação.
É esse setor, com uma produtividade desta magnitude que, em 30 anos, “não valerá mais nada”, segundo o ministro da economia. O setor de petróleo no Brasil ilustra com riqueza o que é ser um trabalhador de um país atrasado e dominado pelo imperialismo. O país dispõe de uma das maiores reservas de petróleo no mundo, e é um grande produtor de petróleo, com produtividade no setor, na magnitude descrita acima. Ao mesmo tempo a direção entreguista da Petrobrás está vendendo as refinarias, para tornar o país apenas um exportador de óleo cru e depender cada vez mais de importações de derivados de petróleo, principalmente dos EUA. No outro lado, quantidades crescentes da população passam fome de forma crônica. Quando a cotação do barril de petróleo aumenta internacionalmente, quem lucra não é povo pobre e negro brasileiro, e sim os investidores almofadinhas da Bovespa e da Bolsa de Nova York.
Claro, o capital financeiro internacional e os especuladores têm seus sócios menores no pais: o atual presidente da Petrobrás, General de Exército Luna e Silva, recebe mensalmente R$ 260.400,00, mais todas as mordomias decorrentes do cargo. Desde 2016, consequência de uma modificação estatutária, são estratosféricos os salários da direção e do corpo gerencial da companhia. Salários dessa magnitude devem “contribuir” para os dirigentes da empresa aceitarem a distribuição de R$ 31,6 bilhões de dividendos aos acionistas (os capitais estrangeiros detêm a maioria relativa 42,79% do conjunto das ações, enquanto o governo brasileiro possui 36,75%), assim como ativos que rendem lucros líquidos enormes.
O sonho dos golpistas de 2016, de todos os matizes, é privatizar a Petrobrás. Se eles conseguirem não será apenas o maior roubo da história do país, mas um acontecimento de grande simbolismo político, já que a luta por uma empresa pública de petróleo, foi a grande luta nacional do povo brasileiro. Claro, em boa parte, a Petrobrás já foi privatizada no governo de Fernando Henrique Cardoso. A União detém 50,50% das ações ordinárias, o que garante o controle formal da empresa, porém detém apenas 34,70% das ações preferenciais, que têm a preferência na distribuição dos dividendos.
Cabe saber que governo, em sã consciência, ou que não fosse resultado de um processo golpista, entregaria a preço de banana, um patrimônio que gerou R$ 74 bilhões de lucro líquido apenas nos 2º e 3º trimestres de 2021 e que neste ano fará a maior distribuição de dividendos para os seus acionistas na história da empresa. Há poucos dias o “arguto” Paulo Guedes falou que o Brasil teria que vender rapidamente a Petrobrás, porque daqui a 30 anos ela não valerá mais nada. Ele deveria alertar do problema os “desinformados e ingênuos” imperialistas (tendo à cabeça os EUA) que deram um golpe arriscadíssimo, e de graves consequências no Brasil, com o objetivo econômico principal de roubar o petróleo.
1 O fato do país ser autossuficiente não significa necessariamente que não tenha que haver importações. Em algumas situações, é necessário importar algum tipo de petróleo específico, dependendo do tipo de derivado que se queira produzir e de outros aspectos, como o método de refino adotado.
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José Álvaro Cardoso é economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa Catarina.
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