A estratégia de “aproveitar a pandemia para passar a boiada” em termos de desmonte do Estado está sendo adotada pelo governo de Jair Bolsonaro também para iniciar a privatização do SUS justamente quando deveria ser fortalecido. Desde o último dia 30, está em consulta pública a Política Nacional de Saúde Suplementar para o enfrentamento da pandemia da covid-19. Com o argumento de integrar ao SUS as ações da saúde privada o Ministério da Saúde pretende alavancar o mercado de planos e seguros de saúde. Há tempos o setor reivindica ações governamentais para ampliar o seu mercado.
De acordo com Ligia Bahia e Mário Scheffer, especialistas no tema, a proposta é mais uma tentativa de mudar as regras do jogo, reduzindo direitos assegurados e impondo prejuízos adicionais ao SUS e também à fatia da população cliente desses planos particulares.
SUS a serviço da rede privada
“A proposta vislumbra uma integração reversa, na qual o SUS entra como coadjuvante e as operadoras se apresentam como as protagonistas do sistema de saúde”. É o que destacam os especialistas em nota técnica (link abaixo) divulgada nesta quarta-feira (5) pelo Grupo de Estudos sobre Planos de Saúde da Faculdade de Medicina da USP e pelo Grupo de Pesquisa e Documentação sobre Empresariamento na Saúde, do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
“Os planos de saúde comercializam o atendimento sintomático e curativo a demandas espontâneas, cujos procedimentos serão ou não autorizados em estabelecimentos de saúde. A estrutura assistencial dos planos privados não inclui medidas que previnam exposição a riscos. As redes prestadoras de serviços têm qualidade distintas, de acordo com os tipos e preços de planos. Esse modus operandi leva a desfechos ineficazes, como descontinuidade de tratamentos, indefinição de responsabilidades e conflitos entre operadoras, profissionais de saúde e pacientes”, diz trecho da nota.
Além disso, segundo os autores, as empresas de planos privados fizeram “um papelão” durante a pandemia. Recusaram-se a participar dos esforços para a unificação de leitos de UTI, mantiveram reajustes abusivos das mensalidades e negaram a cobertura de testes de Covid-19.
Por essas e outras razões, os especialistas recomendam que a proposta seja sustada.