Poder Judiciário, apesar da seletividade no direito penal, impõe condenações ao governo Bolsonaro. Por Roberto Liebgott.

Foto: Antonio Cruz/Agencia Brasil.

Por Roberto Antônio Liebgott, para Desacato. info.

Apesar das últimas decisões judiciais que promoveram a absolvição de figuras políticas acusadas de corrupção, como o ex-presidente Michel Temer e o senador José Serra, o Poder Judiciário vem tomando decisões que condenam ações e omissões do governo Bolsonaro. São correções de rumo ou de proteção a comunidades severamente atacadas nessa época de pandemia. Trata-se de um momento de contextos político, jurídico, econômico e sanitário desesperadores para os segmentos populares que lutam por democracia, igualdade e respeito.

E com a complacência do governo federal, assistimos às violências sistemáticas contra a vida, ao racismo institucional, a agressões devastadoras contra direitos sociais, ambientais, territoriais e étnicos.

Não há precedentes, em nossa história, de um conjunto de violações tão densamente articulado contra os direitos fundamentais das pessoas como neste período. De forma explícita e corriqueira, se atacam os pobres – em geral jovens negros – nas periferias, os indígenas e quilombolas dentro de seus territórios. Sobre esses recai também a seletividade da Justiça, através de denúncias, encarceramentos e condenações daqueles que são os mais vulneráveis e desprotegidos pelo Estado. Enquanto é complacente com pessoas das elites dominantes, o Poder Judiciário é severo com os menos favorecidos da sociedade, para quem se adota, como regra jurídica, o punitivismo.

Diante desse quadro desolador, recebemos com certo alívio a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de impor restrições às operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro. Os ministros limitaram o uso de helicópteros, determinaram a preservação de vestígios de crimes e proibiram o uso de escolas e unidades de saúde como bases operacionais das polícias militar e civil. Trata-se de condenação não apenas da política de segurança do Rio de Janeiro, mas também da postura beligerante do governo Bolsonaro em defesa da violência policial e do uso abusivo das armas.

No que se refere aos direitos das comunidades que vivem no campo, especialmente à saúde, o STF condenou o governo Bolsonaro a tomar medidas mínimas de proteção a indígenas e quilombolas. Partiu também do STF outra condenação ao governo Bolsonaro, os ministros caracterizaram como desvio de finalidade o uso do aparato estatal para monitoramento de segmentos contrários ao fascismo de Estado. De forma quase unânime, os ministros determinaram que o Ministério da Justiça suspenda qualquer ato voltado a produzir levantamentos ou dossiês para coleta de informações de pessoas identificadas como participantes do movimento antifascista.

Nesse contexto, precisamos entender algumas decisões judicias como condenações ao governo Bolsonaro: são, afinal, decisões que condenam o totalitarismo; as violências contra os povos originários e comunidades tradicionais; as omissões na execução de adequadas políticas públicas; e os ataques à liberdade de expressão e de opinião.

Diante de tudo isso, há necessidade de seguir em luta, sempre com esperança. Acreditar na vida, na resistência e na força dos pobres que clamam, às vezes até no silêncio, por justiça e liberdade. Esse clamor deve fustigar nossa indignação quando tudo aponta para a cruz e a morte.

Seguiremos, apesar das elites nefastas, de juízes seletivos e de governos e políticos corruptos. Eles passarão e haverá ainda a ascensão transformadora dos pobres, dos povos indígenas, quilombolas e de todos os discriminados e agredidos neste país.

Porto Alegre, RS, 28 de agosto de 2020.

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Roberto Antônio Liebgott é Missionário do Conselho Indigenista Missionário/CIMI. Formado em Filosofia e Direito.

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