No Brasil, o rentismo e o ódio se aliam pela governabilidade. Por Roberto Liebgott.

Foto: Reprodução.

Por Roberto Antônio Liebgott, para Desacato. info.

Enquanto os partidos mais à esquerda ou que possuem vínculos populares se preocupam apenas com as eleições municipais, o governo federal e seus aliados do sistema financeiro, das oligarquias das comunicações, do agronegócio, dos grandes laboratórios farmacêuticos, das empresas do hidronegócio e da mineração aprofundam ainda mais os caminhos das desigualdades, acentuando a exploração de trabalhadores e aposentados, agravando a devastação da natureza e planejando o aumento dos juros e da dívida pública. Se por um lado buscam-se as migalhas de poder, através das prefeituras municipais, por outro projeta-se o país do rentismo para os próximos dez anos.

Bolsonaro, com seus discursos extremados, aos poucos vai sendo silenciado pela máquina que move o sistema econômico. Atualmente, os microfones não estão mais abertos para as falas racistas, homofóbicas e de ódio contra as minorias. Nas últimas semanas as frases de efeito – embora o personagem seja ridículo – focam-se na defesa da economia liberal, da proteção ao meio ambiente – apesar dos recordes de incêndios e desmatamentos – e das reformas tributária e administrativa, assim como no desejo de crescimento da economia, mesmo em contexto da pandemia da covid-19.

Bolsonaro, se todos notaram, já passou inclusive a usar máscara de proteção e seu general Ministro da Saúde defendeu o isolamento social depois da morte de mais de 104 mil pessoas vitimadas pelo vírus. Os ataques à grande mídia, ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal (STF) perderam força e agora se busca, no âmbito destes poderes ou instituições, propor o apaziguamento e a relativização de toda violência que Bolsonaro promoveu ao longo de pouco mais de um ano e meio de governo.

Agora, Bolsonaro aparece na Globo para dizer que defende o meio ambiente, que combate a pandemia e que é preciso conter os gastos públicos. Mas, antes disso, Paulo Guedes usou as televisões e jornais para fazer um discurso encomendado pelo mercado sobre a ameaça de um possível esvaziamento do Ministério da Economia. O ministro também afirmou haver risco de impeachment se Bolsonaro não cumprisse as determinações da Emenda Constitucional de número 95/2016, a qual estabelece o congelamento dos gastos públicos em saúde, educação e outras políticas socias.

Depois das ameaças, os chefes dos poderes Legislativo e Executivo discursaram juntos – Presidente da República, da Câmara dos Deputados e do Senado – para dizer que o Brasil vai cumprir com a agenda econômica, vai privatizar as estatais e esvaziar “a máquina pública com a reforma administrativa”. Ou seja, mudou-se o discurso para indicar ao mercado especulativo que o Brasil ainda é lugar de lucratividades.

Ao que parece, o acordo entre as elites dominantes foi selado e o discurso de ódio vai sendo alterado para agradar aos investidores. Mas há gargalos insuperáveis: o primeiro é que o Brasil é governado por uma família  corrompida  até suas entranhas, pois se vinculou aos milicianos para alçar ao poder e deles não consegue se afastar; o segundo são  as personalidades doentias e fascistas do mandatário do país e de seus filhos; terceiro, há  falta de compreensão entre o que é público e privado, uma vez que o clã Bolsonaro transformou o Palácio do Planalto num puxadinho para planejar as ações de interesse de milicianos, latifundiários, grileiros de terras, garimpeiros, madeireiros criminosos e empresários da fé.

Bolsonaro agora tenta, por imposição externa, administrar dois governos, o da economia e todos os seus enlaces e o dos amigos e familiares. Os dois são antagônicos e, talvez para tentar frear o segundo, os grandes veículos de comunicação não deixam de transmitir notícias sobre as rachadinhas que comprometem o pai presidente, os filhos vereador, deputado e senador, os amigos, os assessores, a esposa e as ex-esposas.

Até quando o governo Bolsonaro vai vigorar não se sabe, porque há na sociedade – além dos milicos que defendem o governo porque usufruem do poder e dos agentes de crimes – uma significativa parcela da população que se identifica com as pautas do governo e com os discursos de ódio contra indígenas, quilombolas, mulheres, sem-terra e sem teto.

O ódio, a mentira e a governabilidade pelo rentismo parecem comungar dos mesmos interesses neste momento da história. Haverá rupturas, mas as previsões não são boas para aqueles que aguardam por um “estado de bem-estar social” para todos. Os sinais indicam a perpetuação da violência e da morte prematura como condição de existência do governo Bolsonaro, que vem optando, desde antes das eleições, pela mentira, pelo ódio, pela discriminação e pela destruição.

Só há um caminho a seguir: é o da rebeldia social, política e econômica. Fazer a oposição que as oposições não fazem e lutar contra a destruição do país, para depois reconstruir os caminhos do Bem Viver. Esperar por um “salvador da pátria” não mudará as histórias de opressão, desigualdades, destruição e discriminação. Apenas legitimará o totalitarismo.

Porto Alegre, RS, 15 de agosto de 2020.

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Roberto Antônio Liebgott é Missionário do Conselho Indigenista Missionário/CIMI. Formado em Filosofia e Direito.

 

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