Por Henrique Rodrigues, Revista Fórum.
Em meio à divulgação dos gastos do cartão corporativo da Presidência da República durante o mandato de Jair Bolsonaro (PL), a reportagem da Fórum teve acesso ao banco de dados com os pagamentos realizados com esse dispositivo e encontrou uma despesa totalmente fora do que se pode considerar razoável no trato com o dinheiro público.
Em 5 de novembro de 2020 o ex-presidente foi ao município de Piranhas, no sertão de Alagoas, para inaugurar o Sistema de Abastecimento de Água (SAA) da localidade, um mecanismo hídrico construído para levar água a 10 mil habitantes do distrito rural de Piau, que faz parte do projeto Canal do Sertão, iniciado em 1992 e que durante o governo de Dilma Rousseff (PT) foi colocado no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). A visita ficou célebre pelos elogios que o então presidente fez ao ex-mandatário Fernando Collor de Mello, a quem chamou de “o homem que luta pelo interesse do Brasil”. Collor foi removido da Presidência da República em 1992, por conta de um impeachment (ele renunciou antes da votação ser concluída), acusado de corrupção.
A passagem de Bolsonaro pela cidade do sertão alagoano banhada pelo Rio São Francisco durou só algumas horas e inclusive sua presença em Piranhas atrasou duas horas por conta do mau tempo, uma vez que o avião presidencial pousaria em Paulo Afonso (BA), município vizinho, e precisou tocar o solo apenas em Aracajú (SE). Obviamente, seu staff de segurança, cerimonial e assessoria técnica precisavam estar a postos na cidade antes mesmo de sua chegada, mas o gasto total desse pessoal com hospedagem e alimentação custou, para um evento de pouquíssimas horas, a bagatela de R$ 76.455. O SAA de Piranhas custou R$ 12 milhões, repassados pela FUNASA (Fundação Nacional de Saúde). Ou seja, a passagem de Bolsonaro por lá para inaugurar a obra, apenas em hospedagem e alimentação de seus servidores, equivaleu a mais de 0,6% da verba empregada na melhoria.
Os dados obtidos pela Fórum não mostram qualquer fato ou ato ilegal por parte das empresas que aparecem nas notas, já que até então elas surgem apenas como prestadoras de serviço. O que chama a atenção é o uso descabido e sem qualquer zelo com o dinheiro público por parte dos agentes governamentais.
O Xingó Parque Hotel e Resort, que fica em outra cidade da tríplice divisa AL,SE e BA, precisamente em Canindé do São Francisco (SE), foi um dos que receberam os servidores ligados a Jair Bolsonaro, e o pagamento efetuado lá, datado de 4 de novembro, foi de R$ 31.224. Uma diária nesse estabelecimento, nesta quarta (25), sai por R$ 444. Já o Dunen Hotel, em Piranhas (AL) mesmo, também prestou o mesmo serviço para o séquito palaciano de Bolsonaro, ao preço de R$ 19.829, efetivados por meio de quatro pagamentos realizados com o cartão corporativo nos dias 2 e 4 do mesmo mês. Ficar no Dunen, atualmente, sai por R$ 252 a diária.
Quem também recebeu o grupo a serviço do ex-presidente de extrema direita foi o San Marino Hotel, de Paulo Afonso (BA), através de dois pagamentos efetuados no dia 5 de novembro, o mesmo da visita de Bolsonaro, no valor total de R$ 15.787. O preço da diária atual no San Marino Hotel é de R$ 240. Por fim, entre as empresas de hospedagem, o Ilha Bela Hotel, que fica também na cidade baiana, prestou um serviço de R$ 2.640 e recebeu o pagamento no cartão corporativo no próprio dia 5. Dormir lá por uma noite custa R$ 115 em valores atuais.