Por Claudia Weinman, para Desacato. info.
Terça-feira, dia 17, fui ao mercado. As pessoas abraçavam-se pelos corredores. Entre as prateleiras, ouvia conversas seguidas de risos. Mercado cheio: de produtos e pessoas. Até papel higiênico tinha à vontade. Os trabalhadores brincavam entre si: “Aqui o corona não chega, pessoal é bravo”. Nenhum cuidado. Tudo aparentemente normal. A patroa pedindo a lista de produtos à moça da padaria. “Precisa encomendar isso e aquilo”, dizia ela.
Até pensei em ficar tranquila. Mas daí veio o dia 18 e percebi que o 17 era só uma grande farsa. Da criança que no ônibus olhou e disse: “Mãe, tem um coronavírus no seu rosto”, até as notícias sobre o mundo. No dia 19 senti dor. A polícia estava fazendo toque de recolher desde cedo da manhã. A cidade foi ficando deserta. Farmácias, mercados, postos de combustível, hospitais obviamente, ainda em funcionamento. A campanha do #FicaemCasa ganhando dimensão. Meu irmão bateu à porta e o primeiro sinal de tristeza me tomou. Evitamos o abraço. Então senti realmente que as coisas não estavam bem.
O Governador de Santa Catarina Carlos Moisés que até então segurou a decisão de cancelamento das aulas, enfim cedeu. No Brasil todo, as Universidades estavam informando sobre a paralisação dos trabalhos e ele insistia em manter os/as educadores/as e demais trabalhadores/as nas escolas. Com o decreto, o prefeito do município onde moro, emperrou em ficar na queda de braço. Suspendeu por 15 dias as aulas e mandou que retornassem na semana próxima e aí é que o capital mostra sua face.
No bairro onde minha mãe mora, no trevo de acesso à cidade, as mães pedem ajuda para vizinhos ficarem com seus bebês. Os frigoríficos seguem com os trabalhos. Nas favelas continua sendo difícil se proteger, os indígenas que ainda estão pela cidade vivem desabrigados. O prefeito grava um vídeo de alerta, finalmente, mas do meio de sua casa pomposa. Como se todos e todas tivessem a mesma condição. A dicotomia está posta. Não há igualdade na condição da fala. O trabalhador terceirizado se não trabalha não recebe, também não come e não vive.
Ontem, na farmácia, as trabalhadoras estavam nervosas. Surgiu a conversa de que o medicamento Tylenol 750mg Analgésico e Anti-térmico para dor e febre curava o coronavírus. As pessoas acreditaram e acabaram com o estoque, nem mesmo a orientação das profissionais deu conta. Logo, a doença da Fake News matará também.
Hoje, dia 20, mais de 150 mil beneficiários do Bolsa Família estão desamparados, o governo noticiou que aumentaria os benefícios mas como tudo é uma farsa, eles tiraram os recursos, ocasionando mais empobrecimento em um momento duro para a estrutura social e econômica do país. O governo é um golpe, a única coisa verdadeira são as perdas trabalhistas, o caos, a PEC da morte, o congelamento por 20 anos dos investimentos na saúde. O presidente não sabe usar uma máscara de proteção, ele, e todo capital internacional são a doença do século.
Se você pode ficar em casa, fique e ajude a denunciar. Para além da morte, temos que temer viver assistindo a morte sistemática, silenciada pela mídia tradicional.
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Claudia Weinman é jornalista, vice-presidenta da Cooperativa Comunicacional Sul. Militante do coletivo da Pastoral da Juventude do Meio Popular (PJMP) e Pastoral da Juventude Rural (PJR).
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