O chanceler uruguaio, Rodolfo Nin Novoa, disse que o ministro das Relações Exteriores brasileiro, José Serra, tentou “comprar o voto do Uruguai” ao pedir que não transferisse a presidência pró-tempore do Mercosul à Venezuela.
“Não gostamos muito de que Serra tenha vindo visitar o Uruguai para nos dizer — ele fez disso algo público, por isso digo — que vinha com a pretensão de que se suspendesse a transferência [da Presidência do Mercosul] e que, além disso, se nós a suspendêssemos, nos levaria em negociações com outros países, tentando comprar o voto do Uruguai”, disse Novoa durante a Comissão de Assuntos Internacionais de Deputados na última quarta-feira (10/08), cuja declaração transcrita foi publicada pelo jornal local El País, que teve acesso ao documento.
Na visita ao país vizinho no início de julho, Serra esteve acompanhado do ex-presidente brasileiro Fernando Henrique Cardoso para uma reunião com o presidente uruguaio Tabaré Vázquez. Em entrevista coletiva de imprensa, Serra afirmou que o Brasil faria uma “grande ofensiva” comercial na África e no Irã e queria que apenas o Uruguai, entre todos os outros países do Mercosul, participasse como “sócio”. Para tanto, o Uruguai deveria suspender a transferência da Presidência rotativa do bloco, o que a nação cisplatina não fez.
“O presidente o respondeu de maneira clara e contundente: o Uruguai cumprirá com a normativa [do bloco] e vai convocar a mudança da Presidência”, informou Novoa, dizendo que a atitude de Serra “incomodou muito” o presidente Vázquez.
“O Uruguai não iria permanecer na presidência de jeito nenhum; atendendo a norma, em seis meses, deixaríamos o cargo”, afirmou.
O ministro ainda disse que Montevidéu entende que a “Venezuela é o legítimo ocupante da presidência pró-tempore, portanto, quando convocar uma reunião o governo uruguaio irá. Se os outros não forem, a responsabilidade será deles”.
Para ele, Brasil, Paraguai e Argentina — que não reconheceram a Venezuela à frente do bloco — querem “fazer bullying” contra o país. “Eu digo com todas as letras. Eles pulam o jurídico, que contém o corpo normativo [do Mercosul], e, alegando razões que não estão aqui, querem eludir, erodir, fazer bullying contra Presidência da Venezuela. Esta é a pura verdade”, afirmou.
No entanto, o ministro uruguaio ponderou que o impasse pelo cargo do Mercosul “não poderá se repetir em dezembro, quando a Venezuela tenha que passa-lo à Argentina”.
Impasse na Presidência rotativa
Quando Montevidéu anunciou o fim de sua liderança à frente do bloco sul-americano, em 29 de julho, a Venezuela automaticamente assumiu a Presidência, apenas informando as chancelarias dos outros membros e realizando sua cerimônia de posse no dia 5 de agosto.
A atitude incomodou Brasil, Paraguai e Argentina, que não viam o processo como algo automático e alegaram que a nação passa por problemas econômicos e políticos, não cumprindo com os requisitos para liderar.
Em consequência, os três países rejeitaram a Presidência venezuelana e sugeriram um governo coletivo comandado por um conselho de embaixadores. Além disso, o Paraguai pediu uma “revisão jurídica” do protocolo de adesão de Caracas, após afirmar que houve “descumprimento das obrigações contidas nos referidos instrumentos”.
Em resposta, o Uruguai, que defende o direito de a Venezuela assumir, afirmou que “não está prevista em nenhum lugar uma Presidência coletiva”, apesar de reconhecer que o país não cumpriu “compromissos” do Protocolo de Adesão do Mercosul.
A acusação, contudo, foi rechaçada por Caracas, que classificou o pedido paraguaio como uma “manobra falsária e antijurídica” por parte da nação, aliada ao Brasil e a Argentina.
A Venezuela “não só incorporou grande parte do compêndio normativo do Mercosul” como “igualou, e na maioria dos casos superou, os Estados Partes, que, estando desde o início da fundação do Mercosul, não internalizaram todo seu acervo normativo”, disse a chancelaria venezuelana por meio de comunicado divulgado na segunda-feira (15/08).
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Fonte: Opera Mundi.