UFSC propõe gestão compartilhada do Parque do Manguezal do Itacorubi

Por Camila Rodrigues da Silva, para Desacato.info.

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A falta de articulação entre esferas federal, estadual e municipal deixou o Parque Municipal do Manguezal do Itacorubi, uma Área de Preservação Permanente (APP), sem administração. O terreno é de propriedade da União e foi cedido à UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) em 1969. Sem nunca ter construído na área, a universidade fez um acordo com a prefeitura que, em 2002, criou por Decreto, um Parque Municipal. A Floram (Fundação Municipal do Meio Ambiente de Florianópolis) diz que o plano de execução do Parque não atendia aos requerimentos do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). Resultado: hoje, ninguém administra esse espaço.

Nesse contexto, a assessoria socioambiental da UFSC convidou órgãos públicos e entidades para discutirem, nesta sexta-feira (25/10), a gestão do Parque. A proposta é que seja feita uma gestão compartilhada entre os vários atores responsáveis pelo local. “Individualmente, nenhuma das entidades têm profissionais, estrutura nem aporte financeiro para gerir essa área”, ponderou a assessora socioambiental da UFSC, Ariane Laurenti, que coordenou a reunião.

A discussão aconteceu na Sala dos Conselhos da reitoria da universidade e estavam presentes representantes da UFSC, da Floram, do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), do IPUF (Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis), da SPU (Superintendência do Patrimônio da União) e do Movimento Ponta do Coral 100% Pública. O representante do IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), uma das entidades convidadas, justificou sua ausência. Também estavam presentes professores do curso de Arquitetura da UFSC, dentre eles o vereador Lino Peres. Vários participantes reclamaram da ausência de representantes dos pescadores que habitam aquela região.

Histórico

Conforme a apresentação de Laurenti, o problema de gestão se explica historicamente. O terreno é de propriedade da União e, em 1969, o Decreto Federal n.º 64340 cedeu o terreno à Universidade Federal de Santa Catarina para “abrigar os Centros de Ensino e Pesquisa e outros órgãos previstos, em decorrência dos novos conceitos da Reforma Universitária”.  A universidade, entretanto, nunca construiu sobre o mangue.

Em 1982 e 1995, foram feitas algumas mudanças na demarcação do terreno.  Em 1999, a SPU reverteu 41.922,68 m² da área cedida à UFSC para a Prefeitura Municipal de Florianópolis implantar o elevado Wilson Kleinubing (o elevado do CIC). Dessa forma, a área que estava sob jurisdição da UFSC passou a ser de 2.031.718,32. No mesmo ano, a UFSC e prefeitura firmaram um Termo de Cooperação para a implantação do Parque do Manguezal do Itacorubi, que não define claramente quais as obrigações de cada entidade sobre a área.

Em 2002, após três anos, a prefeitura cria o Parque do Manguezal do Itacorubi por meio de um decreto (Nº 1529/2002) que faz duas especificações: 1) no Art.2 diz que toda a área do Parque é de preservação permanente (APP) e, como tal, nada pode ser construído, ressalvados os usos públicos necessários, e no Art.3 diz que “compete à Fundação Municipal do Meio Ambiente – FLORAM, na forma da legislação em vigor, especialmente o disposto no Art. 4º da Lei nº 4645/95, a guarda, a proteção, a fiscalização e o manejo da Unidade de Conservação ora instituída”.

O biólogo da Floram, Danilo da Silva Funke, explicou que o plano de execução do Parque do Manguezal do Itacorubi não atendia aos requerimentos do SNUC e sugeriu a criação de um termo aditivo que estabeleça compromissos, metas e responsabilidades de cada uma das partes envolvidas. “Sem um termo aditivo, a Floram não tem como se responsabilizar por esse parque”, concluiu.

Sílvio de Souza Júnior, oceanógrafo do ICMBio e chefe da Estação Ecológica de Carijós (ESEC), defende que a área deveria ser cedida à prefeitura, e a atuação da UFSC se daria por meio de Termos de Cooperação Técnica.

A coordenadora de destinação do patrimônio (SPU), Tereza Cristina Alves, questionou a Ariane se a UFSC tinha interesse em manter a cessão de uso do terreno. A assessora socioambiental disse que provavelmente sim, mas que essa questão seria discutida internamente.

Os limites do Parque e o Plano Diretor “Impositivo”

Vários órgãos levantaram o problema da delimitação da área e dos limites do Parque Municipal. “Falta estudo aprimorado, georreferenciado, para mensurar qual a dimensão exata do mangue atualmente”, comentou Ariane. Também foi tangenciada a questão do Plano Diretor, que foi encaminhado para votação à Câmara de Vereadores na sexta-feira passada (18), sem a devida participação popular, exigida sob a forma de lei no Estatuto da Cidade.

Loureci Ribeiro, arquiteto do Movimento Ponta do Coral 100% Pública (que chamou o atual Plano Diretor de “impositivo”), questionou o zoneamento do Parque e seus arredores no Plano Diretor que está em votação na Câmara de Vereadores. Para ele, o parque deveria incluir a Ponta do Coral, a Ponta do Lessa (que hoje é de uso privado) e a Ponta do Goulart.

Em documento chamado “Projeto de Criação do Parque Cultural das 3 Pontas” e em um ofício ao secretário municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, Dalmo Vieira Filho, Ribeiro solicitou o tombamento da Ponta do Coral e da Ponta do Lessa ao Patrimônio Histórico, Cultural, Artístico e Natural de Florianópolis.  “A Ponta do Coral será objeto de tombamento por tratar-se promontório e área de interesse da paisagem natural da orla. A Ponta do Lessa também tratar-se de área de Sambaquis, de Fortificação Militar e de interesse da paisagem natural da orla”.

Ele solicita ainda que a Ponta do Coral, que está zoneada como Área Turística Exclusiva-2 (ATE-2), seja modificada como uma Área Verde de Lazer (AVL); e que as Áreas de Preservação com uso Limitado (APL) e a Área Verde de Lazer (AVL), ambas localizada na Ponta do Lessa, seja zoneada como Área de Preservação Cultural.

Cid Neto, membro do Fórum da Cidade e da Associação de Geógrafos do Brasil (AGB), lembrou ainda que o manguezal abriga indevidamente um cemitério e o hospital SOS Cárdio, nas proximidades do bairro do João Paulo.

A crítica é reforçada por Silvio, do ICMBio.  Ele faz críticas também ao mapeamento das Áreas de Preservação Permanentes (APPs) no atual Plano Diretor. “O problema do manguezal é que ele está fora dos limites do parque. Aliás, as APPs estão muito mal mapeadas no Plano Diretor. Temos que criar um mosaico de Unidades de Conservação da ilha”.

O vereador Lino Peres revelou aos presentes a articulação com a procuradora da República, Analúcia Hartmann, para evitar que o Plano Diretor seja encaminhado como está e permitir emendas. Ele lembra que as emendas precisam de 16 votos na Câmara de Vereadores para serem aprovadas.

Encaminhamentos

Como encaminhamentos, ficou a criação de um espaço para definir os limites de atuação de cada entidade na gestão compartilhada do Parque do Manguezal do Itacorubi e a formalização das sugestões feitas no encontro por cada uma das entidades.

Foram sugeridos pelo menos dois formatos para essa gestão compartilhada: um Conselho Gestor Transitório, feito pelo representante do ICMBio, e um novo Acordo de Cooperação Técnica, feito pela SPU.

Em breve, deverá ser convocada uma nova reunião, provavelmente com mais atores convidados.

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