Por Débora Motta, da Faperj.
O Brasil é um dos países onde mais se consome agrotóxicos no mundo. De acordo com o Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg), as vendas de pesticidas em 2015 totalizaram US$ 9,6 bilhões e, só em 2014, foram comercializadas mais de 914 mil toneladas de agrotóxicos no País. Essas e outras informações, que nem sempre são divulgadas pelas empresas e instituições governamentais de modo facilitado para consulta pública, estão agora reunidas no Portal de Dados Abertos sobre Agrotóxicos, desenvolvido na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), pelo Grupo de Engenharia do Conhecimento (Greco).
O objetivo do portal é divulgar dados de interesse público sobre o setor, fornecidos por diferentes instituições, com a vantagem de reuni-los em um único ambiente virtual, de fácil navegação. “Um dos grandes problemas para os pesquisadores da área e formuladores de políticas públicas é a dificuldade de acesso a dados oficiais sobre o consumo de agrotóxicos no País. Alguns dados não são publicados, ou são, mas em formato PDF, por exemplo, o que dificulta a leitura por computadores e sua divulgação”, justifica uma das coordenadoras do Greco, Maria Luiza Machado, que é professora no Departamento de Ciência da Computação da UFRJ.
“O portal de dados abertos interligados é voltado para quem precisa cruzar informações de diversas fontes. Utilizamos a tecnologia de software livre CKAN, de código aberto, o que evita que o pesquisador tenha que fazer buscas e downloads separados, em diferentes sites na Internet. É para quem busca informação para a ação, para quem quer examinar as consequências do uso de agrotóxicos”, completa.
O projeto, que também incluiu a criação de um Observatório de Atenção Permanente ao Uso de Agrotóxicos, foi contemplado pela FAPERJ, com recursos do edital Apoio a Projetos de Extensão e Pesquisa (ExtPesq). A ideia de desenvolver o portal surgiu a partir do engajamento de um dos pós-graduandos vinculados ao Greco, Alan Tygel, que é orientando de Maria Luiza no doutorado em Engenharia Elétrica do Programa de Pós-graduação em Informática da UFRJ, na Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida.
A campanha visa combater a utilização de agrotóxicos e a ação de suas empresas (produtoras e comercializadoras), explicitando as contradições geradas pelo modelo de produção baseado no agronegócio. “Observei que os participantes da campanha sentiam a necessidade de um espaço virtual para reunir as novas informações geradas por pesquisadores, militantes de movimentos sociais e agricultores, tornando essa informação útil na ação contra o uso de agrotóxicos e em defesa da vida”, explica Tygel.
A iniciativa atende à necessidade de transparência em relação aos dados de interesse público, formalizada pela Lei de Acesso à Informação, cujo decreto ocorreu em 2012. “Pela lei, é obrigação das empresas que vendem agrotóxicos no País informarem seus balanços comerciais às autoridades reguladoras, que são o Ministério da Saúde, através da Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa), e o Ministério do Meio Ambiente, pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama). Elas têm obrigação de divulgar dados, como o quanto venderam e a porcentagem do componente químico ativo em cada produto, para sabermos os níveis de toxicidade permitidos para a saúde humana. Mas apenas o Ibama divulga em seu site esses dados, de forma bem atrasada”, afirma Tygel. “Muitos desses componentes são proibidos em outros países, como o herbicida paraquat, por exemplo, que já foi banido na União Europeia, mas continua sendo utilizado no Brasil”, acrescenta.
Com a contribuição do portal e o avanço da pesquisa sobre agrotóxicos no Brasil, espera-se ter subsídios para responder, com mais precisão, à pergunta: o quanto de agrotóxicos um brasileiro consome, em média, em seu prato de comida? De acordo com Tygel, ainda faltam dados consistentes para desvendar essa questão, mas as expectativas não são animadoras. “Não conseguimos reunir dados atualizados, mas, em 2008, a indústria de agrotóxicos divulgou com muito orgulho que o consumo per capita foi de aproximadamente 5,2 litros de agrotóxicos naquele ano. Então, é muito importante ter essa relação de saber”, destaca.
O grupo de pesquisa pretende encaminhar, ainda esta semana, pedidos de divulgação de dados sobre o uso de agrotóxicos, conforme os critérios da Lei de Acesso à Informação, ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) e à Anvisa.
No Portal de Dados Abertos sobre Agrotóxicos podem ser pesquisados conjuntos de informações nas seguintes categorias: Comercialização (dados sobre a comercialização de agrotóxicos no Brasil); Agroecologia e Produção Orgânica (fontes de informações sobre produção de alimentos livres de agrotóxicos e transgênicos, dentro da agroecologia e da produção orgânica); Bases de Dados (reunindo informações sobre agrotóxicos, tanto no Brasil quanto no exterior); Doenças (relações entre tipos de agrotóxicos / grupos químicos e sintomas e doenças); Conflitos (dados sobre conflitos gerados pelos agrotóxicos, e pelo modelo do agronegócio em geral); Intoxicações (registro de intoxicações por agrotóxicos); Resíduos em Alimentos (dados sobre análises de resíduos em alimentos); Transgênicos (dados sobre transgênicos); Uso do Solo (dados sobre uso do solo no Brasil e no mundo); entre outras. Também participam do projeto alunos da graduação em Engenharia Elétrica da UFRJ – Mayara Santos, Leonardo Gonçalves e Gabriel Marques.
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Imagem: Reprodução do Portal.
Fonte: Saúde Popular.