Tribunal, espetáculo e pipoca

Por Guigo Ribeiro, para Desacato.info.

Dizem que é mediante a resolução do caso presente que as ruas aquietarão. Também pontuam que foi dado o fato que a agitação, em determinado ângulo, começou. Dizem que dado o veredito, será possível adentrar a calmaria, navegar em águas brandas. Dizem, inclusive, que as notícias procuraram só informar e que tais notícias ajudam no relógio do sossego em seu tic tac de aproximação ao estado de paz com o término. Este relógio está prestes a despertar. Assim. Simples. Na nossa mania de soluções práticas para tudo. Respirando ao longo da semana alegre ao comemorar o estadual xoxo. Simples. Justamente neste ponto que o espetáculo proposto ocupa outros espaços. Vira entretenimento, rendendo lucro, bandeiras, camisas. Movimenta as pessoas apressadas para o desfecho. O espetáculo permite aposta entre amigos sobre quando e como será a dita condenação. Sabe-se lá quantas cervejas estão envolvidas no tribunal. Ou um churrasco. Sabe-se que olhares ansiosos aguardam para ontem o fim da pauta e o “até que enfim” está gritando para virar som. Porque o tribunal criou um espetáculo. A espetacularização acompanhada por um balde de pipocas. Mastigar. Olhar. Tensão e inquietação pela espera. A televisão sintonizada. O banho apressado para após acomodar-se tranquilamente no sofá e assim ser testemunha do caso. Ser parte do evento e através disto, de certo modo, protagonizar o espetáculo. Fazer deste um pouco de nós. Nossa cura e melhora. O tribunal nos permitiu adentrar a sessão e acompanhar de perto tudo. Nos envolver, nos tornar parte da decisão. Por isso a oportunidade de acompanhar cada voto, fala, decisão. Por isso a extrema exposição. O segredo de justiça é secundário quando a decisão é clara. Tantos pontos da audiência recorde na cobertura do caso.

Não é dimensionável a necessidade para o fim. Esta abarca tanta coisa. A plateia aguarda o instante exato em que o vilão será pego e representará o fim de todo o mal. Não é difícil presenciar o tosco quando buscam retratar o personagem em questão. Veja! Há uma séria busca por, de fato, colocar o pior possível. Porque se não for por fatos, vai pela cara feia mesmo. O programa é lembrado em seu começo, meio e fim e as partes mais importantes, mais relevantes pontuadas. A necessidade maior, a que fez o tribunal se tornar um grande show, foi da ideia de resposta para a sociedade. O ponto central não é a justiça em si, mas fazer um espetáculo que preencha as pessoas e suas questões. Centralizar a pauta em uma pessoa e plantar sementes de utopia para o posterior. Quando agora são feitas ações que encontram o que tanto incomodava em outro momento, objetiva-se a resolução do problema maior. É neste tribunal que ocorre o caminhar para a sentença e a satisfação para a sociedade. Possivelmente ao término do espetáculo proposto, as pessoas poderão se retirar de seus assentos mais felizes e respirar com a sensação criada do extermínio do mal. Não raro os filmes são assistidos por olhos que buscam saber como será o fim do vilão. Talvez sejam necessárias tais emoções pequenas. Uma pessoa condenada, a chamada sobre o que foi decidido. Talvez procuremos cada vez mais embarcar em alguma novidade qualquer que seja. Sobre outro ou sobre nós.

A atenção seletiva midiática deixa claro que há muito mais coisas em jogo do que propriamente o porquê do martelo do juiz. Há o poder. Há como projeto apresentar o ladrão em praça pública e não só julga-lo. Quando nos tornamos parte desse jogo? E como podemos seguir nele? Assim como em tantos outros, fomos convidados para ser espectadores da violência, da tragédia, espectadores do agora e um agora que julga muito mais para atender uma demanda social. Talvez o grande ponto é que realizado o que tanto se trabalhou e quis, de fato, o todo entrará o campo da total satisfação. Talvez lembre também que todo o caminho até a decisão final foi árduo e resolva descansar um tempo. Não queira dedicar os mesmos esforços para os demais réus em potencial. O tribunal fez um grande show, contudo o que ganho dá-se somente em pipocas de cortesia.

Ajuda amor para o livro de Guigo Ribeiro voar.

Era uma ideia. Virou palavras numa folha em branco. Que virou um livro. E que quer ser publicado. Clique aqui!

Guigo RibeiroGuigo Ribeiro é ator, músico e escritor.

DEIXE UMA RESPOSTA

Please enter your comment!
Please enter your name here

Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.