Por Roberto Liebgott, Cimi-Sul Equipe Porto Alegre.
O Supremo Tribunal Federal/STF, em 12 sessões, pôs um fim à tese do marco temporal nas demarcações de terras indígenas no Brasil. Na tarde do dia 27 de setembro, de 2023 , os ministros retomaram o julgamento que já havia estabelecido 09 votos contrários ao merco temporal a 02 a favor, passando a reconhecer, em difinitovo, que os direitos indígenas são originários.
Os Artigos 231 e 232 da Constituição Federal foram preservados, a exceção foi o debate em torno das indenizações, ou seja, se deveria prevalecer o que Lei Maior diz – indenização só pelas benfeitorias de boa fé – ou a adoção da indenização pela terra nua, desde que os títulos dos ocupantes sejam comprovadamente de boa fé .
Leia mais: Lula diz que vetará marco temporal aprovado no Congresso
Na modulação prevaleceu o entendimento de que cabem as indenizações não só pelas benfeitorias de boa fé, mas também pela terra. As indenizações, no entanto, não alcançam terras já regularizadas.
Outro item relevante, na tese definida, vincula-se ao direito dos povos exercerem suas atividades tradicionais nas áreas indígenas onde há sobreposição de parques, florestas e outras caracterizações de reservas ambientais.
O STF também determinou a obrigatoriedade do reconhecimento de que as comunidades e povos indígenas são sujeitos de direitos e devem se fazer representar em todas as demandas judiciais como partes legítimas, atendendo dispositivo constitucional do artigo 232.
Importante destacar também que se consolidou o direito dos povos reivindicarem a revisão dos limites de terras demarcadas. Isso se torna possível quando no decorrer dos procedimentos de demarcações ocorreu desrespeitando aos dispositivos constitucionais. Mas, embora haja essa previsão, os ministros fixaram um prazo decadencial de cinco anos, a partir da homologação, para essa requisição. Ou seja, passado esse prazo perde-se o direito, a menos que haja pedido formal anterior não considerado, ou sobre o qual exista pendência judicial.
Quanto ao pagamento indenizatório pela terra nua, aos títulos de boa fé, a indenização deve ser prévia e com o direito de retenção. Esse aspecto segue a lógica do artigo 754 do CC. A retenção, segundo o Código Civil, consiste na faculdade de não restituir uma coisa, enquanto o credor dessa restituição não cumprir, por seu turno, a obrigação que tem para com o retentor.
Essa amplitude indenizatória pode impedir o avanço das demarcações, porque o governo federal precisará pagar aos detentores de títulos de boa fé em dinheiro, ou através dos títulos da dívida pública, mas, neste caso, o indenizável precisa aceitar. Há previsão, se o possuidor de títulos válidos, de ser reassentado, como umas das formas de indenização.
Segundo esse item, aquelas terras adquiridas, depois de 1988, em áreas onde não havia presença indígena e nem o renitente esbulho, os titulares de boa fé podem requerer indenização pelas benfeitorias, ou em relação à posse antiga e pela terra nua .
O processo indenizatório, quando não for incontroverso, deve ser apartado daquele da demarcação. E quando houver vício histórico, na concessão de títulos de propriedade pelos entes federados, estes deverão arcar com os ônus, mas a União pagará e cobrará o valor correspondente.
Portanto, o Governo Federal precisará prever recursos orçamentários com essa finalidade. Todavia, essa previsão não dependerá somente dele, governo, mas do Congresso Nacional, responsável pela aprovação orçamentária. Há, portanto, que se considerar que a maioria parlamentar é contrária aos interesses e direitos indígenas.
Apesar da definição da tese e das condicionantes acerca dos direitos dos povos indígenas, as demandas processuais, as interpretações jurídicas e os conflitos não cessarão.
De qualquer forma, a rejeição ao marco temporal obrigará o Governo Federal à retomar a política indigenista com base nas demarcações de terras e na assistência diferenciada nos territórios, independentemente de sua condição, se demarcados ou não.
—