Prefeito de Curitiba quer multar quem distribuir comida a pessoas em situação de rua

Na cidade que tem quase 3 mil sem-teto, proposta de Rafael Greca (DEM) prevê punição de R$ 150 a R$ 550 a quem doar alimentos “sem autorização”. Para vereadora, projeto é higienista e necropolítico

Guilherme Boulos, também condenou o projeto, chamando a decisão de Rafael Greca (foto) de “canalha”. “Dá pra pensar em algo mais desumano?” Foto: Reinaldo Ferrigno/Agência Câmara

O prefeito de Curitiba, Rafael Greca (DEM), quer multar quem distribuir comida à população em situação de rua do município sem autorização da prefeitura. Com a justificativa de “organização da distribuição”, o projeto de lei prevê advertência, seguida de multa que pode variar de R$ 150 a R$ 550. A proposta foi encaminhada à Câmara Municipal da capital paranaense com requerimento para que fosse votado em regime de urgência.

A iniciativa do prefeito contrasta com o atual momento do país, em que a segurança alimentar é ameaçada. Especialistas já apontam que a alta da inflação, o desemprego e a ausência do auxílio emergencial neste estágio da pandemia empurram de volta o Brasil para o Mapa da Fome da ONU. A questão é ainda mais crítica para aqueles que sequer têm um teto. Dados do próprio Executivo municipal apontam para quase três mil pessoas desabrigadas em Curitiba.

Rafael Greca justifica que as mudanças afetam apenas a forma de distribuição dos alimentos. O objetivo, segundo ele, é cadastrar os grupos e organizações de voluntários para que haja “controle sanitário e com distribuição em locais específicos”. A prefeitura alega, em nota publicada pelo portal G1, que “em alguns momentos os alimentos são oferecidos em exagero e, em outros, faltam alimentos”. Além disso, os “resíduos deixados pelos sem-teto acabam atraindo vetores urbanos e pragas”, acrescenta a gestão municipal.

Punir quem faz

Em carta-aberta assinada por ONGs e movimentos sociais, voluntários se queixaram de que “em meio a tantos problemas, tantas demandas não cumpridas, tantas possibilidades efetivas de resolver de forma eficaz o problema, a atitude é está: proibir e penalizar quem faz”, criticam. A Ordem dos Advogados do Brasil – Seção do Paraná (OAB-PR) também pediu explicações à prefeitura e à Câmara Municipal.

Chamado de Programa Mesa Solidária, a vereadora Carol Dartora (PT) prefere descrever o projeto como “Mesa Autoritária”. Em seu perfil noTwitter, ela criticou o teor da proposta. “Higienista, necropolítico ou os dois?”. O requerimento de urgência acabou sendo retirado pelos vereadores, mas o PL ainda segue em tramitação. A deputada federal e presidenta nacional do PT Gleisi Hoffmann (PT-PR) comparou a atitude do prefeito ao comportamento de Jair Bolsonaro frente à pandemia de covid-19.

“Diante da fome na pandemia, a mobilização pela doação de alimentos cresce a cada dia, mas isso não comove Rafael Greca, prefeito de Curitiba, que teve o desplante de enviar à Câmara projeto para punir entidades que distribuem comida à população de rua. Está na linha do genocida”, tuitou Gleisi.

O coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e da Frente Povo Sem Medo, Guilherme Boulos, também condenou o projeto, chamando a decisão do prefeito de “canalha”. “Dá pra pensar em algo mais desumano?”, escreveu. A avaliação do teólogo e filósofo Leonardo Boff é de que o PL “é desumano, cruel e sem piedade”.

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