Por Henrique de Almeida e Renan Almeida.
Concrejato diz que dispensa foi por ato de indisciplina dos carpinteiros
Por terem dado apoio, no sábado, à manifestação em favor da permanência da Aldeia Maracanã no prédio do antigo Museu do Índio, os carpinteiros José Antonio dos Santos, 47, e Francisco de Souza Batista, 33, acabaram demitidos dos empregos, na manhã desta segunda-feira (14), pela empresa Concrejato, que participa da reforma do Estádio do Maracanã.
Os dois trabalharam no turno da manhã no sábado, dia em que a aldeia amanheceu cercada por soldados do Batalhão de Choque o que provocou uma grande movimentação em solidariedade aos índios.
Não acho legal destruir um monumento como este só para fazer nome ou dinheiro.
O apoio dos carpinteiros ao movimento ocorreu no horário de almoço, quando eles decidiram ir à aldeia, pulando o muro, uma vez que o portão estava interditado pelos soldados do Batalhão de Choque.
“Vão derrubar um patrimônio cultural, além de deixar desamparadas as pessoas que ali estão. Eu não concordo”, defendeu José Antônio. Segundo Francisco, vários colegas pensam como eles mas têm medo de se manifestarem.
“Como cidadão, não acho que Cabral esteja fazendo um bom governo. Não acho legal destruir um monumento como este só para fazer nome ou dinheiro. Acho que isto é uma coisa com a qual ninguém pode concordar”, disse Francisco.
Ao retornarem à obra, tiveram seus crachás recolhidos por um funcionário do Consórcio Maracanã , formado pelas construtoras Andrade Gutierrez e Odebraecht que recomendou que eles voltassem apenas na segunda-feira quando definiriam a situação de ambos.
“Quando eles tomam o crachá, em 99% dos casos o trabalhador é dispensado”, antecipou Francisco no sábado.
Pulamos o muro porque quisemos. Sou um homem de caráter e temos que honrar nossa cultura
Nesta segunda-feira (14), em uma nítida perseguição política, os dois receberam três papéis. Em um havia uma advertência, o segundo continha uma demissão por justa causa e o terceiro seria a possibilidade de serem transferidos de canteiro de obra. Os dois não aceitaram assinar nenhum deles. Restou-lhe a demissão com seus direitos preservados.
José Antonio estava há cinco meses na obra. Francisco já totalizava 17 meses de trabalho. Nenhum dos dois, até então, havia tido qualquer problema disciplinar ou de falta. Jamais foram advertidos. “Sou um trabalhador que me dou bem com todo mundo. Chego cedo, se precisar saio mais tarde. Jamais fui advertido”, esclarece Francisco.
“Disseram que o consórcio não queria mais a gente aqui no Maracanã. Queriam nos transferir, mas seria muito ruim para nós, então concordamos em ser dispensados”, contou José Antonio.
Aldeia apóia operários
Ao serem informados da demissão dos operários, os indígenas deram total apoio aos dois. Quando chegaram à aldeia após serem demitidos, as palmas se misturaram a gritos de apoio em diferentes dialetos indígenas. Um discurso foi feito por Marize de Oliveira, uma das líderes indígena, que conclamou o Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil a apoiar os operários.
Francisco, ao receber um cocar na cabeça como forma de agradecimento, explicou o que havia acontecido aos presentes.
“Pulamos o muro porque quisemos. Sou um homem de caráter e temos que honrar nossa cultura”, disse ele, sob aplausos entusiasmados de uma comunidade em estado de tensão por causa da possibilidade iminente de serem expulsos do antigo Museu do Índio, lar da Aldeia Maracanã.
Os dois operários ganharam a solidariedade do advogado e ex-deputado federal Modesto da Silveira, conhecido defensor de presos políticos na ditadura militar, advogado de direitos humanos e atualmente conselheiro da comissão de ética da Presidência da República.Ele estava ali como observador para tentar evitar atritos, evitar alguma agressividade que violasse os direitos do cidadão.
Ele se dispôs a acompanhar os dois trabalhadores em uma conversa com “o capitão do mato” – termo que usou para referir-se ao responsável pela obra que anunciou a demissão. A ideia, porém, não foi levada adiante por conta do tumulto que poderia causar. Modesto sugeriu aos operários que buscassem o apoio jurídico do sindicato dos trabalhadores em construção civil.
Ato de indisciplina
Em nota emitida às 17H00 desta segunda-feira, a empresa Concrejato nega que tenha feito uma perseguição política e credita a demissão ao ato de indisciplina dos dois carpinteiros, por eles terem se ausentado do canteiro de obras, “desrespeitando as regras de trabalho do Consórcio Maracanã”. A nota diz ainda que a dispensa ocorreu por eles “terem pulado o muro do Complexo Maracanã, inclusive uniformizados”.
Segundo os dois operários informaram ao Jornal do Brasil, quando deixaram o canteiro de obras eles já tinha terminado o expediente de serviço e estavam em horário de almoço. Abaixo a íntegra da nota:
“A Concrejato esclarece que, no dia 12 de janeiro, os funcionários Francisco de Souza Batista e José Antônio dos Santos Cezar deixaram a obra do Maracanã, onde cumpriam expediente, desrespeitando as regras de trabalho do Consórcio Maracanã, o que resultou em demissão.
A empresa esclarece, ainda, que a medida tomada não foi influenciada pelo apoio dos funcionários à manifestação que ocorreu na mesma data, no prédio do antigo Museu do Índio. Tal fato ocorreu por eles terem pulado o muro do Complexo Maracanã, inclusive uniformizados, expondo-os a acidentes e abandonando o local de trabalho durante o expediente sem qualquer solicitação de dispensa nem comunicado aos seus superiores.
A Concrejato reforça que todos têm o direito de expressar sua opinião e que a demissão foi ocasionada por indisciplina e pelo descumprimento das regras de conduta e segurança que a empresa pratica”.
Fonte: Repórter Brasil.
Imagem: Jornal do Brasil.