Enquanto a população se concentra (ou se distrai) no processo eleitoral, o governo encaminhou, no finalzinho de setembro, a 5ª Rodada de Licitação do Pré-sal, na qual, segundo análise da FUP (Federação Única dos Petroleiros), as petrolíferas estrangeiras levam mais de 90% dos barris de petróleo leiloados. Segundo a referida análise, no leilão do dia 28, o preço médio pago por cada barril leiloado foi R$ 0,34. Isso numa conjuntura em que o barril está sendo vendido no mercado mundial por algo em torno de US$ 75, com tendência a aumentar em função dos recentes, e cada vez mais ameaçadores, acontecimentos na geopolítica mundial.
As petrolíferas estrangeiras levaram mais de 90% dos 17,39 bilhões de barris leiloados. Segundo a imprensa, os quatro blocos ofertados pela ANP (Agência Nacional de Petróleo) foram arrematados em questão de minutos. A britânica Shell e a norte-americana Chevron, participantes ativas da construção do golpe no Brasil, arremataram sozinhas o bloco de Saturno, na Bacia de Santos, que contém reservas calculadas em 8,3 bilhões de barris de petróleo. Por outro lado, a ExxonMobil (EUA), a BP (Reino Unido), a CNOOC (China), a QPI (Catar) e a Ecopetrol (Colômbia) dividiram os outros dois blocos da Bacia de Santos (Titã e Pau Brasil). A Petrobrás teve que se limitar ao arremate do bloco de Tartaruga Verde, localizado na Bacia de Campos, e que foi o menos disputado no leilão.
Segundo dados da FUP, em dois anos de vigência do golpe, com quatro leilões realizados no Pré-sal, sob o regime de Partilha, foram leiloados um total de 51,83 bilhões de barris. Destes, 13 multinacionais já arremataram reservas equivalentes a 38,8 bilhões de barris de petróleo. Juntas, essas gigantes do petróleo concentram 75% das reservas, onde são operadoras em seis dos 14 blocos licitados. As britânicas Shell e BP conseguiram se apropriar de 13,5 bilhões de barris desses leilões, mais inclusive, que a própria Petrobrás, que arrematou 13,03 bilhões de barris em campos leiloados nas cinco rodadas da ANP.
Quem não entendeu que o petróleo está no centro do processo golpista em operação no Brasil, terá dificuldades em compreender a conjuntura econômica e política nacional por muito tempo. José Serra, segundo denúncia feita em 2013 pelo site WikiLeaks, havia prometido à Chevron, em 2010, que, se eleito presidente, iria acabar com a Lei de Partilha. Consumado o impeachment da presidenta Dilma Roussef, foi aprovado imediatamente no Senado, o projeto de Serra, que tirou da Petrobrás a exclusividade na operação dos poços do Pré-sal e acabou com a obrigatoriedade da estatal ter participação mínima de 30% nos leilões, fatores fundamentais para a retenção da renda petrolífera no Brasil. Com dois anos de vigência do golpe, estão entregando o petróleo do Pré-sal, a preço de banana, como até as pedras já previam.
É preciso entender que os EUA, principal força no golpe no Brasil, tem uma necessidade dramática de fontes de suprimentos, na medida em que é o maior consumidor de petróleo do mundo, mas não produz em quantidade suficiente para suprir o consumo do país. Por detrás do golpe no Brasil (como ocorreu nos demais países da América Latina que sofreram processos semelhantes) há uma constatação de caráter estratégico, que é definitiva: o petróleo barato de produzir não tem nenhum substituto. Ele acabou, e o mundo já há algum tempo sofre as consequências políticas, sociais e militares deste problema. O produto extraído do pré-sal possui, além disso, alta produtividade e baixo risco de exploração, razões pelas quais, também, motivou o golpe. Este segue, assim, um roteiro criminoso, visando converter o Brasil em mero provedor de matérias-primas para o mundo desenvolvido e, ao mesmo tempo, transformar o pais em importador de derivados do petróleo e de produtos industrializados em geral.
Têm muitos brasileiros bem intencionados, achando que as eleições de 2018 irão “devolver o Brasil de antes”, ilusão que não encontra abrigo nos fatos. O cenário é bastante nebuloso, e não temos informações privilegiadas, mas parece evidente que quem perpetrou um golpe no resultado eleitoral de 2014, não irá entregar o poder pela via eleitoral em 2018. Isso só ocorreria se tivesse havido, no período, uma grande mudança na correlação de forças, o que absolutamente, não aconteceu. Eles continuam cometendo as maiores barbaridades, sem uma reação à altura da população. Independentemente, do resultado eleitoral (que é um processo muito controlado por eles), irão tentar completar o serviço do golpe, que passa por políticas como: apropriação dos recursos do Pré-sal que ainda não arremataram, privatização da previdência social, fim do sistema de seguridade, entrega do Aquífero Guarani para as multinacionais, venda de terras férteis, etc. É grande o risco de as eleições serem apenas um mecanismo de institucionalização do golpe, como aconteceu em Honduras e Paraguai, e/ou do próximo governo não conseguir se sustentar no poder. Independentemente do que ocorrer, tudo indica que as dificuldades do povo trabalhador irão se agravar no próximo ciclo da conjuntura.
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José Álvaro Cardoso é economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa Catarina.