O que podemos aprender com a pandemia? Por Douglas F. Kovaleski.

Por Douglas F. Kovaleski para Desacato. info.

O momento da história da luta de classes é único em termos de sobrevivência e possibilidade de transformação. Como está sendo importante podermos perceber de maneira extremamente clara quais os reais interesses da burguesia sobre a humanidade. A escolha foi e está sendo feita diariamente pelos representantes do capitalismo: em primeiro lugar o capitalismo, os lucros e a acumulação em detrimento da vida. A classe trabalhadora precisa olhar para isso como um grande aprendizado, como o tiro de misericórdia em qualquer perspectiva reformista ou social-democrata que defende que um outro capitalismo é possível.

A crise emerge da economia, ganha fôlego na biologia do vírus e dispara o gatilho de uma grande mudança, tão intensa como as mudanças que acompanhamos nessas últimas décadas. A classe trabalhadora encontra-se numa encruzilhada histórica: lutamos pela revolução ou caminharemos para o controle total do capitalismo sobre nossas vidas. O livro “1984, The big brother” inspira coisas às quais a sociedade capitalista se aproximou muito nesse período recente, como a polícia do pensamento. As formas de trabalho precarizado, unidas de uma incrível divisão da sociedade em setores que não dialogam, formados por pessoas que cada vez mais se individualizam possibilitam esse controle quase total.

Mas em meio a essa aceleração do controle, da precarização da vida, da opressão, da violência do Estado (pois é preciso anular os descontentes), emergem iniciativas interessantes, talvez o gérmem de uma nova sociedade. As perspectivas de solidariedade, ajuda mútua, redes de apoio e cuidado lança uma esperança em meio à tempestade em que vivemos. A necessidade e o cultivo de ações solidárias, deixando de lado a conotação neoliberal do termo, tão em voga na grande mídia, é o que possibilitará a derrubada do capitalismo e a construção de um modo de vida comum.

A vida em comunidade, em coletivos, em movimentos que lutam por causas pelo bem comum são estudas no campo da sociologia e apresentam uma interface significativa com o campo da saúde e interferem diretamente na condição de vida das populações e dos indivíduos. É sabido que o capitalismo é incompatível com uma boa vida, mas há uma tendência a hipervalorizar o biológico em detrimento do social muito reforçada nesse momento. Coisas aparentemente banais para a saúde, como reconhecimento de grupo, luta por questões comuns, trabalho voluntário engajado (aquele que tem uma finalidade maior que não seja a benemerência que substitui o Estado), manter as tradições, o folclore, os vínculos afetivos, a cultura local são aspectos fundamentais para a saúde humana.

Esses aspectos são condicionados, em primeira instância pela posição de classe, pela relação econômica, pela condição de proteção social estatal. Nesse aspecto, não se pode simplificar a complexidade do social com um rótulo de classe, mas analisar cada aspecto da vida social de maneira a valorizar o que há de bom para promover uma sociedade melhor a sociedade do comum. O MST tem dado um grande exemplo de solidariedade com doação de alimentos orgânicos para a população da periferia dos centros urbanos. E o desafio é olhar para estes aspectos da sociabilidade numa perspectiva revolucionária, afinal em que mundo queremos viver?

Douglas Francisco Kovaleski é professor da Universidade Federal de Santa Catarina na área de Saúde Coletiva e militante dos movimentos sociais.

A opinião do/a autor/a não necessariamente representa a opinião de Desacato.info

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