Por Raul Fitipaldi, para Desacato.info.
O presente de Santa Catarina continua pertencendo ao passado recente do Brasil, esse que expirou em 31 de dezembro de 2022 em nível federal, mas que ainda traz muita dor ao país e que segue firme em alguns estados da federação. Excerto e cabide dos apaniguados de um superado governo federal negacionista, violento, chulo, grosseiro e ultraconservador, com ódio visceral do/a outro/a, especialmente se de mulheres negras, indígenas, cultura popular e democracia se trata, o estado catarinense é um dos mais reacionários institucionalmente e colocou as manguinhas de fora apenas começar 2023.
Advogados pagos pelos contribuintes para defender golpistas
Logo no começo o novo governador, Jorginho Mello (PL), natural de Ibicaré, pequeno e jovem município do interior catarinense, com pouco mais de 3 mil habitantes, foi mostrando a que veio. Como resposta à prisão de fascistas catarinenses, que participaram de diversas formas nos atos golpistas de 8 de janeiro contra os 3 poderes em Brasília, Jorginho colocou os advogados do estado, pagos por nós, para acompanhar (defender?) a prisão e julgamento dos violentos e violentas que representaram SC nessa afronta à paz e a lei. Lembre: https://oglobo.globo.com/politica/noticia/2023/01/bolsonarista-governador-de-sc-poe-advogados-do-estado-para-acompanhar-presos-por-ataques-em-brasilia.ghtml
Esse fato não é isolado e faz parte de uma visão de sociedade e de governo.
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Um monarquista olavista para cuidar da cultura catarinense
Em outro gesto tipicamente bolsonarista, na semana que passou, o flamante governador, deu um sinal claro de sua linha de atuação adeversa à cultura, especialmente àquela que representa as classes excluídas da sociedade. Colocou à frente da Fundação Catarinense de Cultura alguém que não é só inapropriado para o cargo por desconhecer a cultura provincial, mas pelos antecedentes antidemocráticos que o permeiam. Indicado por Roberto Rêgo Pinheiro, alcunha artística de Roberto Alvim, que foi diretor da Fundação Nacional de Artes e secretário especial da Cultura do Brasil no governo Jair Bolsonaro, Rafael Nogueira foi nomeado por Mello para conduzir a Fundação Catarinense de Cultura. Seu padrinho político, Alvim, alcançou notoriedade por um vídeo que mais parecia uma representação de Joseph Goebbels, ministro de propaganda de Adolf Hitler, depois do qual precisou ser afastado do cargo de “secretário especial” (lembre o vídeo: https://youtu.be/61-99HUGbAs ). O afilhado, Rafael Nogueira é Olavista, monarquista e bolsonarista, professor de cultura clássica e ex-presidente da Fundação Biblioteca Nacional no governo de Jair Messias, na qual não deixou nada de útil, inovador ou respeitável.
A classe artística e vinculada à cultura catarinense reagiu de imediato e não parece estar disposta a aceitar tamanho acinte. É uma comunidade que sofreu duramente em período de pandemia, que teve que reformatar não só sua arte porém sua vida. Jorginho Mello conseguiu um inimigo bem quisto em amplos setores da sociedade e que não vai aceitar de braços cruzados a ofensa.
Racismo, machismo, nazifascismo, ameaças por internet: o lixo bolsonarista em casa
Leia a seguir as ameaças que, via rede (autor não confirmado), recebeu a vereadora de Joinville, Ana Lúcia Martins (PT) e onde também são ameaçados a vereadora Giovana Mondardo (PCdoB) de Cricíuma e o presidente do PDT, Manoel Dias:
“Data: sex., 3 de fev. de 2023 às 02:05
Assunto: Avisa a vereadora Maria Tereza Capra de São Miguel do Oeste sobre isso
Para: <[email protected]>
‘Ana Lucia Martins sua macaca preta imunda faça alguma coisa útil e avisa Maria Teresa que é sua colega nesse partido de merda que é o PT.
Um recado para Maria Tereza Capra, Giovana Mondardo e Manoel Dias presidente do PDT-SC
Você não tem como evitar sua cassação Maria Tereza, não adianta ir chorar nessa imprensa imunda como os sites G1, Brasil 247, Diário do Centro do Mundo e WH3 e nem no lixo do Ministério Público Federal. Por culpa sua e da prostituta da Giovana Mondardo de Criciúma os vermes do diretório estadual do meu partido PDT me puniram, isso não vai ficar assim.
Cassar seu mandato é só o primeiro passo, vou cassar sua vida depois sua biscate gorda, vagabunda , você é tão feia que nem merece ser estuprada, tem que morrer de pancada você e sua família de merda. E depois de você vou acabar com a vida daquela vadia da Giovana e do prostituto do Manoel Dias presidente do PDT aqui de Santa Catarina.
Não devia ter denunciado os patriotas por fazer a Saudação Romana diante do quartel Maria Tereza, São Miguel do Oeste não é uma cidade nazista, é uma cidade NACIONAL-SOCIALISTA mas você é burra demais para entender isso sua vaca velha. Vai entender quando o presidente Bolsonaro voltar ao poder, estamos conspirando para isso, não fomos derrotados em Brasília, a vitória final virá e iremos matar você, a Giovana, o Manoel Dias, o molusco ladrão Lula, o ladrão de merenda Alckmin, o porco gordo seboso Flávio Dino e os filhos das putas do Alexandre de Moraes cabeça de ovo e os porcos do STF.
Seus dias e os dados sua família estão contados sua vadia.” (aspas nossas)
A mensagem está assinada, supostamente, por Vanirto Conrad, presidente da Câmara Municipal de São Miguel do Oeste, mas na hora de escrever este texto sua autoria não foi confirmada. A mensagem foi endereçada ao Gabinete Vereadora Ana Lúcia Martins Rosskamp.
Além do estarrecedor do conteúdo, dele próprio se desprende com clareza a defesa de uma ideologia, a qual se transfere a todos os cidadãos e cidadãs de São Miguel do Oeste de forma inconsulta: “São Miguel do Oeste não é uma cidade nazista, é uma cidade NACIONAL-SOCIALISTA.” afirma o biltre que escreveu essa mensagem hedionda. Nacional Socialista era o partido de Adolf Hitler. Além de abominável em si a defesa do nacional-socialismo, pior ainda reivindica-lo como concepção ideológica de toda uma cidade. Conhecemos o povo de São Miguel e não é assim. Tem muitas pessoas lutadoras, bem inspiradas, com inspiração coletiva, solidária, fraterna e com uma ótima visão de mundo e práticas diárias em favor dos mais vulneráveis. Essa adjudicação da mensagem é covarde, injusta e miserável.
O “tribunal de exceção” da Câmara de Vereadores de SMO confirmou e executou a cassação anunciada na mensagem que recebeu Ana Lúcia Martins
“Carlos Roberto Agostini (MDB), Elói Bortolotti (PSD), Gilmar Baldissera (PP), Moacir Fiorini (MDB), Nélvio Paludo (PSD), Paulo Drumm (PSD), Ravier Centenaro (PSD), Valnir Scharnoski (PL), Vilmar Bonora (PSD) e Vanirto Conrad (PDT)- votaram favoráveis ao relatório da CPI e pela cassação do mandato da vereadora petista.” informou no seu artigo de ontem, sábado pela manhã, nossa companheira jornalista Jaine Fidler Rodrigues. https://desacato.info/maria-tereza-capra-pt-mandato-cassado-por-10-votos-a-1-na-camara-de-sao-miguel-do-oeste/
Aí então os nomes do tribunal migueloestino que afastou da casa legislativa à vereadora Maria Tereza Capra (PT), por ter repudiado e dado visibilidade a um ato pró Bolsonaro que teve gestos indubitavelmente nazistas.
O “tribunal de exceção” alegou, para cassar Capra, que a visibilidade dos gestos nazistas traria “prejuízos incalculáveis à imagem da cidade”. Claro que não se trata disso. Apareceu uma oportunidade para tirar do parlamento a única mulher de oposição, o resto é papo-furado. Unidade total sem divergências é o que pretendem os legisladores do Reichstag do Extremo Oeste.
O caso não morre por aqui, haverá luta política, social e jurídica para que a vereadora recupere, como corresponde, seu mandato. Mais, deveria inclusive, e é de imaginar que os advogados do grupo Prerrogativas, que a assessora, também busquem saber a motivação e se mais alguém de fora da cidade está por trás do afastamento da legisladora.
Mal começo de 2023
Santa Catarina iniciou da pior forma possível o novo ano, o novo governo e as novas legislaturas. Um estado onde o ideário nazista, como no ensinou a recentemente falecida, professora e pesquisadora do nazismo, Adriana Dias, está muito presente e as ideias reacionárias e excludentes são corriqueiras, tanto em setores da sociedade como nos parlamentos municipais e estadual, precisa, por via do debate de ideias e da mobilização social, tirar essa pecha de ter um perfil de estado intolerante, branco, machista, violento, xenófobo e antifeminista. Urge refletir sobre esta realidade e mudar ela sob pena de perder o mais valioso que tem qualquer sociedade, o amor, a fraternidade, a solidariedade e o sentimento de justiça.
Edição e publicação: Tali Feld Gleiser.
Raul Fitipaldi é jornalista e cofundador do Portal Desacato e da Cooperativa Comunicacional Sul.