O besta


Por Raul Longo.

Até pensei em usar de título “A Besta”, mas lembrei já o ter feito anteriormente em relação a um ou mais desses tantos que pululam por aí, sobretudo nos meios de comunicação do Brasil, muitas vezes por nós concedidos.

Compulsoriamente concedidos, pois, como eu, sei que muitos não concederiam coisíssima alguma para gente tão estúpida. Mas não lembro se o estúpido que homenageei naquele texto, indicando por “A Besta”, foi o Boris Casoy. Se foi, peço desculpas.

Peço desculpas a quem o tenha lido o texto, claro! Tenho de pedir porque, mesmo lembrando que ali considerei velho ditado de que o Diabo, ou A Besta, não é sábio por ser o Diabo, mas sim por ser velho, tal comparação nunca se justificaria.

Se me referi ao Casoy, foi uma enorme besteira de minha parte, pois evidente que alguém tão estúpido jamais poderia ser comparado com A Besta. Ou com o Diabo que, pelo menos por ser velho, é sábio.

Casoy é velho, mas não é sábio. Logo, é O Besta.

Foi o que disse ao Celso Lungaretti quando me escreveu pedindo não tocar mais no assunto de quando presenciei o Casoy ser vaiado e chamado de nazista numa reunião de jovens contrários às agressões do estado de Israel ao povo palestino, na Hebraica, na Rua Três Rios, no Bom Retiro em São Paulo; aí por volta dos últimos anos da década de 60.

Esse meu relato que o Celso transcreveu num seu comentário sobre o xingamento do O Besta aos garis de São Paulo, foi o principal motivo da ação judicial impetrada contra o companheiro. Acatei o conselho do Lungaretti, mas me vejo forçado a notar quanto o Casoy consegue ser, talvez, o maior entre os tantos bestas da mídia brasileira.

Não por ter xingado os garis, pois aí se denota apenas um preconceito tipicamente nazistóide. Se notifica como tal por dar vaza para maior divulgação de um momento de sua insignificante vida pregressa que, a si, quanto mais esquecido melhor, ainda que difícil esquecer de quem usa de uma concessão pública para, insistentemente, ofender o público.

Dá até para citar como exemplo o inverso, pois embora fosse do interesse de todo mundo meter um processo no Casoy cada vez que nos trata como idiotas, com que bases haveríamos de processá-lo por abuso da liberdade de expressão, através dos meios que lhe concedemos?

É preciso que comprove? Relativamente simples, mas há de se consultar os arquivos dos telejornais por ele apresentado para encontrar a edição na qual noticiou que o assessor do irmão do Genoíno comprovara que os tais dólares na cueca eram realmente para aquisição de automóveis para uma revendedora e, em consequência, fora absolvido pela Justiça brasileira.

Pois apesar do próprio ter informado o fato, o mesmo Casoy continuou se referindo aos “dólares na cueca” em qualquer comentário sobre o governo Lula, houvesse ou não justificativa pra retomar o assunto. E o fez até que se divulgou os flagrantes produzidos por Durval Barbosa, assessor do então governador do DF, demonstrando os aliados de José Roberto Arruda enfiando propinas nas cuecas.

Desde este episódio conhecido como Mensalão do DEM, Casoy nunca mais tocou no caso do dinheiro para compra de automóveis que ele próprio noticiou e ele mesmo quis que eu esquecesse que tenha noticiado. Ou seja: a quem Casoy considera como besta? A mim ou à justiça brasileira que inocentou o assessor do irmão do Genoíno, conforme ele mesmo noticiou?

Enfim, não importa. Não processaria o Casoy por me julgar um besta, pois se o fizesse de fato o seria ao ajudar a promover quem melhor se esquecido.

Agora, um judeu que colabora na divulgação de em seu passado ter se imiscuído a nazistas, sem dúvida é uma besta emérita! Apesar de ter acatado a recomendação do Lungaretti, o companheiro me desculpe mas é fato tão notável que não dá para deixar de comentar agora em que até o juiz que julgou a ação contra o Celso, destaca o tamanho da besteira praticada inclusive no trecho em que a mim se refere.

Confiram adiante e abaixo, o trecho:  “Menciona, finalmente, relato de pessoa identificada, agora reafirmando a participação do querelante na agremiação, o que inclusive teria causado embaraços para o querelante em clube da colônia hebraica (e o querelante faria parte da colônia), isto pelo uso da cruz suástica como símbolo pelo referido “CCC”.

Ora, se o querelado relata os fatos como tendo sido referidos por terceiros, um dos quais inclusive nominalmente identifica, como ainda refere estar reproduzindo notícia anteriormente divulgada em veículo de comunicação àquele tempo bastante conhecido, creio que nisso não se pode ver propósito deliberado de infamar, mas sim de meramente narrar fato, fato este cuja divulgação no texto veiculado na internet — e que ora é objeto da presente queixa — se deu em regular exercício do direito de crítica e liberdade de manifestação do pensamento.

No mais, os adjetivos — carregados, por certo — empregados no texto e atribuídos à pessoa do querelante guardam relação direta com os fatos ali também relatados. Não haveria sentido punir, a título de injúria, aquilo que decorre de fatos cuja divulgação, no entanto — e a meu ver — não poderia caracterizar o crime, mais grave, de difamação.

Em outras palavras, exatamente o que escrevi em resposta ao Celso quando me contou do pejo do Casoy ao próprio passado, lembrando que depois de tantas décadas não tenho como localizar as pessoas presentes àquela reunião da Hebraica, portanto não há como provar o acontecimento do fato. Mas, por outro lado e pelos mesmos motivos, tampouco há como provar que o fato não tenha ocorrido lá nos anos 60.

A quem Casoy classificou de tolo com a proposta dessa ação? Ao Celso Lungaretti ou à Justiça Brasileira?

A meu ver, a si mesmo. Além se realçar-se como hipócrita, pois acusa a extinta Cruzeiro de praticar o mesmo que pratica, pois se é mau jornalismo noticiar um fato que só agora ele alega não ter ocorrido, que será a constantemente referência a fato que ele próprio noticiou como não ocorrido?

Poderia cogitar aqui sobre as insondáveis razões do O Besta não ter processado a Cruzeiro ao invés do Lungaretti, mas me ocorre uma evidência comprovável, mesmo passadas as tantas décadas que nos separa da famosa guerra da Rua Maria Antonia entre os estudantes da Faculdade de Filosofia da USP e os do Mackenzie onde Casoy estudou e serviu como sede do CCC – Comando de Caça aos Comunistas que espancou os atores da peça Roda Viva no Teatro Ruth Escobar em São Paulo, explodiu uma bomba no Teatro Opinião no Rio de Janeiro, assassinou o Padre Antonio Henrique Pereira Neto no Recife e destruiu os estúdios da Rádio MEC em Brasília, entre outros feitos de maior e menor monta.

Certamente haverá por aí alguém que tenha participado do confronto das universidades da Maria Antônia ou frequentado o Bar do Zé, na mesma rua, e que lembrará o que todos estudantes da época sabiam: da participação no CCC de lutadores de academia de jiu-jítsu que ostentavam tatuagens da cruz suástica.

Ora! É universalmente conhecida a mais que justa aversão dos hebreus a qualquer um que se alie quem apoie a ideologia nazista. Tanto assim que, um verdadeiro hebreu, que realmente conheça a história de seu povo, jamais ofenderia ou desprezaria um gari sem a menor razão para isso.

Por outro lado, também é bastante imaginável qual haveria de ser a reação de jovens da Hebraica em relação a um integrante da mesma etnia ou religião, apontado por revista de grande circulação como integrante de uma agremiação simpatizante ao nazismo, seja ela o CCC ou a KKK dos Estados Unidos.

Pode até ser mau jornalismo da Cruzeiro da época, ao estilo do praticado pelo Casoy hoje. Pode, inclusive, ter acontecido dos estudantes da Hebraica o terem confundido com outro muito parecido. Mas mesmo que nunca tenha pertencido ao CCC nem à KKK, processando o Lungaretti e dando divulgação ao que deveria tentar se esforçar para ser esquecido, o bobo Boris se confirmou inconteste liderança do Quá Quá Quá amiúde provocado pela mídia brasileira!

A SENTENÇA DO PROCESSO DE CASOY CONTRA MIM: ABSOLVIÇÃO

Celso Lungaretti (*)

“Julgo improcedente a presente ação penal, para absolver Celso Lungaretti dos delitos dos artigos 139 e 140 do Código Penal, que lhe foram imputados, o que faço com fundamento no artigo 386, III do Código de Processo Penal.”

Foi esta a decisão do juiz de Direito José Zoéga Coelho no processo nº 050.10.043276-0, que o jornalista Boris Casoy moveu contra mim no Juizado Especial Criminal da Barra Funda (SP), acusando-me de difamação e/ou injúria.

A minha defesa foi assumida pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, ficando a cargo do coordenador do Depto. Jurídico, dr. Jefferson Martins de Oliveira, que atuou com raro brilhantismo.

Para quem quiser conhecer os detalhes do caso, recomendo a leitura do artigo que escrevi ao ser intimado, Casoy me move ação criminal por artigo sobre o episódio dos garis.

Eis os trechos principais da sentença:

A leitura do texto integral (…) não deixa dúvidas quanto ao propósito de dirigir à pessoa do querelante séria crítica. Isso, por si, não basta para configurar crime contra a honra.

Nesse pondo o Direito se defronta com questão de suma dificuldade, qual seja a de traçar, em critérios tão claros e objetivos quanto possível, a linha divisória entre dois direitos constitucionalmente tutelados: o direito à livre manifestação de pensamento (e à liberdade de informação), de um lado, e, de outro, os direitos fundamentais da pessoa, dentre os quais se inclui o direito à proteção da honra.

Cumpre reconhecer que o querelante, porque pessoa pública e homem de imprensa de grande renomada, é passível de maior exposição à crítica jornalística.

Por outras palavras, como homem de imprensa que fala ao grande pública, as convicções pessoais do querelante (estas que transparecem em seus atos, mesmo que pretéritos) tornam-se de interesse para a sociedade, sabido que a relação entre jornalista e seu público é fundada numa certa confiança quanto à qualidade da informação noticiada.

Sendo, assim, justificável que a crítica possa envolver fatos sobre a vida do querelante e que em princípio possam atingir sua pessoa e, via de consequência, também sua honra.

Em suma, como toda pessoa pública, sobretudo que desempenhe atividade de interesse público (…), também o querelante, por sua profissão de jornalista, está justificadamente exposto à crítica, sem que o exercício desta possa mitigado em defesa da honra.

Pelo exposto, entendo que a crítica, mesmo que envolvendo fatos em princípio aptos a afrontar a honra daquela pessoa assim criticada, não basta para evidenciar aqueles crimes de que trata a queixa.

Para além da questão atinente aos limites entre a liberdade de informação (e de crítica, mesmo que voltada à vida íntima de pessoas que desempenhem atividades de interesse público) e o direito à proteção da honra, há ainda a considerar a questão sob outro aspecto, este de aspecto já estritamente jurídico penal.

Os crimes contra a honra exigem dolo específico, ou seja, intenção deliberada e precípua de atingir a honra do ofendido. No caso ora em julgamento, verifica-se que a raiz de todas as expressões alegadamente infamantes está ina imputação do fato do querelante ter pertencido a determinada organização, denominada “CCC”.

Quanto a este ponto, a leitura do texto publicado na internet pelo ora querelado demonstra que, a tal respeito, ele menciona como fonte de uma tal informação notícia anteriormente publica em revista de grande circulação (na época em que dita informação ali se ventilou).

Menciona ainda informação dada por terceiro, não identificado, mas que teria sido contemporâneo do querelante nos bancos acadêmicos e que coincidiria com a participação do querelante na mencionada organização.

Menciona, finalmente, relato de pessoa identificada, agora reafirmando a participação do querelante na agremiação, o que inclusive teria causado embaraços para o querelante em clube da colônia hebraica (e o querelante faria parte da colônia), isto pelo uso da cruz suástica como símbolo pelo referido “CCC”.

Ora, se o querelado relata os fatos como tendo sido referidos por terceiros, um dos quais inclusive nominalmente identifica, como ainda refere estar reproduzindo notícia anteriormente divulgada em veículo de comunicação àquele tempo bastante conhecido, creio que nisso não se pode ver propósito deliberado de infamar, mas sim de meramente narrar fato, fato este cuja divulgação no texto veiculado na internet — e que ora é objeto da presente queixa — se deu em regular exercício do direito de crítica e liberdade de manifestação do pensamento.

No mais, os adjetivos — carregados, por certo — empregados no texto e atribuídos à pessoa do querelante guardam relação direta com os fatos ali também relatados. Não haveria sentido punir, a título de injúria, aquilo que decorre de fatos cuja divulgação, no entanto — e a meu ver — não poderia caracterizar o crime, mais grave, de difamação.

Assim, não houve dolo específico de atentar contra a hora do agente. E quando a honra foi por vezes atingida, assim ocorreu no exercício do direito à crítica. Sem dolo específico, não se pode então falar em crime contra a honra.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Embora a sentença me desobrigue de dar qualquer satisfação a Casoy, continuo considerando pertinente o direito de resposta que lhe ofereci na audiência de conciliação — e teria da mesma forma concedido se ele o houvesse simplesmente pleiteado por e-mail.

O fato é que seu nome, correta ou erroneamente, ficou associado ao Comando de Caça aos Comunistas. E, não tendo encontrado versão alternativa nos milhares de textos que apareciam nos sites de busca ao teclar “Casoy CCC” (eram muito mais no momento do episódio dos garis, hoje ainda restam 6 mil), eu tinha o direito de acreditar que tal vinculação fosse um dado incontroverso.

No tribunal, Casoy alegou ter a revista O Cruzeiro praticado mau jornalismo. Disse que jamais pertenceu ao CCC.

Ora, eu não sou, nunca fui e jamais serei um inquisidor. Então, se Casoy quiser finalmente apresentar o seu lado nessa questão, não serei eu a vedar-lhe o acesso a minhas humildes tribunas.

Assim como, democraticamente, também daria espaço a qualquer cidadão que, com elementos concretos (provas e testemunhos), porventura o quisesse refutar.

Só não entendo por que ele preferiu pinçar dois blogueiros, dentre os milhares que então o criticaram (a grande maioria de forma muito mais contundente), tentando impor a ambos uma retratação humilhante que, no fundo, não desfaria as dúvidas a tal respeito.

Decerto haverá grande jornal, grande revista ou programa importante de TV disposto a ouvi-lo, permitindo-lhe difundir sua versão em escala imensamente mais ampla.

* jornalista, escritor e ex-preso político. http://naufrago-da-utopia.blogspot.com

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