“Novos símbolos por detrás das lentes”

Por Victor Caglioni. 

Os óculos nos ajudam a ver melhor, a prevenir distorções e evitar que nossa visão possa sofrer com algum malefício externo.

Em 2005, alguns meses após entrar na universidade, meus olhos andavam cansados e desse cansaço resultavam fortes dores de cabeça. Estava evidenciada a necessidade de usar óculos de descanso. Meu primeiro exemplar foi escolhido numa tradicional ótica de Blumenau.

Passaram-se os anos, li o que pude, lecionei, inicie mestrado, fiz do computador uma ferramenta de trabalho físico e de pesquisa em várias vertentes, exacerbei o uso dos meus olhos, em 2011, após entrar numa empresa resolvi mudar as lentes que já apresentavam pequenos arranhões. Mudei, apesar do cambio favorável naquela ocasião paguei em Buenos Aires o mesmo que pagaria na terra natal dos substituídos.

Faz algumas semanas, distraído acompanhava as eleições brasileiras via internet, num leve “descuido” entre papéis que cobriam a mesa do computador, meus óculos caíram no chão, houve então uma pequena ruptura numa das extremidades, mas que permitia que ainda fossem usados. Como uma das principais características da cultura acadêmica daqui, com suas exceções, é a de evidenciar mais aquilo que se diz e pensa do que aquilo que aparenta isso não me preocupou, mais além do fato de saber que antes ou “no voltar” ao Brasil deveria trocá-los.

Hoje sete de novembro de 2012, em Buenos Aires faz um calor tipicamente brasileiro, aproveitei para deixar a porta da varanda aberta e ler meus textos no chão, onde me parecia ser mais fácil e fresco interpretar a teoria crítica de Max Horkheimer.

Em determinado momento, como um alívio climático se fez presente uma ventania que adentrou no quarto, fazendo com parte de minhas folhas voassem e que caíssem dois livros que estavam em pé numa pequena mesa ao lado da cama, um deles se chama Nunca más,  um informe da comissão nacional sobre o desaparecimento de pessoas na ditadura militar argentina, que comprei para presentear a uma grande amiga brasileira. Justamente este livro caiu sobre meus óculos que já frágeis e sem armadura lateral, quebraram em praticamente todas suas extremidades.

Agora sim terei que comprar novos óculos, na Argentina ou no Brasil, em pesos ou em reais, não importa, só sei que serão outros e que simbolicamente representarão uma nova etapa, um novo modo de ver as coisas, levando em conta aquilo que veio antes.

Muitas vezes, em nossa subjetividade, já diziam alguns pensadores, necessitamos materializar algo que está em nosso interior para darmos conta de entendemos pelo que passamos e não importam as condições, sobre a mesa ou sobre o chão elas se farão presentes como uma nova oportunidade de recriar-se e serão várias as molduras, mas nunca mais serão as mesmas, felizmente.

Victor José Caglioni, Buenos Aires. Argentina.

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