Por Raul Fitipaldi, para Desacato.info.
Como já expressamos em outros artigos, compreendemos as limitações iniciais de um governo que, mesmo sendo de cunho progressista-socialdemocrata, precisou articular uma grande frente para ganhar a eleição contra o fascismo bolsonarista e uma ainda maior para superar a intentona golpista e o trânsito no parlamento. No entanto, é necessário fazer reparos a diversas escolhas que colocam em risco futuro ao próprio governo e à democracia que ele defende e precisa sustentar junto à população. Não vemos com bons olhos, e nenhum democrata pode ver, a escolha de Juscelino Filho (União Brasil-MA) para uma pasta que, se não aparece para a sociedade como decisiva e estratégica, de fato é isso tudo se compreendemos a conjuntura atual do país e do mundo. Como já muitos/as devem ter esquecido, lembremos que Juscelino Filho é nada menos que o Ministro das Comunicações.
Primeiro é necessário que a sociedade saiba que esse ministério nada tem a ver com Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República (Secom) que é comandada por um jornalista, Paulo Pimenta, homem da área. Lamentavelmente nessa articulação que teve como objetivo abrir caminhos para que os principais projetos do governo tenham apoio no Congresso, desprezou-se a importância da pasta das Comunicações. O erro pode ser corrigido e deve ser corrigido o quanto antes.
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Não há tempo para perder na discussão da regulamentação para as novas plataformas digitais, o comércio eletrônico, o papel das mídias multinacionais em território brasileiro, os serviços de streaming, consolidar, como o governo parece disposto, a Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e a TV Brasil, devastadas profissionalmente e com a finalidade desviada no governo Bolsonaro, em definitivo, a marcha da Soberania Comunicacional. Pode se fazer isso com um ministro no comando das Comunicações que não é da área e que, longe de ter um currículo adequado, tem um histórico, no mínimo discutível e antidemocrático?
Juscelino Filho votou a favor do impeachment contra a legítima presidenta e primeira mulher a governar o Brasil, Dilma Rousseff. Impeachment que como a história demostrou foi produto de uma articulação golpista contra a mandatária que não cometeu nenhum crime e que, em todo caso, repetiu o que todo governador e prefeito costuma fazer no país na hora de equilibrar contas (as tal de ‘pedaladas’). Logo, Juscelino Filho é abonador e parte do golpe de 2016. Tem mais, Juscelino tem tecido vários comentários elogiosos ao presidente genocida e fascista Jair Bolsonaro.
Se deixamos essa foto de lado tem mais. Juscelino é médico radiologista e não entende patavina de comunicações. Bem, é um cargo político, então quem sabe podemos relevar isso, por aí daria certo. Nísia Trindade, por exemplo, é Ministra de Saúde e é socióloga. Porém, Juscelino Filho apresenta mais condições que tornam seu mandato impróprio para as comunicações e para a inclusão social, tema principal na plataforma de governo do presidente Lula. Ele foi a favor da reforma trabalhista e votou a favor da PEC do teto de gastos, duas votações que prejudicaram os trabalhadores, a saúde e a educação do povo brasileiro.
No entanto, seu currículo desabonador foi acrescido ontem em matéria do UOL: https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2023/01/30/ministro-de-lula-beneficiou-fazenda-propria-com-orcamento-secreto.htm Como consta na matéria, Juscelino, quando era deputado federal, beneficiou-se de forma escandalosa e beneficiou os interesses da sua família com dinheiro público para obras elencadas em favor dos negócios do seu clã. O ministro das Comunicações resistiria a um portal de transparência?
Por outro lado, a realidade avança e as Agências Nacional de Telecomunicações (Anatel) e Nacional do Cinema (Ancine) – e ações desenvolvidas pelo Serpro e a Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP), entre outros espaços, tem na prática seus projetos digitais, que não podem esperar. Ao não ter uma centralidade na pasta correspondente, as comunicações no Brasil viram uma Torre de Babel. Ou seja, a agenda nebulosa do ministério do Juscelino (se houver), torna as comunicações, pasta das mais estratégicos para o Brasil atual e futuro, seja em segurança, educação, saúde, mídia, ciência e tecnologia, indústria, um risco que o governo Lula não tem direito a assumir.
Será que um mês de Juscelino Filho na pasta já é suficiente para lhe agradecer e devolvê-lo ao parlamento? Parlamento, diga-se, onde também não é uma luminária, salvo quando de favorecer os parentes se trata. Aliás, lembra como parlamentar alguns trejeitos do ex-presidente Jair Messias, o genocida.
Edição e publicação: Tali Feld Gleiser.
Raul Fitipaldi é jornalista e cofundador do Portal Desacato e da Cooperativa Comunicacional Sul.