#JeSuisBasque: Perseguição a bascos escancara falta de liberdade de expressão na Espanha

Na segunda-feira, a Guarda Civil prendeu 12 advogados bascos com a desculpa de “defender o terrorismo” e acrescentando uma novidade: evasão de divisas

Em janeiro de 2010, uma imensa mobilização, que reuniu mais de 100 mil pessoas pelos direitos dos presos políticos bascos, foi diversas vezes ameaçada de ser colocada na ilegalidade pelo governo espanhol. Pese tais tentativas, a marcha foi um sucesso e, muito por causa da repressão anterior, uma das maiores dos últimos tempos. Dois dias antes, a Guarda Civil espanhola havia invadido os escritórios de oito advogados bascos ligados à EPPK, o coletivo de presos políticos bascos (grupo que representa os interesses dos presos ligados à ETA ou acusados de pertencerem ao grupo tido como terrorista pela Espanha), com a intenção de manter a escalada de intimidações e pressão contra o direito da população de se expressar livremente.

Agora, já em 2015, no último sábado, dia 10 de janeiro, uma nova marcha aconteceu em Bilbao, com mais de 80 mil pessoas exigindo os mesmos direitos negados pela Espanha, denunciando não somente a ausência de mudanças substanciais na maneira com a qual o Estado lida com o povo basco, mas também a continuação da política de repressão e prisões.

Agência Efe
jesuisbasquePolícia efetuou prisões após a realização de marcha em Bilbao

Diferentemente do ano anterior, não houve prisão de advogados bascos antes da marcha — mas, sim, dois dias depois. Na segunda-feira (12/01), a Guarda Civil prendeu 12 advogados bascos e quatro de seus funcionários com a desculpa de “defender o terrorismo” e acrescentando uma novidade: evasão de divisas. Os detidos são acusados de não declarar € 1,3 milhão que teriam recebido na defesa de presos políticos. Curiosamente, esta mesma Guarda Civil foi acusada por Anhoia Etxaide, presidente do sindicato LAB, de invadir a sede da organização para roubar o dinheiro arrecadado durante a manifestação do dia anterior.

A denúncia foi considerada um acinte por destacadas figuras políticas bascas que questionam publicamente os inúmeros casos de corrupção envolvendo o PP (Partido Popular), legenda que governa a Espanha, em toda a estrutura estatal e pelo fato de que muitos dos advogados de presos políticos renunciam a uma carreira onde poderiam ganhar muito dinheiro, para, muitas vezes, trabalhar ganhando pouco ou nada, quase de forma voluntária.

A única mudança perceptível no modus operandi repressivo espanhol foi alterar a ordem das prisões políticas, de antes para depois da manifestação anual em Bilbao.

A reação da cidadania basca e de políticos locais foi imediata: repúdio. Usando hashtags como #JeSuisVasco, #JesuisBasque e #AbokatuakLibre (Advogados livres), tuiteiros bascos e simpatizantes chegaram aos trending topics da Espanha. O líder do partido nacionalista Sortu declarou que era hora de dar um “cheque-mate” na presença da Guarda Civil no País Basco – em referência ao nome dado à ação das autoridades policiais, “Operação Cheque”-, clamando à população que lutem pela independência.

Solidariedade chegou também da Irlanda, de onde líderes do Sinn Fein declararam seu repúdio a mais uma ação repressiva que impede o processo de paz iniciado unilateralmente pela cidadania basca e pela ETA, que vem desarmando seu arsenal e há anos declarou que caminhava para o fim da luta armada.

Até este momento, o governo espanhol não apenas tem se recusado a sentar em uma mesa de negociações, como tem ampliado a repressão, chegando até mesmo a levar à justiça membros do Grupo Internacional de Contato, grupo de especialistas em processos de paz que tem supervisionado a entrega de armas da ETA, para explicar suas ações e exigir que denunciassem a localização dos militantes foragidos da organização armada.

A quantidade de processos políticos contra a população basca chega mesmo a criar casos que seriam engraçados, não fossem trágicos. Na mesma segunda, estava marcado para começar o julgamento de 35 ativistas políticos bascos envolvidos com os partidos políticos ilegalizados ANV e Batasuna, além de membros do partido EHAK-PCTV que mantinha diálogos com as duas formações ilegalizadas, mas o processo teve de ser suspenso, porque seus advogados foram presos durante a manhã. Circula por Bilbao a triste piada de que logo não existirão mais advogados bascos para defender os presos políticos, pois estes serão também presos políticos.

Enquanto milhões de pessoas saíam às ruas na França gritando “Je Suis Charlie” em homenagem ao jornal satírico Charlie Hebdo, após o assassinato de 12 de seus membros e de uma caçada humana contra os supostos responsáveis, grito este repetido também na Espanha, em Madrid, e ressonado por lideranças políticas espanholas, gestava-se mais um ato contra a liberdade de expressão e de organização da população basca.

Fonte: ÓperaMundi.

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