Gorbachov, o que sabemos sobre ele?

gorbachev

Por Marino Boeira.

Entro na livraria e pergunto ao atendente se ele tem alguma coisa sobre Gorbachov.

-É um escritor russo?

Menos mal, o cara pensou num russo, embora tenha errado a atividade do personagem.

Uma vez, perguntei, em outra livraria, sobre Graciliano Ramos.

Como atendente fez uma cara de que eu poderia estar falando grego, resolvi ajudar:

– É o autor de Vidas Secas.

Seu rosto se iluminou, então:

– A estante de livros de autoajuda fica lá no fundo.

Na faculdade de Comunicação da PUCRS, onde fui professor muitos anos, falava que na década de 50, quando a população do Brasil não era nem a metade do que é hoje, a revista O Cruzeiro tirou uma edição de 500 mil exemplares na cobertura da morte de Francisco Alves.

– Quem?

Perguntou um aluno lá do fundo da sala:

– Francisco Alves, o Rei da Voz, o grande cantor brasileiro da época.

Ele disse que nunca tinha ouvido falar. Expliquei que era a década de 1950 no Brasil, antes do advento da televisão, e que sua voz chegava ao País inteiro pelas ondas da Rádio Nacional. O aluno sorriu e me respondeu com desdém:

– Como é que o senhor quer que eu saiba sobre um personagem que viveu em 1950?

Para não perder a viagem, retruquei:

– E Jesus Cristo, você já ouviu falar?
– Claro, respondeu ele meio espantado com a comparação.
– Pois é, Jesus Cristo é um personagem que nem existe certeza que tenha existido mesmo e que, se se for verdadeira sua existência, viveu bem longe do Brasil há quase 2 mil anos.

Certamente não era a melhor comparação que um professor de escola marista poderia fazer, mas como os tempos eram outros, passei incólume por isso.

Agora, voltando ao presente. Estava, quando entrei na livraria, atrás de uma biografia que explicasse como foi possível que esse personagem – Mikhail Gorbachov – pudesse, em tão pouco tempo, liquidar com a primeira tentativa de construção de uma sociedade socialista no mundo, a União Soviética.

Certamente um assunto que interessa a poucos hoje. Um deles, o escritor italiano Luciano Canfora, não faz por menos ao dizer que Gorbachov tramou diretamente com o Cardeal Vojtyla, o Papa João Paulo II, a saída da Polônia da área de influência soviética, primeiro passo para o esboroamento do mundo socialista do Leste europeu.

Acabei levando da livraria o livro O Último Império, do professor de História da Ucrânia, da Universidade de Harvard, Serhii Plokhy.

O início do livro não é muito animador por causa do anticomunismo explícito do escritor. Em todo o caso, alguns indícios nas primeiras páginas mostram até que ponto o espírito dos fundadores da União Soviética de dedicação à criação de uma sociedade socialista foi se pervertendo, na medida em que uma pequena parcela de líderes começou a usufruir de vantagens inatingíveis para a maioria da população.

Só um exemplo: a casa de verão de Gorbachov no mar Negro era uma mansão imensa, construída sobre uma grande rocha, com uma esteira rolante destinada a levar os hóspedes até a beira do mar.

Plokhy concentra os primeiros capítulos da sua narração nos esforços do presidente Bush, pai, em tentar salvar o mandato de Gorbatchov na União Soviética, visto como um reformador moderado, em oposição aos aventureiros como Bóris Iéltsin, a direita, e a linha dura do Partido Comunista, à esquerda.

Mais tarde voltarei ao livro.

Quem sabe exista mais alguém interessado no lançador de duas palavras que foram moda em certa época: perestroika e glasnot.

.oOo.

Marino Boeira é professor universitário.

Fonte: Sul 21.

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