Por Paula Ramón/AFP, Alma Preta Jornalismo.
Pouco antes de completar o primeiro mês à frente do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva reconhece que a realidade ambiental do Brasil é “muito pior” do que o esperado e que, para compensar o tempo perdido e proteger a Amazônia, ela precisará de mais apoio internacional.
Marina vem retomando a rotina do ministério, com “muitas horas de trabalho”.
Mas a ecologista, com quatro décadas de trajetória política, sente-se “agradecida” por voltar ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Ministério do Meio Ambiente, com o qual conquistou feitos históricos para o país no combate ao desmatamento entre 2003 e 2008.
No entanto, ela volta à pasta após o Brasil bater recordes negativos durante o governo de Jair Bolsonaro, que atraiu críticas domésticas e internacionais por defender a exploração comercial e da mineração da Amazônia.
“A realidade é muito pior do que esperávamos, porque tínhamos um apagão”, disse Marina Silva em entrevista à AFP em seu gabinete.
“O esforço não será pequeno, porque o desmantelamento (no Ministério) que tivemos nesses quatro anos foi muito grande”.
“Me preocupa, mas tenho certeza que teremos uma terceira oportunidade”, afirmou.
A ministra garante que o novo governo Lula, com quem já teve divergências no passado, agora “coloca a agenda ambiental no nível mais alto de prioridade. É uma mudança compatível com o que está acontecendo no mundo”.
A manutenção da meta de desmatamento zero até 2030 é um símbolo desse compromisso, garantiu.
“Temos consciência que não será um caminho fácil (…) Mas vamos tentar recuperar o tempo perdido”, completou, em referência aos quatro anos de governo Bolsonaro.
Visão transversal
De concreto, a ministra explicou que o plano de prevenção contra o desmatamento está sendo restabelecido após ser praticamente paralisado durante a gestão Bolsonaro, e que o governo ‘Lula 3’ propõe uma visão transversal, na qual as políticas ambientais serão tratadas por 17 ministérios.
Marina não revelou metas numéricas, mas insistiu que não dará trégua ao desmatamento ilegal e que trabalhará para uma abordagem de alternativas sustentáveis na Amazônia. “Queremos levar ao convencimento de que não é um bom negócio destruir a floresta”.
“Vamos investir em biotecnologia, turismo, agricultura de baixo carbono e outras fontes de geração de receitas”, disse.
“Nossa meta é que com esse trabalho conjunto, possamos contribuir para retomar o controle das ações de prevenção e combate ao desmatamento, e trabalhar na ordenação territorial”.
Nesse sentido, Marina explicou que a maior parte do desmatamento acontece em terras públicas e em espaços demarcados como unidades de conservação e terras indígenas. Para lidar com esse problema, novas unidades de conservação e terras indígenas devem ser anunciadas entre as medidas dos primeiros cem dias de governo.
A ministra mostrou-se cautelosa em suas palavras e esclareceu que não promete um Brasil sustentável em quatro anos de governo.
“Faremos o possível em um curto espaço de tempo. Somente governos populistas podem dizer que resolvem problemas dessa magnitude em quatro anos”, afirmou.
“Esperamos chegar à COP30 em 2025 como um país que está fazendo o dever de casa”, disse, em alusão à conferência da ONU sobre o clima.
Voto de confiança
Marina Silva, de 64 anos, participou do Fórum de Davos, seu primeiro como ministra, no qual disse ter recebido uma recepção calorosa.
“A gente sente que o Brasil está de volta (…) Foi como uma extensão da recepção à eleição do presidente Lula. Essa extensão se dá pelo que fizemos. Conseguimos reduzir o desmatamento em 83% por quase uma década (durante os dois primeiros mandatos de Lula)”.
Estas marcas, segundo Marina, lhe permitem iniciar sua gestão à frente do Ministério do Meio Ambiente e Mudança Climática com um voto de confiança internacional para as ambiciosas metas do Brasil. “Mas sabemos que, daqui para frente, precisaremos ganhar a confiança para o que vamos fazer”.
Mas, para Marina, o Brasil não pode fazer milagres sem ajuda internacional.
Na questão econômica, ela elogiou a reativação e ampliação do Fundo Amazônia, cujos principais doadores são Alemanha e Noruega e que esteve paralisado durante parte do governo Bolsonaro por divergências sobre o destino dos recursos.
“Estamos conversando com o Reino Unido, França, Espanha, com todos os países para que tragam recursos ao Fundo Amazônia. Não queremos que seja somente Alemanha e Noruega”.
Além de governos, a ministra afirma que as conversas avançam com empresas e filantropos.
Mas Marina espera mais do que recursos.
“Essa colaboração com os países desenvolvidos, que seja também de abertura dos mercados para nossos produtos sustentáveis (…) Que o que se produz de forma legal possa ser fonte de geração de receita, porque a Amazônia tem 25 milhões de pessoas”.
“Temos o grande desafio de passar para um modelo sustentável de desenvolvimento, que garante que essas pessoas possam viver com dignidade”, acrescentou a ministra, destacando também que o compromisso contra a comercialização do ouro e madeira ilegal precisa ser multilateral.
Ela também espera aportes em outras frentes.
“Se os países desenvolvidos não diminuírem suas emissões de dióxido de carbono, a Amazônia será destruída da mesma maneira”, advertiu.