Do auto-ódio ao “que se dane, padrões”

Descrição: Desenho de uma silhueta feminina em branco com pontilhados para recortar contornando. Ela está sentada em uma cadeira preta. Fim da descrição. Imagem de Stephen Wood

Por Manoella Back.

Você já sentiu ódio de si? Pois este é algo que nos acomete/ acometeu por diversas vezes. Consciente ou inconscientemente. Muitas delas por não corresponder aos sinais fenotípicos ou normalizados por uma sociedade de padrão europeu e sem quaisquer limitações de bom senso.

“Ahhh, mas Manu, todos nós já nos odiamos e blá, blá”… ZZZzzz

Sim, mas somos indesejáveis em algum momento de nossas vidas como naquela escola tida como “de valores” ou “inclusivas” quando colegas e professores são excludentes em suas aulas.

Somos indesejáveis quando empresa “X” te limita aos cargos menos valorizados ou teus colegas te colocam para fazer trabalhos mecânicos e que “não precisam pensar” – sim, eu já ouvi isso! – mesmo sabendo dos seus quereres e capacidades.

Há aqueles que, não importa o teu esforço, não te reconhecem porque meritocracia é coisa para gente reacionária ver e história para boi dormir.

E aquele boy/ girl mega progressista que diz que te ama, te admira (ahaaam, seeeei!) mas que não te assume? Isso é porque você é defiça, meu bem! Isso e mais o auto ódio.

Porque as pernas não se mexem. Ou não se mexem como deveria. Ou porque você não ouve. Não enxerga como “dizem ser para enxergar”. Por causa da ausência de muitas políticas públicas. Por causa de uma mídia que não te representa ou faz uso de humoristas racistas e capacitistas em trabalhos duvidosos e desumanos.

Ou quem não lembra dos anões do Pânico na TV?

Preconceitos e afetos velados.

Nosso discurso no espaço privado e micropolítico é silenciado. Quando se é mulher e tem deficiência, nem se fala. Porém, quando você consegue ter força o suficiente para fazer com que sua voz ultrapasse algumas fronteiras receberás aplausos de quem te criticou. Participarás de mesas com educadores ou artistas em que as palavras construção, liberdade de criação, subverter, acolher, respeitar e libertar serão constantes mas, ao atingir, as questões da deficiências, estas mesmas palavras se transformarão em “problema” ao tocar o tema da deficiência ou suas experiências são surrupiadas sem dó, nem piedade. Ou seja, aceitação e inclusão até a página 7.

De novo, nós, submetidas e submetidos às relações de poder normatizadas. Há quem diga constantemente que somos tímidos ou nos pintem “sem querer querendo” como “dóceis”. Mas é a história. De subjugação. É o silenciamento que nos faz estar ou deixar de estar em determinados espaços.

Levantar estas questionamentos me recorda uma passagem de Simone de Beauvoir em O Segundo Sexo em que aponta que “somente as que têm um credo político, que militam em sindicatos, que confiam no futuro, podem dar um sentido ético às ingratas fadigas cotidianas.”  Puxo esta afirmação aos desafios de pessoas com deficiência e minorias para que se promova o poder de questionar o que mundo nos oferta.

Para quem leu ou releu até aqui, sinto desapontar. Os que nos leem com mais frequência por aqui sabem que somos mega bem humorados, mas desta vez, aquelas palavrinhas que podem te deixam com borboletas no estômago não vão rolar. Auto ódio não é brincadeira: são nossas autoestimas e formas de olhar, rir e viver a vida em jogo. Não tenho uma pílula mágica sobre como lidar com o auto ódio. Eu só encontro palavras como imposição e enfrentamento. Em tudo. Para todos.

Há quem me acuse de ressentida ou atribua adjetivos do tipo. Mas quero crer num processo de construção intelectual/ cognitiva em conjunto. Empatia, pode ser, mas só para facilitar o rolê porque ela ainda é uma palavra bonitinha-da-malandragem.

Não tenho respostas porém, faço perguntas: é fácil não nos ressentir frente às atuais conjunturas sociopolíticas que deficientes, mulheres e outras minorias vivem? O que esperar de famílias, amigos, relacionamentos ou governos além do que está [im]posto? O campo dos comentários está aí para que vocês reflitam comigo. Quero é fumacinha saindo de nossas cabeças de tanto pensar. Vem comigo?

 


Manoella Back é jornalista, especialista em Cultura & Literatura, aquariana-louca-da-astrologia, fã de Harry Potter, samba, teatro, cerveja e MPB. Luta por um mundo melhor por meio da justiça, direitos humanos e promoção da igualdade.

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