Desmembrando a crise no Sri Lanka. Por Doni Ribeiro.

Os protestos no Sri Lanka tomaram a atenção do mundo todo nas últimas semanas, principalmente com a tomada do palácio presidencial por parte dos manifestantes envolvidos nesses eventos. Pois bem, a raiz do que está acontecendo no Sri Lanka é bem mais grossa e profunda do que muitos tentam apresentar, seja como uma autêntica revolução popular, ou como a mídia ocidental decidiu colocar; uma indignação coletiva causada pela aproximação econômica do país com a China, ou então, um desdobramento dos acontecimentos relacionados a guerra na Ucrânia e a Rússia. Todas essas semi-narrativas de caráter desonesto já foram desmentidas no artigo anterior que falei brevemente sobre o caso cingalês sem entrar em maiores detalhes.

Para começar a entrar no tema, vale a pena deixar claro que os protestos já estão ocorrendo há algum tempo, por exemplo, Mahinda Rajapaksa, o primeiro-ministro cingalês, foi forçado a renunciar em 9 de maio a fim de acalmar os tumultos. Pode-se dizer que o começo dos protestos foi em março deste ano (2022), tendo vindo a eclodir justamente após a crise política no Paquistão que resultou na saída de Imram Khan do posto de primeiro-ministro após uma conspiração golpista apoiado pelo atlantismo. Como podemos ver, esses protestos e crises políticas na região seguem todos uma estrada geopolítica.

Eu particularmente já tinha em mente que o Sri Lanka sob o governo de Rajapaksa e seu partido seriam o próximo alvo de uma crise política na região, isso porque o país sempre fora cobiçado por ser uma parte vital da iniciativa chinesa da Nova Rota da Seda e sua posição estratégica. Era uma questão de tempo até que o país se tornasse um dos principais focos de uma “primavera” que vem desde 2020 ocorrendo no Subcontinente indiano contra governos alinhados a China, tendo a primeira vítima sido o Nepal. Essa primavera no Subcontinente faz parte da estratégia mais ampla da unipolaridade atlantista na região do Indo-Pacífico para impedir a transição global para a multipolaridade, e apesar de ser encabeçado pelo Ocidente, vem contando com apoio decisivo da Índia devido à aversão dessa a China.

O quadro geral dos protestos incluídos nessa primavera específica são os tradicionais, queixas contra a corrupção, má gestão que resulta na queda dos padrões de vida e assim por diante. A questão ao analisar todo este cenário volta a ser a velha história do imperialismo, porque sim, não importa o quanto tentem ignorar ou dizer que não, o imperialismo é a contradição primária. Os países alvos dessa primavera só estão sendo alvos devido a seus governos optarem por uma política externa independente de colaboração e desenvolvimento mútuo com a China, não existe horizonte onde uma verdadeira revolução popular possa ocorrer nesse cenário.

Os objetivos dessa primavera caem em justamente desalinhar esses países em relação a sua atual política externa, é um ataque vil a soberania desses. Entre os milhares de problemas que tais governos possam ter, temos que ver a situação por meio de contradições primárias e secundárias. O imperialismo jamais vai colocar no poder um governo que vá solucionar tais problemas, pelo contrário, os governos que emergem de revoluções coloridas sempre fazem as coisas ficarem muito piores.

O que é mais interessante ainda é que os protestos no Sri Lanka tiveram início uma semana depois de Victoria Nuland, a Subsecretária de Estado para Assuntos Políticos dos EUA, ter visitado o país ainda em março. Quando escutamos o nome dessa sujeita, apelidada de “bruxa da Maidan” devido a sua ativa participação na crise ucraniana, devemos ter em mente uma coisa; por onde ela passa, coisa terríveis acontecem, seja na Ucrânia, na Líbia, no Sri Lanka, e até mesmo no Brasil. Não vamos nos esquecer que tal figura nefasta esteve aqui em abril, e bastou a visita desta para que Jair Bolsonaro intensificasse de uma vez por todas a privatização e venda do que restou do nosso patrimônio público para fundos atlantistas de ativos internacionais como a BlackRock, sendo o que aconteceu com a Eletrobrás um exemplo disso.

Com esse contexto em mente, é aquilo que disse antes, a crise política cingalesa era esperada e teve início certeiramente após os eventos no Paquistão. Acontece que nesse caso, foram poucos os que fizeram tal associação no mundo das análises geopolíticas. Por exemplo, aqui no Brasil, o PCO, que costuma se diferenciar de seus renegados irmãos trotskistas do PSOL e PSTU em relação à política externa, acabou por taxar a crise política no Sri Lanka como uma “revolução popular”, e o presidente cingalês, Gotabaya Rajapaksa, como um “herói do imperialismo”.

Tal postura chega a estranhar um pouco, pois diferente dos morenistas, notórios por seu desgostoso apoio a revoluções coloridas por meio de uma retórica anárquica em relação a tumultos, o PCO costuma identificar os dedos do imperialismo por detrás da maioria de eventos desse tipo, o que inclusive faz com que esse seja atacado por parte da camarilha da esquerda atlantista. Mas como estamos vendo aqui, não foi o caso dessa vez. Todos os trotskistas decidiram se unir ao redor da bandeira da “revolução popular cingalesa” e abraçar os movimentos do imperialismo na região.

Esse papo de “revolução popular” no Sri Lanka é de maneira geral muito comum entre uma parcela específica dos ditos “anti-imperialistas” que definem suas posições a partir de uma retórica supostamente “não alinhada” que geralmente se cobre de um terceiro mundismo furado e um moralismo quase que calvinista em relação ao sofrimento na terra, chegando a beirar o niilismo. Mahmoud Ahmadinejad, o ex-presidente iraniano, é um exemplo desse anti-imperialismo não alinhado que basicamente separa o mundo entre superpotências opressoras e países em desenvolvimento oprimidos, sendo os EUA, China e Rússia tudo farinha do mesmo saco.

Para os que pensam de tal maneira, não existe um dualismo entre forças hegemônicas e contra hegemônicas, existe apenas essa espécie de realismo liberal que leva a uma terceira via idealista e anárquica que nunca vai existir. São esses indivíduos (no caso mais a esquerda) que promovem a conversa fiada de que o conflito na Ucrânia é uma guerra entre nações imperialistas, negando assim a posição contra hegemônica das forças da Eurásia e do Oriente do mesmo jeito que os anarquistas negam o partido. Logo, a única coisa que acaba tendo valor para essa gente é um imediatismo de ações políticas locais sem qualquer visão geopolítica.

Interferência externa na agitação interna

Voltando ao Sri Lanka, diplomatas ocidentais estacionados no país abertamente endossaram os protestos e encorajaram o governo do país a não intervir, tendo a embaixadora estadunidense no país, Julie Chung, se tornado uma das figuras que mais tinha o que comentar a respeito dos protestos, tendo inclusive assumido a posição de mediadora destes. Agora como que uma embaixadora de outro país simplesmente se torna a mediadora de uma questão política interna de um país soberano tão distante do seu? Não me lembro dos embaixadores da China e da Rússia aqui no Brasil ficarem palpitando ativamente a respeito de nossa política.

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Traduzindo: “À medida que as linhas de gasolina e os cortes de energia aumentam, as tensões também aumentam naturalmente. Mas se ferver [de raiva] não atenderá às necessidades urgentes do Sri Lanka. Exorto as autoridades a exercerem moderação nestas circunstâncias difíceis. Qualquer uso excessivo de força deve ser investigado rapidamente.”

Internacionalizar um problema interno local abre portas para a calamidade, isso automaticamente faz com que a situação se torne mais vulnerável. Mas isso que está acontecendo no Sri Lanka nunca foi um problema interno para início de conversa, não existe conflito político interno no século 21, todo evento político é um evento geopolítico. O desenvolvimento político da crise do país nos mostra isso, diplomatas ocidentais no entanto não apenas comentaram sobre os protestos em si, estes têm incentivado reformas na constituição cingalesa, tal como na economia e estão pedindo ativamente mais “diversidade” e “representação” na política do país, enquanto conduzem ditos workshops para formar futuros “líderes” para a nação do Subcontinente indiano.

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Traduzindo: A igualdade de acesso à justiça é fundamental para a estabilidade econômica. Em apoio aos esforços do Ministério da Justiça para garantir o Estado de Direito, a USAID no Sri Lanka se comprometeu com $15 milhões para fornecer treinamento, modernizar equipamentos e ajudar mais mulheres a desempenhar um papel ativo no sistema legal do Sri Lanka.

Como podemos ver, se utilizam das contradições existentes na sociedade cingalesa a fim de atacar a soberania do país. Ainda que nesse caso, quem são os EUA para promover “igualdade de gênero” no país que teve a primeira mulher primeira-ministra do mundo? Lembrando aqui da senhora Sirimavo Bandaranaike, uma aliada próxima da União Soviética e da China que desempenhou um papel vital na descolonização do Sri Lanka após a independência. Devemos primeiro nos “desnortear” antes de achar que um país como os EUA fazendo isso é algo que passa próximo do normal ou aceitável.

E eu não estou aqui para dizer que não existem problemas relacionados ao racismo, discriminação de gênero e assim por diante no Sri Lanka, pois é aqui que entra uma questão fundamental; se os cingaleses não possuem a capacidade de reproduzir posições progressivas a respeito dessas pautas fora das asas do atlantismo, é porque como um todo a legitimidade dessas pautas é questionável, e logo jamais vão fundamentalmente serem aceitas. Por isso, qualquer ato de tal natureza não passa de uma agressão imperialista contra a sociedade cívica cingalesa.

Muitas pessoas não estão realmente cientes de como protestos acontecem no século 21, muitas ainda pensam que protestos de grandes proporções acontecem simplesmente porque as pessoas decidem espontaneamente fazer um levante. Pois bem, os protestos que se originam organicamente, são quase que um milagre. Nestes momentos milagrosos há uma reunião espontânea do povo e quase imediatamente a formação orgânica de grupos e lideranças para organizar as demandas. Esses são bons protestos independentemente de onde aconteçam, pois expressam um reflexo sincero das massas de alguma forma, concordando com esses ou não, deve se reconhecer que existe alguma legitimidade nestes.

Mas indo aos fatos, é muito raro que protestos aconteçam desta forma. Protestos são quase sempre organizados antes das grandes marchas, logo, a pergunta que devemos fazer em um caso como esse do Sri Lanka é; há algum grupo ou indivíduo por detrás da organização desses protestos que esteja por acaso ligado ao imperialismo ou não?

E aqui vou apresentar os fatos, os protestos foram organizados por ONGs locais financiadas pela USAID, tendo as manifestações sido promovidas por funcionários de think tanks e influenciadores liberais. As vozes mais proeminentes foram justamente de liberais da alta e média classe urbana, o que não é nenhuma surpresa quando vemos que os organizou. Os protestos não ocorreram devido a frustrações frente as relações do governo cingalês com o fundos de capitais ocidentais, que são os verdadeiros responsáveis pela crise e dívida do Sri Lanka como demonstrei no artigo anterior, mas sim pelo governo ter justamente escolhido a China ao invés do FMI quando teve a chance. Os manifestantes abertamente exigiam maior liberalização da economia e que mais privatizações acontecessem.

A retórica dos protestos não é direcionada contra o estabelecimento político e suas inclinações liberais, muito semelhantes aos protestos que se desenvolveram em 2013 no Brasil contra o governo Dilma. O foco é somente contra o governo e a corrupção na forma de uma causa etérea. No fim, a grande agonia dos manifestantes está nas relações que o governo cingalês primariamente mantém com a China, a questão de um jeito ou de outra leva a geopolítica.

As mais proeminentes vozes e lideranças dos protestos foram convidados a conhecer diplomatas ocidentais, e obviamente foram ao encontro destes, o que não é nenhuma coincidência tendo em mente o papel que a embaixadora dos EUA vinha exercendo na crise política. Algumas dessas importantes personalidades dos protestos vivem em países ocidentais e usaram as redes sociais para organizar as manifestações, enquanto algumas outras acabaram recebendo “treinamento jornalístico” em outros países por organizações desconhecidas. E que acredito eu não devem ser tão desconhecidas assim, sabendo que $500 milhões foi a soma de dinheiro que o congresso dos EUA planejava alocar para produzir cobertura de notícias negativas sobre a China ao redor do mundo em um projeto de lei que fora inserido no America COMPETES Act, projeto esse que acabou por ser aprovado pela Câmara dos Deputados no início de fevereiro.

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Traduzindo: Influenciadores de mídia social, blogueiros e outros comentaristas online desempenham um papel importante no compartilhamento de notícias e na formação da opinião pública. Ótimo bate-papo com esses criadores digitais do Sri Lanka sobre combater a desinformação e promover reportagens verdadeiras para manter os cidadãos do Sri Lanka engajados e informados.

Agora vamos dar uma olhada mais profunda a respeito desses influenciadores e seu conteúdo e entender como a USAID está financiando e treinando um império de mídia atlantista online no Sri Lanka. Entre o principal veículo de propagação do ideário do atlantismo por parte desses influenciadores liberais, se encontra a Roar Media, que conta com 1,2 milhão de visitantes em seu site e 10,9 milhões em alcance social. De acordo com o próprio site da Roar Media, alguns de seus investidores são a IREX e o Google News:

A IREX para quem não sabe é mais uma dessas escolas de doutrinação atlantistas que trabalham em mais de 100 países a fim de consolidar o poder brando do imperialismo ou promover mudanças de regime. Como foi dito antes, não é coincidência que esses influenciadores tenham recebido “treinamento jornalístico” de “organizações desconhecidas”. Pois bem, elas não são desconhecidas, são, na verdade muito bem conhecidas, são todas elas partes da velha fraternidade atlantista por detrás de qualquer tentativa de mudança de regime:

Open Society Foundations de George Soros, Ford Foundation, Departamentos de Estado dos EUA e Canadá, Millennium Challenge Corporation (com o intuito de fazer frente a iniciativa chinesa da Nova Rota da Seda na Europa, Ásia e Oceania, incluindo aí o Sri Lanka), e claro a USAID. E quando eu digo que as “organizações desconhecidas” por detrás do treinamento jornalístico para essa rede de oposição atlantista no Sri Lanka não são desconhecidas, é porque realmente não são. Basta dar uma navegada pelo site da IREX que já encontramos um programa de treinamento jornalístico no Sri Lanka chamado MEND, apoiado pela USAID, que a Roar Media, segundo seu próprio site, recebeu financiamento.

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Agora que a gente já sabe quem tá por trás da Roar Media e comapnhia, só para ter certeza, vamos ver que tipo de conteúdo eles andam publicando. Já logo de cara podemos encontrar esse artigo intitulado “Um Cinturão, Uma Estrada, Uma China?” na tradução, onde alegam falsamente que o arrendamento do Porto de Hambantota foi uma troca de dívida e capital:

Por que a China está sendo tão legal conosco?

A China está de olho no Porto de Hambantota há algum tempo, dada a sua localização estratégica com vista para o Oceano Índico. O porto sul será uma parada importante em sua ambiciosa iniciativa Um Cinturão Uma Rota – também conhecida como Rota da Seda do Século 21 – que visa ligar a China continental a grande parte da Ásia, Europa e partes da África. Os críticos chamaram isso de parte da diplomacia agressiva da armadilha da dívida da China, na qual Pequim supostamente engana as nações mais pobres a aceitar empréstimos maciços para financiar projetos que esses países poderiam
nunca pagar por conta própria, eventualmente intervindo para “resgatá-los” da inevitável armadilha da dívida em troca de uma posição geopolítica firme em um local estrategicamente importante.

O Sri Lanka tomou grandes empréstimos da China para financiar vários projetos de desenvolvimento em larga escala após o fim da guerra em 2009. O país tem lutado para pagar esses empréstimos desde então e, em desespero, o novo governo teve que concordar com uma troca de ações com a China, com este último inicialmente negociando uma participação de 80% no Porto de Hambantota em troca de essencialmente esquecer parte da dívida – um alívio muito necessário.

Como fica bem visível, eles cumprem a tarefa de repetir com precisão a cartilha de quem lhes dá dinheiro. Outra informação interessante é a respeito da editora-chefe da Roar Media, Roel Raymond, que desempenhou um papel crucial nos protestos pedindo por mudança de regime do Sri Lanka, usando sua presença no Twitter para apoiar e reunir multidões contra o governo. E para deixar bem claro mais uma vez que não há nada de desconhecido em quem está por trás do financiamento e treinamento de pessoas como Roel Raymond, temos ela aqui, segunda a esquerda, posando junto com a equipe da IREX financiada pela USAID na imagem abaixo:

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Quase 2 meses após os primeiros tumultos no Sri Lanka que levaram o primeiro-ministro Mahinda Rajapaksa a deixar o cargo, Roel Raymond foi convidado a conhecer a embaixadora dos EUA.

E a associação dos protestos com o atlantismo não para, ainda mais se formos analisar a forma como estes se expressam nas ruas. Como por exemplo, o fato de muitos manifestantes usarem cartazes em inglês ou até mesmo fazerem discursos em tal língua, sendo que o Sri Lanka ocupa o 82º lugar de 112 países no índice de proficiência no inglês. Exemplos abaixo:

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Esse em especial dispensa comentários.

Tal fenômeno está se tornando uma marca registrado de revoluções coloridas no continente asiático. Tendo sido igualmente visto no Mianmar ano passado, país que por sua vez ocupa o 93º lugar no índice anteriormente mencionado, mas foi popularizado em Hong Kong durante o show de horrores que teve início na cidade em 2019. Lembrando que por mais que a cidade tenha sido uma colônia britânica no passado, são poucos os que realmente possuem alta proficiência na língua inglesa, tendo a cidade ficado abaixo de São Paulo, Hanói e até mesmo Xangai ao nível de proficiência média.

E para fechar com chave de ouro, temos essa foto de um combatente cingalês na Ucrânia mostrando seu apoio a revolução colorida no país:

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Tal cena chega a provocar náuseas. O que ganha um cingalês ao lutar pela Ucrânia? Como tal ato ajuda o seu país de origem de alguma forma? A imagem de maneira geral é bem representativa, podemos ver atrás os mestres europeus de pé, e seu servo terceiro-mundista ajoelhado de maneira degradante, tudo que falta para tornar a foto ainda mais icônica é um chicote. Esse sentimento de inferioridade subconsciente e auto degradação típico de Uncle Toms que pendura na Ásia como resquício do colonialismo ocidental é (como no caso de qualquer revolução colorida) de maneira bem evidente uma das engrenagens do motor dos protestos.

O que está por trás da interferência?

Mas afinal, porque um interesse tão grande do imperialismo atlantista e todo seu aparato no Sri Lanka? Pois bem, anteriormente falamos sobre a primavera promovida no Subcontinente indiano a fim de afastar a China da região, mas falando especificamente do Sri Lanka agora, vejamos o que este realmente representa para o Ocidente no tabuleiro geopolítico de acordo com esse artigo de 2019 da Asia Times:

O Oceano Índico é hoje uma das regiões mais disputadas do mundo. China, EUA e Índia, e também Japão e Arábia Saudita entre outros estados ricos e poderosos, estão lutando por influência sobre o Sri Lanka, que fica no coração geográfico do Oceano Índico. As rotas marítimas do Oceano Índico são consideradas as mais movimentadas do mundo, com mais de 80% do comércio marítimo global de petróleo passando por elas.

O Sri Lanka é participante da Iniciativa do Cinturão Marítimo e da Rota da Seda, a extensa rede de portos e instalações marítimas da China que conectam os oceanos Pacífico e Índico…

Para reduzir a expansão chinesa na Ásia, os EUA estão transformando o Sri Lanka estrategicamente localizado em um “centro de logística militar” e o centro de sua “Política de Região Indo-Pacífico Livre e Aberta”. Além disso, a aliança EUA-Japão-Austrália-Índia está procurando envolver o Sri Lanka no desafio chinês.

O controle do Sri Lanka tornou-se mais urgente para os EUA desde que a Corte Internacional de Justiça (CIJ) decidiu em fevereiro que a ocupação estadunidense das Ilhas Chagos no Oceano Índico é ilegal e as ilhas devem ser devolvidas à Maurícia “o mais rápido possível”. A base militar Diego Garcia foi estabelecida depois que a Grã-Bretanha, a “dona” das Ilhas Chagos, removeu à força seus habitantes entre 1968 e 1973. Diego Garcia é uma das bases militares mais importantes e secretas dos EUA. Tem sido central no lançamento de invasões ao Iraque e ao Afeganistão e também em missões aéreas em toda a Ásia, inclusive no Mar da China Meridional. Se as ilhas voltarem para Maurícia e os chagossianos que processaram seu direito de retorno forem autorizados a voltar, os EUA exigirão uma base alternativa. Essa poderia ser o Sri Lanka.

Acima de tudo, é a posição do Sri Lanka na Nova Rota da Seda come mencionado no começo do artigo que incomoda profundamente o atlantismo, que tem como planos transformar a nação insular em nada mais que uma base militar, do mesmo jeito que este fizera com a porção sul da Coreia. Vemos que não é de hoje que os EUA têm problemas com o governo cingalês. As inconveniências vêm desde o fim da guerra civil no país, sendo o ex-primeiro-ministro, Mahinda Rajapaksa, forçado a reunciar, uma das maiores pedras no sapato dos interesses do atlantismo no país:

Em janeiro de 2015, um governo do Sri Lanka apoiado pelos EUA substituiu o antigo governo de Mahinda Rajapaksa que derrotou os Tigres de Libertação de Tamil Eelam. Logo depois, o novo governo e os EUA co-patrocinaram uma Resolução do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas em Genebra. Exigindo responsabilização por supostos crimes de guerra e pessoas desaparecidas na fase final da guerra contra o TLTE, a Resolução do CDHNU pressionou o governo do Sri Lanka a fazer mudanças significativas, incluindo a demissão e prisão de seus oficiais de inteligência e funcionários do exército. Essas medidas enfraqueceram a inteligência e a segurança do Sri Lanka, abrindo caminho para a carnificina do domingo de Páscoa por terroristas islamistas.

Os ataques da Páscoa estão agora a serem usados ??para justificar a aceleração da intervenção dos EUA no Sri Lanka, que já vinha aumentando nos últimos anos. No entanto, os três principais acordos bilaterais que os EUA implantaram para afirmar seu controle político, econômico e militar sobre o Sri Lanka – MCC, ACSA e SOFA – estão enfrentando uma oposição local massiva.

Mais informações a respeito da mudança de regime promovida pelos EUA contra o Sri Lanka sob o governo Rajapaksa ainda em 2015 foi dada neste artigo. Logo fica bem claro quais são os interesses do imperialismo no Sri Lanka, primeiro é travar a iniciativa da Nova Rota da Seda orquestrada pela China, e segundo transformar a nação asiática em uma grande base militar estadunidense da maneira mais degradante e humilhante possível em sua cruzada errante contra a China na região do Indo-Pacífico, que até tudo indica, se depender da unipolaridade atlantista, vai acabar em uma guerra sem precedentes históricos.

É disso que tudo se trata, por isso é importante termos noção das consequências de toda essa movimentação e caos político que vem se dando no Sri Lanka ao invés de sairmos em apoio de eventos no outro lado do mundo que sequer entendemos de maneira objetiva se não por espantalhos criados pela mídia do império.

Agora que já temos o contexto geopolítico e de intromissão estrangeira, vamos às raízes internas da atual crise do Sri Lanka, que deram contexto para que a revolução colorida pudesse acontecer. É claro que existem queixas legítimas sendo levantadas no meio dessa crise, assim como em toda o processo de revolução colorida, o problema cai justamente na forma como elas são conduzidas; quase sempre de maneira unânime pelas forças do atlantismo, que geralmente estão por trás de sua criação como bem vamos ver agora.

Grande parte da origem da crise cingalesa está na devastação que o setor agrícola tem experimentado, as baixas nas colheitas estão em taxas recordes na história de todo o país. Mas por quê? Vamos agora então entender de fato quais são as verdadeiras origens dessa crise, além do esmagador endividamento com o Ocidente que o país acabou por se meter.

Pois bem, crises como essa no Sri Lanka é o que acontece quando as ditas “políticas de decrescimento” são implementadas. O ‘”colapso” que está acontecendo é uma demolição planejada, e deve servir como caso de estudo para o que a classe dominante e o imperialismo pretendem fazer com o resto do mundo. Leva então menos de um minuto de pesquisa sobre o tema para puxar o nome de uma sujeita chamada Vandana Shiva, e por consequência seu papel no desastroso movimento orgânico e colapso da economia cingalesa.

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Shiva em 2012

Foi a conselho de Shiva, uma ambientalista indiana, que o presidente Gotabaya Rajapaksa (irmão do ex-primeiro-ministro e ex-presidente Mahinda Rajapaksa já citado aqui antes) tomou a decisão de proibir os fertilizantes químicos em 2021, tendo essa decisão sido parte de uma política nacional que visava mudar da agricultura tradicional para a orgânica ou biológica, que é reconhecida como uma das maiores razões por detrás do desencadeamento da crise. Shiva é conhecida por seu ativismo incendiário contra o agrarianismo moderno, recebendo muitos prêmios, mas também muitas críticas. Foi sua organização Navdanya International que assessorou o governo do Sri Lanka, uma conquista que ela orgulhosamente exibiu em seu blog.

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Traduzindo: O Sri Lanka já baniu todos os produtos químicos e anunciou uma transição para um país 100% orgânico. Vamos todos dar as mãos ao Sri Lanka, os suíços e a todas as comunidades dando passos em direção a um mundo livre de cartéis venenosos para a saúde nossa e do planeta.
Tuíte de Shiva a respeito do referendo suíço acerca da proibição do uso de agrotóxicos que ocorreu ano passado, que não fora aprovado pelo povo do país.

Enquanto ambientalistas e ativistas agrícolas anti-modernos como Shiva fazem lobby pela agricultura orgânica citando seus benefícios para o meio ambiente, pesquisas mostram que a agricultura orgânica não é tão ecológica quanto alega ser. Na verdade, evidências científicas sugerem que pode destruir ainda mais o ecossistema. Alguns também dizem que a agricultura orgânica não é tão orgânica quanto parece, não é segredo que alguns agrotóxicos orgânicos são mais prejudiciais que os sintéticos. Além disso, os baixos rendimentos significam mais desperdício de água e terras agrícolas.

Além disso, exemplos a respeito da falha na adoção de políticas orgânicas podem ser encontrados na própria Índia, país de origem da ambientalista por detrás da crise no Sri Lanka, exemplo do menor estado do país, o Siquim. Localizado no norte da Índia, nos Himalaias, entre Nepal a sua esquerda e o Butão a sua direita, o Siquim ganhou o título de estado “100% orgânico”. No entanto, apesar dos elogios que recebe, a realidade sombria da história orgânica do estado é que este é dependente da vizinha Bengala Ocidental para sua segurança alimentar, tendo seus rendimentos caído e os agricultores locais ficado insatisfeitos com o governo por não proibirem produtos agrícolas mais baratos de fora do estado em comparação com seus produtos “somente orgânicos”.

A pseudociência de gente como Vandana Shiva está bem documentada, com evidências claras da comunidade científica real tentando detê-la, no entanto, o governo cingalês acabou por escutá-la mesmo assim, o que acabou por custar a segurança alimentar do país com a adoção dessa nova “agenda verde”.

O neurologista estadunidense Steven Novella já havia alertando a respeito das mentiras de Shiva ainda em 2015, tendo a descrito como: “anticorporações, anti-Ocidente e antiglobalização” em sua crítica a pseudociência promovida pela ativista, mas como veremos aqui, Shiva na verdade passa longe de tudo isso. Novella não foi o único a criticá-la, cientistas indianos e cingaleses haviam também feito o mesmo. Porém, o governo de Rajapaksa os recusou a ouvi-los e continuou dando ouvidos a Shiva, que por ser uma superestrela ideológica, não importa o que um consenso da comunidade científica diga, como bem sabemos; se você seguir a linha da classe dominante, sua versão de “ciência” é o que será empurrado para as massas.

Para entender melhor isso tudo, faremos como de costume aqui na RA-A em casos como esse; seguiremos o dinheiro, descobriremos quem está por trás de figuras como Vandana Shiva. Apesar de ela não informar abertamente quem está financeiramente bancando suas atividades, ela ressalta que o financiamento que aceita é “não condicional” e sem requisitos de relatórios aos doadores sobre o uso final dos fundos. Isso porque como vimos anteriormente, não precisa ser condicional, sua função nesse processo é desempenhar um papel destrutivo de desencadeamento de destruição na agricultura de países como o Sri Lanka.

Por mais que Shiva tente trazer um ar de secreto a cerca dessas informações, elas não são nada secretas, nem exigem uma busca profunda para serem reveladas, basta uma pesquisa rápida para descobrirmos que em junho de 2014, tanto a mídia indiana quanto a internacional já trataram de informar isso, tendo Shiva e sua organização Navdanya International sido nomeadas em um relatório confidencial vazado pelo Birô de Inteligência da Índia para o Gabinete do Primeiro-Ministro.

E o que o relatório vazado dizia? Nada mais nada menos que as atividades de ONGs como a Navdanya International estavam dificultando o crescimento e o desenvolvimento da Índia. De acordo com o relatório, ONGs como a de Shiva recebem dinheiro de doadores estrangeiros sob o “traje de caridade” em nome de pautas como defesa dos direitos humanos e igualdade de gênero, mas acabam usando tal financiamento para fins nefastos:

“Esses doadores estrangeiros levam ONGs locais a fornecer relatórios de campo que são usados para construir um registro contra a Índia e servem como ferramentas para os interesses estratégicos de política externa dos governos ocidentais”, afirma o relatório do IB.

De acordo com o Genetic Literacy Project, as campanhas ativistas de Shiva são altamente dependentes de financiamento internacional externo e, portanto, criaram desafios ligados às regras regulatórias de ONGs na Índia somadas às leis nacionais de transações de crédito justas e precisas, que restringem o financiamento externo de ONGs que fomentam a agitação política no país. Ainda de acordo com um dos vários escritórios de palestrantes representando Shiva, sua taxa de palestra (a partir de 2104) é de $40.000 por evento, mais viagem de ida e volta em primeira classe ou viagem de classe executiva da Índia.

Além do mais, Shiva pode não fazer relatórios públicos acerca de seus apoiadores, mas várias organizações que fazem esses relatórios incluem o financiamento a entidades notáveis associadas com a ativista. Incluindo a Ford Foundation, que em 2003 concedeu $118.845 para sua organização Navdanya Trust. Agora fica mais claro o motivo do Birô de Inteligência da Índia estar alertando as autoridades a respeito das atividades de Shiva.

E aqui chegamos a um importante ponto, que é; por mais que seja consenso na comunidade científica que as ideias que Shiva vem promovendo são sinônimos de catástrofes, estas ainda possuem apoio de diversos setores da classe dominante que compõe o eixo do sistema capitalista no Ocidente. Não porque esta é estúpida a ponto de acreditar em tais ideias, mas sim porque servem como instrumento de ataque e enfraquecimento a soberania de países que possam entrar no caminho dos interesses destes.

O raciocínio é simples: como parte do conceito econômico do decrescimento, políticas orgânicas promovidas por ONGs como a de Shiva em países periféricos levam a menos rendimento no setor agrícola, menos rendimento levam a crises alimentares, crises alimentares levam a crises econômicas generalizada como vimos no Sri Lanka, levando assim a circunstâncias de turbulência política maduras para desencadear revoluções coloridas.

Tais políticas levam também a um menor crescimento econômico de países com desenvolvimento tardio de suas forças produtivas, o que permite que os velhos monopólios ocidentais mantenham seu protagonismo mesmo em um período de ameaça a unipolaridade, impedindo assim a prosperidade e o crescimento econômico do resto do mundo. Sem falar que; indo para um lado mais sombrio, desencadeiam também situações que podem levar a fome, que, por mais tenebrosas que possam parecer, estariam ainda de acordo com a natureza das políticas de decrescimento de caráter malthusiano e eugênico que organizações como o Fórum Econômico Mundial (FEM) vem promovendo.

O reconhecimento que políticas em pró da agricultura orgânica no Sri Lanka acabarem em um fracasso catastrófico é consenso em todas as mídias. A nação do sul da Ásia é há muito autossuficiente na produção de arroz, mas devido as políticas implantadas por Rajapaksa ao dar ouvidos a Shiva, o país foi forçado a gastar mais de $450 milhões em importações de arroz, mesmo quando os preços domésticos desse alimento básico subiram cerca de 50%. A safra nacional de chá que representa a principal exportação cingalesa e maior fonte de divisas foi também severamente afetada.

Em novembro do ano passado, o governo cingalês foi forçado a suspender parcialmente a proibição que fez contra fertilizantes químicos nas principais culturas devido ao baixo rendimento. O aumento da inflação e a rápida desvalorização da moeda nacional forçaram os cingaleses a reduzir as compras de alimentos e combustíveis à medida que os preços subiam. O governo teve de oferecer $200 milhões aos agricultores como compensação direta e mais outros 149 milhões em subsídios de preços aos produtores de arroz que sofreram perdas. O buraco da crise só foi ficando cada vez mais profundo.

Toda essa tragédia acontecera antes da operação militar especial que a Rússia comanda na Ucrânia ter início. Diante dessa crise econômica e humana cada vez mais tenebrosa, o governo do Sri Lanka cancelou o experimento nacional mal concebido da agricultura orgânica neste inverno, mas já era tarde demais. Em maio desse ano, o governo foi forçado a admitir que os cultivos da temporada de Yala (período de maio a final de agosto) seriam um fracasso, com uma previsão de 50% de colheita máxima, sendo que o governo não poderia fornecer fertilizante para salvar a temporada e os estoques de arroz do país seriam suficientes somente até setembro.

Toda uma tragédia sem precedentes que culminou em um sofrimento avassalador para o povo do Sri Lanka e em uma revolução colorida como síntese graças a políticas favoráveis a teoria do decrescimento. Não esquecemos do nome por detrás dessa crise toda, Vandana Shiva e seu dito ativismo em defesa do meio ambiente.

As mais profundas motivações da classe dominante por detrás de tudo isso

Como podemos ver, essa sujeita Vandana Shiva, quase que uma Madame Blavatsky do século 21, não simplesmente age por conta própria, existem interesses bem mais profundos por detrás de sua atuação. E é aqui que quero entrar agora, pois pretendo falar a respeito de todo um cartel ideológico extremamente obscuro que se infiltrou na esquerda mundial (não somente na ocidental) de uma maneira bem assustadora.

Pois bem, ouvimos falar o tempo todo a respeito de um “colapso” ecológico que está prestes a acontecer e supostamente é inevitável. Sem ignorar os problemas ambientais realmente existentes, tal “colapso” ecológico que tanto ouvimos falar não será inevitável no sentido literal, mas sim porque está sendo humanamente fabricando para que não seja. Isso porque existe quem esteja tentando preparar um mundo onde o conceito do “decrescimento” econômico será a regra, gostem as pessoas ou não.

E quem está na vanguarda para preparar tal realidade são justamente aqueles por detrás de figuras como Shiva. E quem são essas pessoas? Comecemos pelo cérebro por detrás de tal narrativa, um sujeito chamado Martin Kirk. Esse sujeito, natural do Reino Unido, comandava até pouco tempo atrás antes de assumir um novo projeto que já vou falar a respeito: um movimento de “ativistas descentralizados” chamado The Rules, que faziam campanha em todo o mundo contra a pobreza.

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Kirk em 2014

Kirk é o típico atlantista de “caráter social”, sendo esses justamente os mais tenebrosos, pois costumam frente as contradições que o sistema enfrenta, propor ideias a cerca de uma pós-modernidade de caráter quase que avessa a tudo que a humanidade representa em seu sentido material mais básico a fim de permitir a manutenção deste. Exemplos de ideias desenvolvidas por quem pensa dessa forma inclui o transhumanismo e a teoria do decrescimento econômico que falei antes exemplos.

É importante ressaltar que quando figuras como Kirk tecem críticas ao capitalismo, eles não estão apontando para aquilo que Karl Marx apontara ao criticar tal sistema por exemplo, mas sim para o fenômeno industrialista apenas, sendo o “capitalismo” uma palavra código para o industrialismo. Estes são reacionários por natureza, não acreditam na superação do sistema e em uma nova modernidade pós-capitalista, defendem que na verdade é necessário “recomeçar” sob o comando dessa ordem atlantista unipolar em um novo mundo, onde problemas como a pobreza não sejam uma ameaça generalizada ao poderia desta.

Esse tipo pode também ser encaixado na categoria de para-atlantistas, com uma crítica contra a modernidade de caráter muito semelhante àquela do nazismo. No fim, por meio de pilares fundamentais da doutrina atlantista, tais como o chauvinismo, o idealismo, e até mesmo o ultraesquerdismo como consequência, vive-se nessa negação de encarnar uma consciência geopolítica e identificar na unipolaridade e no imperialismo que levam adiante os destroços do já podre sistema capitalista, o grande problema de tudo aquilo que tanto criticam.

Kirk é um imperialista a níveis de Cecil Rhodes, alguém que carrega consigo o “fardo do homem branco” (anglo-saxão). Um sujeito que se considera tão excepcional que se encontra no direito de fazer suposições a respeito do que é melhor para o resto do mundo por meio de suas próprias conclusões, que se baseiam em: “acabar com a pobreza acabando com os pobres”.

Podemos conferir isso em suas próprias palavras:

No fragmento do vídeo apresentado, Kirk na tradução diz que: “20 anos pensando sobre essas questões, mudanças climáticas e pobreza, me levaram a um limite, e o limite muito importante com o qual eu acho que o mundo está lutando coletivamente agora, que é o desejo desesperado de se manter sendo o que é, e isso desencadeia respostas de medo muito grandes. O que significaria o colapso? Colapso do sistema, colapso da civilização. Então a tarefa não é nos perguntar se queremos mudar para uma economia pós-crescimento, mas nos preparar para isso”.

Agora que já conhecemos Kirk e como este pensa, vamos conhecer o abastado que está disposto a fazer suas ideias chegarem mais perto da realidade, um sujeito de nome Peter Buffett, estadunidense nascido em Nebraska. Para alguns, esse sobrenome pode soar familiar, pois Peter é ninguém menos que o filho do magnata Warren Buffet, o CEO da Berkshire Hathaway, uma das maiores empresas de holding do mundo, que conta com um patrimônio líquido de mais de $98 bilhões em julho de 2022.

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Peter em 2022

Peter, no entanto, diferente do pai, fez carreira como músico e não como investidor, isso até decidir se tornar filantropo e cofundar uma organização conhecida como NoVo Foundation, cuja a missão se dedica a catalisar uma “transformação na sociedade global”. Como podemos imaginar, dinheiro é o que não falta para NoVo Foundation por suas atividades em práticas, o próprio Warren Buffet doou cerca de $2 bilhões para a organização. Agora, adivinhem só quem é o coordenador sênior de projetos especiais da NoVo Foundation?

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Ele mesmo, Martin Kirk. E assim como conferimos as palavras deste, vamos conferir as de Peter:

No fragmento do vídeo apresentado, Peter na tradução diz que: Voltaremos a viver em relação uns com os outros. Com a terra, e com todas as outras espécies do planeta. Temos tudo a ganhar e acho que isso mostra a diferença entre o que nos foi vendido em termos de como seremos felizes, que é através do ganho material, versus o que é verdade, que é como nos sentiremos realizados e com propósito por meio de ganhos relacionamentais em todos os sentidos da palavra.

Os fragmentos de vídeos que vimos acima de ambos Kirk e Peter são oriundos de um projeto do Sterling College, uma faculdade particular focada no dito “pensamento ecológico” localizada em Craftsbury, no estado de Vermont. O vídeo completo pode ser visto aqui. E as coisas começam a se conectar mais ainda quando investigamos mais sobre esse Sterling College, além de Vandana Shiva ter feito o discurso de formatura em uma cerimônia em 2019, descobrimos no próprio site da faculdade que Peter financia todo esse cartel ideológico com sua NoVo Foundation a fim de trazer o mundo que ele e Kirk idealizaram em suas cabeças para a realidade:

Sterling recebe subsídio de US$ 2,5 milhões e desafio de arrecadação de US$ 500.000 da NoVo Foundation
Subsídio para financiar programa de agricultura sustentável sem mensalidades no Kentucky nomeado para Wendell Berry

Craftsbury Common, Vt. — 8 de janeiro de 2019 — Em resposta à crise na agricultura e nas comunidades rurais, Sterling e The Berry Center anunciaram que lançarão de forma colaborativa o Wendell Berry Farming Program of Sterling College no Condado de Henry, no Kentucky, -programa de graduação em agricultura sustentável, inspirado no trabalho de vida e nos escritos do agricultor e ativista ambiental Wendell Berry. A doação e o desafio de US$ 2,5 milhões, uma vez cumpridos, fornecerão um total de US$ 3,5 milhões para a operação do programa até 2024.

E aqui voltamos para Vandana Shiva, a arquiteta da tragédia cingalesa, já vimos antes que organizações como a Ford Foundation estão de trás de suas atividades, mas adivinha qual outra organização está também por de trás do financiamento de sua ONG Navdanya International?

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Mais uma vez repito, o Birô de Inteligência da Índia não estava alertando a toa as autoridades a respeito das atividades desta. E essa ainda é a ponta do iceberg, figuras como Vandana Shiva e Martin Kirk influenciaram também o antropólogo Jason Hickel a escrever um manifesto em defesa das políticas econômicas de decrescimento que virou febre em muitos círculos ecologistas conhecido como: “Menos é mais: como o decrescimento salvará o mundo“. Agora, imaginemos que toda essa fraternidade que compartilha ideias no mínimo duvidosas para não dizer outra coisa, decidissem adotar uma vila para servir de experimento para essas. Pois bem, foi exatamente isso que aconteceu no Sri Lanka, e agora sabemos o que levou a crise no país, e o porquê uma revolução colorida eclodiu.

Em relação a isso tudo, devo deixar claro qual a posição que defendemos aqui na RA-A em relação a todo esse movimento ambiental, vale a pena citar o presidente chinês Xi Jinping, que muito corretamente disse que: “drenar um lago para pescar como modelo de desenvolvimento está chegando ao fim”. Isso significa que devemos buscar por um modelo onde o meio ambiente apoie as pessoas e as pessoas apoiem o meio ambiente, não devemos sacrificar pessoas por causa do meio ambiente, não devemos então em relação ao exemplo dado anteriormente, proibir a pesca.

Devemos defender um meio ambiente limpo não como uma pauta abstrata de cunho quase que 100% moral, mas sim porque ter acesso a água potável por exemplo é uma posição a favor das pessoas, que nos faz bem. Agora, querer desmantelar o modo de vida de diferentes pessoas e comunidades não passa de uma posição idealista e antimaterialista, cuja natureza só pode se esgueirar em nada menos que outra ideologia de caráter semelhante, como claro, o atlantismo.

Conclusão

A crise que o Sri Lanka enfrenta é resultado de um complexo processo que envolve a decadência da unipolaridade por meio de uma densa rede de ideologias aparentemente divergentes que no entanto cooperam em um front final guiado pelo imperialismo sob a estratégia de guerra híbrida, visando a destruição de nações soberanas por meio de polarizações políticas que resultam na destruição dos patrimônios nacionais de países periféricos e como consequência atrasam seus respectivos processos de desenvolvimento de forças produtivas. Sendo dessa forma a manutenção do imperialismo ultramarino de caráter neoliberal pós crise energética dos anos 70 mantida sob funcionamento.

Longe do que a mídia vem tentando apresentar, o único culpado pela crise na ilha do sul da Ásia é o Ocidente; seja por meio de sua política de poder brando e interferência visando favorecer interesses belicosos ligado ao complexo militar, por meio de sua traiçoeira política econômica de endividamento e dependência ditada por distritos financeiros como Wall Street e Cidade de Londres, ou por meio de interesses obscuros de setores específicos da classe dominante que pretendem ser invisíveis, mas como vimos aqui, não são.

No fim, quem sofre são todos os habitantes do planeta, que supostamente estaria sendo representado por certas quadrilhas “ambientalistas” cujo real interesse, consciente ou não, é no fim garantir a sobrevivência a longo prazo dos donos do capital no topo da pirâmide por meio do colapso sistemático das emergentes polaridades opostas ao atlantismo.

A opinião do/a/s autor/a/s não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.

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