Daniel Munduruku: índio não existe

Por André Argolo.

“Índio é um apelido que nos impuseram e que nos afastou da sociedade brasileira.”

O escritor Daniel Munduruku publicou um vídeo este mês convidando a uma reflexão sobre a origem da palavra índio. As raízes desse termo estão impregnadas, segundo ele, de preconceitos e enganos que minimizam a diversidade cultural dos diversos povos indígenas e seus conhecimentos de vida.

“Costumo dizer que é um apelido, que as pessoas consideram que é um defeito, uma infelicidade, pertencer a povos ancestrais, que nada teriam a ver com o mundo moderno. É um engano absoluto.”

Daniel Munduruku é muito conhecido e premiado por suas obras direcionadas a jovens e crianças, com histórias baseadas ou que retratam diversos pontos de vista das culturas indígenas, diferentes entendimentos de mundo e de relações entre as pessoas. Além de escritor, Daniel é formado em Filosofia e é educador. Nessa condição, publicou pela Global Editora o livro O banquete dos deuses, com ensaios sobre educação. Abaixo, um trecho:

“Entre as perguntas que muitos me fazem nas palestras que dou, está a questão da evolução indígena. Por que os índios não evoluíram na mesma proporção das outras sociedades? Por que as sociedades indígenas são atrasadas tecnologicamente? E por aí vai. As respostas a essas perguntas não são tão simples como poderíamos supor. Imaginemos, no entanto, a seguinte pergunta sendo feita por uma criança indígena: Por que os outros homens, de outras sociedades, não têm a mesma evolução que a nossa?

Certamente alguém da sociedade não indígena diria que isso depende do ponto de vista. E está muito certo em agir assim, pois devemos imaginar sempre como o outro se sente quando tem sua organização social questionada. É verdade que em determinados aspectos a sociedade brasileira ou ocidental é mais evoluída que a indígena. Basta pensar na indústria tecnológica com todo seu desenvolvimento, nas máquinas complexas, nos meios de transportes e de comunicação. E a razão desse desenvolvimento é muito simples: acredita-se que seja importante valorizar esse tipo de conhecimento, por isso investe-se pesado nele. Nisso está, também, a busca da felicidade, do bem-estar e da qualidade de vida das pessoas e o domínio da natureza. Ao dominar a natureza, o homem ocidental pensa que pode chegar à felicidade.

No contexto da sociedade indígena, no entanto, a felicidade é posta em outro lugar e os esforços são investidos em outros campos. A natureza não é objeto para ser simplesmente explorado. Nessa atitude de respeito, as sociedades indígenas chegaram a um equilíbrio perfeito, utilizando uma tecnologia que, comparativamente à do Ocidente, é muito simples.

Por outro lado, se considerarmos a qualidade de vida alcançada por essas sociedades – em que ninguém tem mais que o outro e há abundância e menos violência –, notaremos que elas são mais desenvolvidas que a não indígena.”

Trecho do capítulo “Cinco – A sabedoria indígena por dentro”, página 47 do livro O banquete dos deuses (Global Editora).

Fonte: Global Editora. 

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