Congresso consagra a sangria da dívida neste fim de semana. Por Paulo Lindesay.

Imagem: Agência Brasil

Por Paulo Lindesay.

Segundo dados do Painel de Orçamento Federal (SIOP), em pouco mais de 10 anos, entre 2014 e novembro de 2024, os governos federais executaram a título de serviço da Dívida Pública Federal cerca de R$ 15 trilhões, dos quais R$ 2,793 trilhões como juros. A maior parte, porém, no montante de mais de R$ 12,248 trilhões, consistiu no pagamento de amortizações. Pergunta-se como uma economia do tamanho da brasileira consegue suportar uma sangria dessa monta em juros, correção monetária e amortizações, e continuar de pé?

No período considerado, a despeito da gigantesca conta de amortizações, o estoque da Dívida Bruta do Governo Geral, como se vê, aumentou mais de R$ 5,779 trilhões. Como isso pode ter acontecido, se amortizar parte de uma dívida corresponde a pagar parte do principal, ou seja, de seu estoque?

A Lei n.o 4.320/1964, não revogada, definiu quais são as despesas correntes e despesas de capitais. Juros da dívida pública são despesas correntes, e amortização, despesa de capital. Pergunta-se: pode-se emitir título da dívida pública federal para pagar “Juros da Dívida”? Não. O Art. 167, inciso III da Constituição Federal, veda expressamente a realização de operações de créditos que excedam o montante das despesas de capital, ressalvadas as autorizadas mediante créditos suplementares ou especiais com finalidade precisa, aprovados pelo Poder Legislativo por maioria absoluta. Portanto, a única engenharia possível para superar esse obstáculo é transformar parte dos juros devidos em amortização, possibilitando as emissões de títulos públicos. Uma burla constitucional ao Art. 167.

Como podemos observar abaixo, a engenharia da transformação dos juros da dívida em amortização vem de longe. Desmembrando o pagamento das amortizações a partir de subfunçõestem-se uma visão real da burla à chamada Regra de Ouro, contida no Art.167 da Constituição. Nele, constata-se que a amortização da Dívida Pública Federal se divide em cinco subfunções orçamentárias dos Encargos Especiais:

841 – Refinanciamento da Dívida Interna; 842 – Refinanciamento da Dívida Externa;
843 – Serviço da Dívida Interna; 844 – Serviço da Dívida Externa; 846 – Outros Encargos Especiais.

Considerando os pagamentos de parte da amortização consolidada em 2022 (serviços das dívidas interna e externa + outros encargos especiais = R$ 223 bilhões) + juros da Dívida Pública Federal = R$ 247 bilhões + Correção Monetária e Cambial da Dívida Mobiliária, contida nos Encargos Especiais/Refinanciamentos = R$ 352 bilhões), o fundo público federal sofreu uma sangria de aproximadamente R$ 821 bilhões, não considerando o restante do refinanciamento da dívida interna e externa.

Desmembrando os valores pagos, ano após anopode-se observar o quanto o Brasil foi, é e continua sendo uma das principais molas propulsoras do projeto financeiro rentista mundial. A economia brasileira não é uma economia qualquer. Está listada entre as dez maiores do mundojá tendo ocupado o sexto lugar. Por isso, não se admira que atraia a atenção de especuladores e rentistas de todo o planeta, tendo em vista condições excepcionais que lhes são oferecidas pelas políticas fiscais e monetárias internas, sustentadas por um Governo economicamente conservador.

O gráfico abaixo ratifica as informações acima sobre a Dívida Pública Federal no período indicado e nos anteriores. Vê-se uma trajetória de crescimento desenfreado. Tudo garantido no Art. 166, §30, inciso II, alínea “B” da Constituição Federal na legislação aprovada sequencialmente. Desta pode-se destacar duasEmenda Constitucional n95/2016, chamada emenda do fim do mundo, e a Lei Complementar n200/2023o novo arcabouço fiscal. Ambas têm como pilar central a sustentabilidade da Dívida Pública. E não a sustentabilidade da Educação, Saúde, Previdência Social, construção de moradias para famílias de baixa renda, IBGE e outros serviços públicos essenciais.

Observa-se, dessa forma, que o maior problema da política macroeconômica brasileira chama-se Dívida Pública.  Ela impede o crescimento das estruturas de Estado e o avanço na qualidade das políticas públicas.  Na verdade, implica a sua degradação contínua, mediante os sucessivos cortes no orçamento primário discricionário (a parte do orçamento que interessa à população), conforme acaba de ocorrer nas discussões do orçamento para 2025.

Provavelmente, neste fim de semana, o Congresso Nacional de maioria conservadora e retrógrada aprovará a nova Lei Orçamentária Anual – LOA/2025.

Na previsão inicial, a despesa geral da União ultrapassa os R$ 5,699 trilhões. Mas desse total, cerca de R$ 2,529 trilhões ou 44,37% da despesa geral da União serão destinados ao pagamento do Serviço da Dívida Pública Federal. Alguém pode imaginar que uma sangria dessa magnitude possibilitará o crescimento da nação brasileira no próximo ano e nos anos seguintes?

Paulo Lindesay é Diretor da Executiva Nacional da ASSIBGE-SN/Coordenador do Núcleo Sindical Canabarroe Coordenador da Auditoria Cidadã da Dívida Núcleo RJ.

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