A comunidade árabe-brasileira, composta por todos(as) os(as) brasileiros(as) de origem árabe, fora surpreendida ao tomar conhecimento de veiculação em órgão de comunicação nacional acerca de um encontro entre a mesma e o deputado federal Jair Messias Bolsonaro, um dos anunciados pré-candidatos à Presidência da República, o qual ocorreria em Foz do Iguaçu no próximo dia 28. Não fossem algumas peculiaridades, seria apenas mais um encontro natural entre atores sociais, econômicos, comunitários e políticos com um político em busca de apoio ou palco para locução de suas ideias e propostas, algo normal e salutar em uma democracia e em uma nação onde os cidadãos gozam de liberdade e na qual a soberania popular é a garantia de um processo democrático pleno, valores grandemente apreciados e defendidos pela comunidade árabe-brasileira, e notadamente pela sua importante parcela residente em Foz do Iguaçu / Região Trinacional.
Entretanto, há contradições que tornam este hipotético encontro carecedor de elementos de realidade, razão pela qual necessárias as considerações que seguem, tanto de esclarecimento geral como de expressão pública das preocupações que assolam a comunidade árabe-brasileira:
1) Primeiro de tudo, nenhuma das organizações ou entidades comunitárias que congregam a comunidade árabe-brasileira radicada em Foz do Iguaçu, ou suas lideranças legais, foram procuradas ou contatadas com vistas a aludido encontro, seja para organizá-lo, seja para tomar parte de sua divulgação;
2) O Brasil tem sido palco de propagação do ódio aos árabes e seus descendentes, especialmente por meio da promoção ativa da xenofobia e da islamofobia em parte dos grandes veículos comerciais de comunicação de massa, tanto em suas formas noticiosas quanto em seus programas de entretenimento, razão pela qual, infelizmente e para assombro de toda a comunidade árabe-brasileira, professantes do islamismo e algumas de suas instituições sociais e religiosas passaram a sofrer ataques, todos formalmente comunicados às autoridades competentes. Parte considerável desta escalada na promoção do ódio aos árabe-brasileiros só tem sido possível graças ao ativismo de lideranças e setores extremistas da sociedade que, ainda que minoritários, têm exacerbado a questão com divulgações de dados e atos/fatos absolutamente falsos, sempre depreciativos dos muçulmanos em geral e dos árabes em particular. Como parte dessas lideranças, alguns políticos fazem ecoar publicamente tal ideologia de ódio ao próximo e reforçar um caminho de extremismo que está na contramão do que defendemos, contramão dos princípios da nação brasileira;
3) Tais manifestações são recheadas de alarmismo, racismo e xenofobia, ferindo os mais elementares direitos humanos, a convivência entre povos, nações, estados, as diferentes religiões e culturas. Bem como manifestam rancoroso desrespeito às mulheres e racismo, especialmente contra os negros e negras, que beiram a perigosas ideias supremacistas. Trata-se de uma forma de ver o mundo e as pessoas sob uma interpretação que promove as violências inter-religiosas e inter-comunitárias, exatamente a visão que têm levado a guerras e genocídios mundo afora, limpezas étnicas, misérias decorrentes da desagregação entre países e sociedades inteiras, perseguições, exílios, uma massa de refugiados e a todas as lástimas das crises humanitárias. Nossa preocupação é com o Brasil como um todo e com todos os brasileiros que, por motivo ou outro, são alcançáveis por estas intolerância, racismo e xenofobia, podendo resultar nas consequências nefastas que hoje atingem muitas partes do mundo;
4) Além do mais, a comunidade árabe-brasileira é amante da paz, da democracia e das liberdades civis, razão pela qual tem reiterado seu respeito às formações históricas das sociedades e dos países mundo afora, bem como a faz reconhecer no Brasil um exemplo de boa convivência entre todos, de tolerância e tratamento do mais digno que há a todos os imigrantes, antigos ou recentes, os quais encontraram aqui as condições e o apoio para realizarem suas vidas e darem o melhor de si para a construção econômica e social deste país.
Por fim, como brasileiros que somos, nada temos contra qualquer homem ou mulher que pretenda alçar-se à liderança, desde a vereança até à Presidência da República, razão pela qual respeitamos o desejo do deputado Jair Messias Bolsonaro de pleitear o cargo máximo. Não nos opomos a pessoas ou a grupos de pessoas, mas a algumas ideias perigosas e destrutivas que vêm sendo promovidas. Logo, a comunidade árabe-brasileira, que há mais de 120 anos enraíza suas famílias e descendentes no Brasil, nada tem a se opor a esta ou aquela pessoa e nem se nega a qualquer tipo de discussão ou debate, com quem quer que seja, conquanto isto se construa e se dê a partir dos tramites que respeitem as organizações, suas lideranças e a própria comunidade como um todo, e sempre em busca do bem comum, da superação de todas as formas de racismo, discriminação e intolerância na defesa e cumprimento da Constituição Federal, jamais em sentido inverso.
Por respeito a nossa pátria o Brasil e ao povo brasileiro, assim como por amor à democracia, às liberdades e à igualdade de todos os seres humanos perante Deus, esta é a manifestação da comunidade árabe-brasileira, que se faz pública diante da verdade e da justiça.
Foz do Iguaçu, dia 24 de Julho de 2018
Assina esta carta pública de esclarecimento:
SBI – SOCIEDADE BENEFICENTE ISLÂMICA DE FOZ DO IGUAÇU
CCBI – CENTRO CULTURAL BENEFICENTE ISLÂMICO DE FOZ DO IGUAÇU
SOCIEDADE ÁRABE PALESTINA BRASILEIRA DE FOZ DO IGUAÇU
FEPAL – FEDERAÇÃO ÁRABE PALESTINA DO BRASIL