Por Viegas Fernandes da Costa.
Naná, escrevo-te da fronteira. Ontem fez fresco à noite e a Lua esteve presente. Ouço dizer que lá para as bandas de Brasília, Janja, a esposa do presidente, abriu as portas do palácio para uma jornalista da Globonews (por que não, primeiro, para uma jornalista da TVT?) e só não encontraram coco no canto da sala, mas a porqueira era ampla e irrestrita e sobrou até para um alquebrado sofá que ostentava as manchas de suor do antigo inquilino. Há quem defenda a incineração do móvel a fim de evitar seu uso por alguma fé apócrifa. Nhonhô já me cantou a pedra nesta manhã: a Sagrada Congregação do Colt 38 reivindica o dito cujo para o templo a ser erguido na Flórida, Nenê Carluxo cogita picar o couro manchado em centenas de pequenas relíquias sagradas. Tu sabes, Naná, que Nhonhô tem lá as relações dele, apesar de jurar de pés juntos nunca ter costeado o alambrado. Mas tu achas que juramento de descrente tem algum valor? Eu duvido. Aquela camiseta da CBF que Nhonhô vestiu no jogo da seleção contra Croácia, que disse ter comprado exclusivamente para as quartas-de-final da copa, sei não…
A propósito, Naná, essa história da camiseta amarela, da bandeira nacional… Sabe, foi bonito ver o povo desenrolando a bandeira com as cores da família imperial brasileira sobre suas cabeças na posse do Lula, mas não consigo deixar de sentir certo mal-estar quando vejo a camiseta, a bandeira. Algo se partiu. Eu gostava daquela imagem da campanha das Diretas, o povo se protegendo da chuva sob a bandeira. Mas agora? Outro dia vi um patriotético na frente do quartel militar, arrastando a bandeira no chão, na lama. A cena não sai da minha cabeça. Acho aqui comigo que a gente devia escolher uns símbolos novos, e novos heróis também. O Lula já inscreveu o nome da Antonieta de Barros no livro dos heróis nacionais, acho que é por aí. A seleção brasileira podia jogar com camiseta branca, por exemplo. O uniforme reserva podia ser vermelho. Vermelho é bonito, Naná.
Tem também o Hino Nacional. A gente podia substituir aquela lenga lenga escrita pelo Joaquim Osório Duque Estrada por alguns versos do Manoel de Barros, o quê achas? Cantar, por exemplo, “Entendo bem o sotaque das águas/ Dou respeito às coisas desimportantes / e aos seres desimportantes./ Prezo insetos mais que aviões./ Prezo a velocidade/ das tartarugas mais que a dos mísseis.” A música também podia ser outra, Trenzinho Caipira do Villa Lobos está entre as minhas preferidas. Foi emocionante, não foi, ouvir Trenzinho Caipira na trilha sonora da posse? Confessa, Naná, tu também gostaste!
Bom, a gente tem muito o que conversar, mas ainda quero tomar banho de lagoa e comer um peixinho. Devo ficar por aqui mais alguns dias, curtindo as férias. Mando notícias.
Teu amigo,
Viegas Fernandes da Costa.
Beira da Lagoa da Ibiraquera, 07/01/2023.
p.s.: Ainda em tempo, feliz ano novo!