Por Laudovina Pereira, do Cimi regional de Goiás/Tocantins.
Com o tema “Nosso direito é originário: respeitem a Constituição Federal e nossos direitos e territórios”, um encontro de formação sobre direitos indígenas foi realizado pelo Cimi Regional Goiás/Tocantins na Terra Indígena (TI) Apinajé, no município de Tocantinópolis, estado de Tocantins.
A atividade ocorreu entre os dias 28 e 30 de junho na aldeia Serrinha e contou com a participação de aproximadamente 70 pessoas, entre mulheres, jovens, lideranças e caciques de 26 aldeias do povo Apinajé. Ao final dela, os indígenas produziram um documento em que defendem seus direitos e denunciam as agressões do agronegócio ao seu território.
“Não vamos permitir que nossos territórios sejam arrendados para os produtores do agronegócio”
O encontro teve como objetivo debater a conjuntura nacional e as constantes ameaças da política indigenista do atual governo, que, de forma desrespeitosa, viola os direitos constitucionais dos povos indígenas, garantidos na Constituição Federal de 1988. Avaliou-se que o governo federal agride os direitos originários e quer, de maneira inconstitucional, estabelecer o marco temporal como parâmetro para a demarcação das terras indígenas, desconsiderando todo o processo de agressões, violências e expulsões forçadas que vitimaram os povos indígenas no Brasil.
Os indígenas manifestaram muita preocupação com o governo de Jair Bolsonaro, mas afirmam, no documento final do encontro, que “cada ataque desse governo aos direitos indígenas, serão respondidos na força e na resistência, não vamos permitir que nossos territórios sejam arrendados para os produtores do agronegócio”.
Foram aprofundados os temas do direito originário e as ameaças da tese do marco temporal, que deverão ser analisados de maneira definitiva pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no processo do Recurso Extraordinário (RE) nº 1017365. Trata-se de uma ação possessória envolvendo o povo Xokleng, em Santa Catarina, que teve a repercussão geral reconhecida pela Corte, ou seja, servirá como parâmetro para os demais casos que tratem do mesmo tema.
Durante o encontro, também se debateu sobre os projetos do governo federal de arrendamento de terras através de parcerias agrícolas com os ruralistas e sua inconstitucionalidade, já que a Constituição Federal garante o usufruto exclusivo das riquezas das terras indígenas aos povos originários, conforme estabelece o artigo 231. E os indígenas falaram que não vão recuar em defender que “as terras indígenas são inalienáveis, indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis”, tal qual determina a Constituição.
“O agronegócio está destruindo a mata, as nascentes, os rios, matando as abelhas, envenenando as caças e mudando a vida da terra”
Outros temas também estudados e debatidos foram o projeto de reforma da Previdência, a municipalização da saúde indígena e os impactos dos agrotóxicos nos territórios indígenas. Os Apinajé também manifestaram sua preocupação com os efeitos nocivos e mortais dos agrotóxicos.
“O agronegócio está destruindo a mata, as nascentes, os rios, matando as abelhas, envenenando as caças e mudando a vida da terra”, afirmaram, deixando claro que não vão deixar destruir os territórios indígenas nem acabar com os seus direitos.
“Exigimos que os governantes deste país respeitem a Constituição Federal de 1988, nossos direitos são originários, estamos defendendo a nossa casa, a nossa Mãe Terra de todos esses invasores”, manifestaram os indígenas no documento final do encontro.
Durante o encontro, houve danças e cantorias no pátio, para fortalecer a luta e a cultura e para buscar forças que permitam aos Apinajé continuar lutando pelos seus direitos e pelos dos seus filhos, netos, bisnetos e tataranetos. Eles só querem viver em paz, com a água e o território livres de ameaças e com as florestas em pé e em paz.
“Não vamos recuar em nenhum momento na defesa e na garantia dos direitos indígenas”
DOCUMENTO FINAL DO ENCONTRO DE LIDERANÇAS E CACIQUES DO POVO APINAJÉ
Nós lideranças indígenas do povo Apinajé, reunidos nos dias 28 e 29 de junho na aldeia Serrinha, para discutir e encaminhar ações na defesa dos direitos dos povos indígenas.
Manifestamos que estamos preocupados com os retrocessos que esse governo de Jair Bolsonaro está fazendo, e reafirmamos que não vamos recuar em nenhum momento na defesa e na garantia dos direitos indígenas.
Não vamos aceitar esses ataques aos nossos direitos, que as nossas lideranças garantiram na Constituição Federal de 1988. Cada ataque desse governo aos direitos indígenas, serão respondidos na força e na resistência, não vamos permitir que nossos territórios sejam arrendados para os produtores do agronegócio.
Não vamos aceitar que o agronegócio roube nossas águas para molhar as grandes lavouras do agronegócio, porque está afetando as aldeias com a poluição da água, do ar e da terra. Nossas crianças estão sendo envenenadas pelo uso de agrotóxicos das lavouras no entorno do território indígena.
O agronegócio está destruindo a mata, as nascentes, os rios, matando as abelhas, envenenando as caças e mudando a vida da terra.
“Exigimos que os governantes respeitem a Constituição Federal de 1988, nossos direitos são originários, estamos defendendo a nossa casa”
Repudiamos a MP 886 do presidente Jair Bolsonaro, que novamente ataca os nossos direitos. Pedimos que o MPF devolva a FUNAI para o ministério da Justiça definitivamente e devolva também definitivamente a competência da demarcação das terras indígenas para a FUNAI.
Repudiamos os ataques do Jair Bolsonaro nas mídias sociais contra os povos indígenas, que vem aumentando ainda mais o preconceito contra os povos indígenas do brasil.
Somos nós povos indígenas que preservamos e contribuímos para a existência dos povos brasileiros a partir de nossos territórios, por isso queremos a continuidade das fiscalizações e da demarcação das terras indígenas.
Exigimos que os governantes deste país que respeitem a Constituição Federal de 1988, nossos direitos são originários, estamos defendendo a nossa casa, a nossa Mãe Terra de todos esses invasores!
Somos contra a reforma da previdência social que vai impossibilitar que os povos indígenas continuem com o direito de se aposentar e receber os benefícios sociais. Respeitem a Constituição Federal de 1988!
Nós lideranças e caciques Apinajé não aceitamos a municipalização da saúde indígena, esse projeto do Ministério da Saúde vai acabar com a saúde específica e diferenciada garantida na Constituição Federal de 1988. Exigimos que esse direito seja respeitado conforme está garantido na lei.
Deixem a nossa Mãe Terra e nossos rios livres! Queremos viver em paz no nosso território com as nossas florestas.
Aldeia Serrinha, povo Apinajé, 29 de junho de 2019