Por Marcella Fernandes.
Relator da proposta de emenda à Constituição (PEC) que reduz a maioridade penal, o senador Marcelo Castro (MDB-PI) deve manter o texto aprovado em 2015 pela Câmara dos Deputados. De acordo com a proposta, adolescentes entre 16 e 18 anos responderão pelos crimes de homicídio doloso (com intenção de matar), lesão corporal seguida de morte e pelos delitos considerados hediondos, como estupro e latrocínio.
Castro está finalizando o parecer da PEC 115/2015, que aguarda votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. Se aprovada no colegiado, a proposta segue para o plenário, onde precisa de 49 senadores, em dois turnos.
Se for mantido o texto aprovado pelos deputados, a tramitação é mais rápida. “Estou levando em consideração que se nós aprovarmos como veio da Câmara, essa PEC já poderá ser promulgada e entrar em vigor. Isso pesa na hora da decisão”, afirmou Castro ao HuffPost Brasil. “Não quero adiantar meu voto, mas está muito forte essa tendência”, completou.
O senador era deputado quando a redução da maioridade penal foi aprovada na Câmara, então sob comando de Eduardo Cunha (MDB-RJ). Na época, em julho de 2015, o presidente da Casa usou uma manobra regimental para aprovar a PEC, que havia sido rejeitada pelo plenário no dia anterior. O texto ficou engavetado no Senado desde então.
Bolsonaro quer reduzir maioridade penal
A punição mais rigorosa para adolescentes envolvidos com o crime é uma das bandeiras do presidente Jair Bolsonaro. Em transmissão ao vivo no Facebook em 8 de agosto, o ex-deputado disse que pediria ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), para pautar a matéria. “Vou pedir para o Davi Alcolumbre botar na pauta do Senado a redução da maioridade penal para crimes graves. Tenho certeza de que ele vai empunhar essa bandeira”, afirmou.
No Senado, não há pressa para avançar no tema por enquanto. Castro disse que não conversou com Alcolumbre sobre a PEC. Na CCJ, a prioridade é de outras matérias, como a reforma da Previdência.
Apesar do ritmo lento, o relator acredita que haverá empenho de Alcolumbre na votação. “Evidente que ele vai pautar. Acho que é do interesse de todos. Há um consenso na sociedade de que uma pessoa de 16 anos, 17 anos não fique impune. Isso está bem cristalizado nos meios familiares, na sociedade. Todo mundo tem um entendimento de que a partir de 16 anos a pessoa tem discernimento”, afirmou.
Psiquiatra de formação, Castro disse que chegou a cogitar uma alteração no texto, de modo que jovens entre 14 e 18 anos pudessem ser punidos por crimes, de acordo com análise feita pelo juiz no caso concreto, considerando o tipo de delito, se é reincidente e outras circunstâncias. “Há um amadurecimento intelectual, mas não há um correspondente emocional. Quando dizem ‘ah, o cara sabia o que estava fazendo’. Sabia mesmo. Mas o adolescente é dado a cometer excessos, atitudes impulsivas e temos que ter um tratamento especial”, disse.
Apesar de considerar a mudança, o senador disse que a tendência é manter o texto da Câmara para facilitar a aprovação.
De acordo com a proposta, jovens de 16 a 18 anos devem ser internados em um local separado tanto dos menores que cumprem medidas socioeducativas quanto dos presos acima de 18 anos.
Atualmente, a punição mais grave para menores de 18 anos que cometem atos infracionais é a internação por no máximo três anos no sistema socioeducativo.
De acordo com o levantamento realizado pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República em 2013, dos adolescentes que cumpriam medida socioeducativa de privação de liberdade, 95% eram do sexo masculino e cerca de 60% tinham idade entre 16 e 18 anos.
Críticas à redução da maioridade penal
Tramita em conjunto com a PEC 115/2015 outra proposta sobre o tema, apresentada em março, pelo senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), com apoio de outros 32 parlamentares. O texto reduz a maioridade penal para 16 anos em todos os casos e para 14 anos nos crimes hediondos, além de tráfico de drogas e organização criminosa.
O PSL também tentou endurecer a punição para menores via judiciário, mas fracassou. Em 8 de agosto o Supremo Tribunal Federal (STF) negou pedido feito pelo partido e manteve as normas do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em uma decisão contrária à política criminal bolsonarista.
Na ação, a sigla pedia a derrubada de artigo do ECA a fim de que autoridades pudessem apreender menores para averiguação, ainda que sem indício de cometimento de qualquer irregularidade. O partido também pedia para ampliar a possibilidade de internação de menor infrator, de modo que a medida fosse permitida independentemente de ato violento.
No julgamento, os ministros criticaram o pedido do PSL. “O que se pretende é penalizar as crianças e os adolescentes pela ausência de efetiva proteção integral que deveria ser realizada pelo Estado, pelo país e pela sociedade. Se falham todos esses, vamos então criminalizar as condutas das crianças e adolescentes que vagam pelas praças, internando todas? É uma política de higienização terrível que, ao invés de buscar a integral proteção, criminalizam”, disse o ministro Alexandre de Moraes.
Em audiência pública no Senado sobre as propostas de redução da maioridade penal, em junho, juristas também enfatizaram a função constitucional de proteção ao menor pelo Estado.
Para o ex-ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a mudança contraria a Constituição e não deve ser concretizada, ainda que tenha apoio popular. “Senão nós vamos cair em situações de voltar à barbárie, em que a população pedia alguma coisa à arena romana, e a situação, obviamente, não é essa no Estado democrático de direito. Então, eu tenho que ter clareza de que a voz das ruas não pode transfigurar as molduras constitucionais, até que a Constituição caia”, disse.
Cardozo também questionou a exequibilidade da proposta, que prevê o isolamento dos infratores entre 16 e 18 anos, diante da falta de recursos e má gestão do sistema penitenciário.
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